Caminhando pela
marginal do oceano, vindos da freguesia da Foz do Douro, a Rua de Rui Barbosa (sem saída), antiga Rua do Ribeirinho que ligava, então, a Viela dos Abraços a Carreiros estabelece, a Sul, a entrada na freguesia de Nevogilde.
Estamos nas praias
de Gondarém e do Molhe.
Foram os ingleses
que em meados do século XIX implementaram a moda da ida à praia, primeiro nas
praias da Foz do Douro e, posteriormente, essa actividade do lazer
estender-se-ia mais para Norte, entrando em Nevogilde.
Entretanto, iam
chegando as últimas novidades que o progresso e as exigências do quotidiano
reclamavam.
“ Os moradores das ruas de Gondarém, Marechal
Saldanha e Monte do Crasto, na Foz, projectam amanhã, Domingo, 4 de Agosto,
ruidosos festejos, em virtude das referidas ruas terem sido iluminadas a gaz,
melhoramento este que se torna de bastante utilidade para os seus habitantes.
As ruas já anteontem, 1 de Agosto, estiveram
iluminadas, devendo os festejos constar de música, foguetório e
embandeiramento, queimando-se à tarde, no Monte Crasto, um bonito fogo de
bonecos.”
In “A Palavra”, de 3
de Agosto de 1895 - Sábado
Na primeira metade
do século XX, eram importantes em Nevogilde a colónia inglesa e ainda a colónia
alemã.
Destacavam-se das
famílias inglesas, segundo o Dr. Damião Velloso Ferreira, “Chambers, Grant, Cobb, Arnsby, Reid, Mitchell, Blackett, Tait, Wricht,
Wall, Irving, Comber, Combe Martin, Rumsey, Haynes e Sanbey e entre a
comunidade alemã, Burmesters, Lichtenberg, Bartosh, Durrer, Vincke, Höfle,
Kath, Rasfish, Fürbringer, Thumann, Dahl, Stüve, Venn, Buss, Bock, Kiefe, Simon
e Georgi.”
O complexo habitacional,
por sua vez, compreendia, há algumas dezenas de anos, para além das casas mais
modestas da classe trabalhadora, as características casas de praia (de 2
águas), que só se abriam na época estival, as casas de gente muito abastada,
com os seus palacetes e chalets e, por último, as casas de lavradores e de quem
por aqui morava há gerações.
Esta última classe
social habitava de preferência alguns solares em volta da igreja de Nevogilde.
A gente abastada
tinha a sua grande montra na Avenida Montevideu, com palacetes que tinham
também entrada pela Rua de Gondarém e, assim, grandes jardins. Presentemente,
estão a ser destinados à hotelaria e a condomínios privados.
Casas de praia, à Rua de Gondarém
Caminhando pela
Avenida de Montevideu, no sentido do Castelo do Queijo, encontrávamos alguns
palacetes daquelas famílias abastadas que a seguir se destacam.
Casa do Barão de
Fermil que seria, mais tarde, também, residência da sua filha Delminda Sampaio
Machado, casada com Dr. Francisco da
Cunha Freitas Mourão de Sotomaior
Na casa da foto,
anterior, viveu e aí faleceu Manuel Guilherme Alves Machado (Celorico de Basto,
Veade, 25.10.1873; Porto, Nevogilde, 05.06.1943), 1º Barão de Fermil, casado,
em 1900, com Maria Augusta Sampaio de Brito que, desde 1898, era proprietária
do chamado Palacete dos Barroso Pereira, à Praça de Santa Teresa (actual Praça
Guilherme Gomes Fernandes).
Em 1956, a sua filha D. Delminda Sampaio Machado e o seu genro, o Dr. Francisco
da Cunha Freitas Mourão de Sotomaior, haveriam de receber a propriedade da
Praça Guilherme Gomes Fernandes por doacção.
Casa do Barão de
Fermil, actualmente – Ed. Graça Correia
Casa de Alfredo
Soares Carneiro, depois da família Jervell
Casa de Alfredo
Soares Carneiro, actualmente – Ed. Graça Correia
Palacete Andresen ou família Moreira
Casa da família
Cálen
Casa da família
Cálen, actualmente – Ed. Graça Correia
Palacete do "Rosas", depois o Restaurante D. Manoel
O carro eléctrico
vindo do Castelo do Queijo pela Avenida de Montevideu (onde se situavam os
palacetes), entrando na Avenida Brasil
Na foto acima, a Rua do Molhe, à direita, faz a separação
das avenidas Brasil e de Montevideu. Na esquina mais próxima, divisa-se um
portão de acesso a uma vivenda que, em 1919, foi colocada à venda.
Voltando ao tema das
praias, temos hoje, ao entrar na freguesia de Nevogilde, vindos da Foz do
Douro, a de Gondarém e a do Molhe.
Naqueles tempos, da
1ª metade de século XX, encontrávamos a praia da Conceição, que derivava do
nome da sua banheira mais famosa e a eterna praia do Molhe.
A praia da
Conceição, também era chamada de praia da Corda, por ter uma corda estendida
até um ferro cravado num rochedo pela qual deslizavam agarrados os banhistas. É
a nossa praia de Gondarém.
Praia do Molhe de
Carreiros no século XIX
Praia de Carreiros
em 1907
Praia do Molhe em
1910
Passeio de barco
(normalmente a Matosinhos) na Praia do Molhe, na primeira metade do século XX
Praia do Molhe e a
Esplanada 28 de Maio
Praia do Molhe c.
1945
Praia do Molhe com o seu aglomerado de barracas e com a Pérgula
já visível
“Frequentei a praia do Molhe nos anos 40 do
passado século.
É com muita saudade que recordo esse tempo,
porque era sempre um mês de divertimento e contacto com amigos e famílias que
só lá encontrávamos ano após ano. Pareceu-me interessante acrescentar algumas
recordações que me ficaram desses felizes anos da Foz.
Todos os verões os meus pais alugavam uma
casa na R. de Gondarém (esquina com a R. do Crasto), onde hoje se encontra um
prédio, em cuja cave funcionou, durante uns anos, a capela dos frades
Carmelitas e depois um minimercado. Descíamos a R. do Crasto, atravessando a
Av. Brasil, chegávamos à pérgola e descendo as escadas estávamos na
praia.
Das memórias que tenho quereria destacar
algumas que mais me marcaram. Não posso deixar de falar, em primeiro lugar do
mar:
Era límpido e cheio de vida. Os rochedos
estavam cobertos de lapas, anémonas, tintureiros, mexilhões, estrelas-do-mar,
ouriços, percebes, búzios, peixes e camarões nas poças, bodelhas,
alface-do-mar, sargaço, enfim, toda uma fauna e flora que hoje desapareceu e
não podemos mostrar aos nossos netos. Na areia encontrávamos muitas conchas,
caramujos de diversas cores e beijinhos. Estes, mais raros, eram os da nossa
predilecção.
Que felicidade tínhamos ao mergulhar das
escadas de ferro do molhe!
Só os “homens” eram capazes de tal! Não podia
haver praia sem o jogo do prego; era o jogo por excelência, pois em mais lado
nenhum o podíamos jogar. Eram campeonatos aguerridos, em que na maior parte das
vezes eram as meninas que ganhavam. Fazíamos grandes covas, túneis, castelos,
com e sem decoração de conchas e algas, muros de areia para “segurar” o mar,
enfim toda uma variedade de brincadeiras que nos faziam felizes no mês de
Agosto. E as guloseimas que só na praia nos era permitido gozar!
Passava o “barquilheiro” e logo corríamos a
pedir uns tostões para jogar a roleta. Passava o homem de língua da sogra e
todos íamos pedir à Mãe para comprar. Passava a mulher dos bolos com uma caixa
de folha-de-flandres à cabeça, e logo a água nos escorria da boca. E os
caramilos? Que delícia!
De vez em quando passava o vendedor de
“vira-ventos” que nós seguíamos durante largos metros a cobiçá-los, e com ioiós
revestidos de estanho dos maços de tabaco, fazendo-os subir e descer. Mas, o
melhor, eram, à saída da praia, os sorvetes Águia. Era o verdadeiro manjar dos
deuses. O sorveteiro, no seu característico triciclo em forma de proa de barco,
era a atracção máxima! Havia-os de 1 tostão, 2, 5 e 10 tostões. Os de 1 e 2
tostões eram em forma de barco e o de 5 de copo com colher de madeira.
Não tínhamos esperança de ter mais de 5
tostões. Assim eu preferia comprar, em 3 vezes sucessivas, dois de 2 tostões e
um de 1 tostão, pois “rendia” mais tempo o prazer. De longe a longe apareciam
os “Robertos”. Que excitação! Todos os miúdos (e graúdos) ficavam presos ao desenrolar
do drama, com pancadaria (quanta mais melhor!), berros estridentes e mortos e
feridos... Aquela moca andava sempre numa roda-viva.
Enfim, recordar é viver, e sobretudo é uma
deliciosa diversão.”
Cortesia de Rui
Cunha do blogue “portoarc.blogspot.com”
O jogo do prego
Saltos para a água no paredão da praia do Molhe
Praia do Castelo do Queijo
(Continua)
Caros Américo Conceição e Simão Gomes, permitam-me esclarecer de que a rua que estabelece, a sul, o limite de freguesia da Foz do Doutro é a Rua de Rui Barbosa (antiga Rua do Ribeirinho, que se estendia desde a Viela dos Abraços até Carreiros)e não a Rua do Padrão como acima descrito. A Rua de Rui Barbosa (sem saída) é anterior (sentido Foz /Matosinhos) e paralela à Rua do Padrão.
ResponderEliminarAgradeço o reparo e informo de que já foi feita a respectiva correcção.
EliminarEspero que continue a seguir o blogue e estaremos sempre ao dispor para repor a verdade.
Com os melhores cumprimentos
Américo Conceição
Apraz-me verificar a rapidez de resposta e respectiva rectificação da minha chamada de atenção sobre o limite geográfico da freguesia da Foz do Douro. Continuarei a seguir o Vosso blogue com o maior prazer e interesse, dado que vou aprendendo sempre algo mais. Sou um Fozeiro interessado na minha freguesia, tanto que escrevi um livro sobre a Minha Foz, em 2017, com duas edições esgotadas em cerca de 8 meses. Sempre que notar, no Vosso blogue, algo que mereça uma eventual rectificação alertá-los-ei. Muito Obrigado pela Vossa partilha.
EliminarAgradeço as suas amáveis palavras. Já, agora, podia identificar-me as obras da qual é autor, pois terei todo o gosto em lê-las? De momento, estou no começo da leitura da obra de Dorothy Wordsworth, que foi escrita após uma sua visita, nomeadamente à Foz, em 1845. Dentro de 2 dias farei referência ao seu desembarque no Porto de Carreiros, no lançamento de 22 de Julho de 2019, como uma actualização ao mesmo.
EliminarCumprimentos
Américo Conceição
Boa Tarde. Sou apenas um apaixonado por tudo que à Foz do Douro diga respeito dado que aqui cresci vivi desde a nascença até aos meus 28 anos de idade. Morei e trabalhei na Ourivesaria Sousa, desde os 10 anos de idade, na Rua Senhora da Luz. Esta rua, a oficina de Ourivesaria e a Praia do Ourigo, principalmente, foram os locais do meu desenvolvimento. Portanto foi natural o meu interesse por esta zona da Foz do Douro. Assim, entre sensivelmente 2012 e 2017, escrevi um livro de memórias. Um pouco autobiográfico e monográfico.
ResponderEliminarA edição, em 18 de Março de 2017, coube, por aproximação, ao Progresso da Foz, na pessoa do Dr. Joaquim Pinto da Silva. Foram feitas duas edições esgotadas em pouco mais de 8 meses. Mas não foi o único livro. Em 2020 acabei de escrever um outro livro e Crónicas de viagens (Norte e Centro do País), mas deste apenas se fez uma edição para os intervenientes nessas viagens (10 livros). Actualmente estou a escrever um outro livro sobre a Foz (o tema não se esgota) mas com publicação provável apenas para fins de 2022 ou principio de 2023. Vamos ver. Creio ser possível conseguir um exemplar de "A Minha Foz...e Eu". Vamos contactando. Cumprimentos.
Desejo-lhe as maiores felicidades na elaboração da obra que tem em mãos.
EliminarDe facto, como diz, "vamos contactando", mas quando pretender, pode fazê-lo, através do endereço de e-mail deste blogue.
Cumprimentos
Américo Conceição
Obrigado e desejos de saúde. Se for necessário fá-lo-ei
EliminarInácio Sousa
Este comentário foi removido pelo autor.
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