Centro da Praça D.
Pedro
No centro da praça e inaugurada
em 1866, passou a ser possível apreciar a estátua equestre de D. Pedro IV, de Anatole Calmels.
Em 27 de Agosto de 1861 foi aberto concurso para a estátua
equestre em bronze de D. Pedro IV. Foi ganho por Anatole Camels e pelo
marmoreiro Felisberto Baut (ainda existe a empresa na Rua Rodrigues de Freitas, nº 231).
A primeira pedra foi colocada em 9 de Julho de 1862 (aquando
dos 30 anos da entrada do Exército Libertador e a estátua colocada no local em 4
de Outubro de 1866 por operários belgas, uma vez que tinha sido fundida na
Bélgica), e inaugurada em 19 de Outubro de 1866.
O monumento compõe-se de uma base sobre a qual assenta um
pedestal com duas faces, uma relativa à entrega do coração aos representantes
do Porto, outra representando o desembarque no Mindelo e a entrega da Bandeira
Constitucional.
Em consequência da revolução liberal de 1820, uma outra
intervenção na praça, para o local que viria a ser ocupado pela estátua
equestre, esteve programada, de acordo com texto que se segue:
“Mas em Agosto de 1821
o mais relevante foi o breve monumento instalado na Praça, comemorativo do
primeiro aniversário da Revolução, do qual se transcreve uma descrição
encontrada na imprensa. Logo que anoiteceu se começou a acender a magnífica
peça elevada no centro da Praça da Constituição, cuja particular descrição é a
seguinte. A Cidade do Porto para mostrar o apreço em que tem este dia,
simbolizou-se numa torre em comemoração do adorno de suas Armas. Fechou-se por
uma teia de madeira de altura de meio corpo, um espaço de 70 palmos em quadro.
Dentro deste se formou um palanque de 10 palmos de altura com 58 palmos de
frente. Foi sobre esta base que se levantou o rústico da torre de altura de 30
palmos, com uma porta para cada lado e sobre que havia uma tarja em que se
escreviam dísticos alusivos ao objecto da Regeneração. Sobre o rústico havia
uma varanda em cujos ângulos sobre pedestais, estavam em vulto as figuras das
quatro Virtudes – Justiça, Fortaleza, Prudência e Temperança. Estas figuras
eram bem distintas pelos emblemas que empunhavam: a balança, a cabeça do
javali, o espelho e o freio. Em cima do rústico se elevava uma base de 15
palmos de alto, como soco em que assentava o chão do Templo da Memória que tinha de vão 25 palmos e 15 de cúpula. O
templo tinha oito portas ou arcos, a que serviam de ornato dezasseis colunas da
ordem jónica, sobre que assentava o zimbório em perfeito semicírculo, com oito
janelas redondas correspondentes aos vãos dos arcos. Rematava toda a peça o
escudo das Armas Reais Portuguesas com altura de 10 palmos, fazendo o geral da
altura de toda a peça erigida 90 palmos.’
Monumento
Acima um desenho do
monumento efémero levantado na Praça, da autoria de Joaquim Rafael, de elevadas
dimensões, conseguia, com sua escala e sentido polarizador, constituir um
elemento de diálogo arquitectónico com as restantes frentes. Todo o artefacto
desta máquina era de madeira forrada de panos pintados e transparentes, de
maneira que pelo depósito de muita luz que havia em mecanismo interno,
apareciam as cores de que foram pintadas as diversas configurações desta peça,
cujo claro-escuro e engraçado desenho se devem ao conhecido professor o Sr.
Joaquim Rafael, concorrendo em grande parte para o bom efeito óptico a
construção do madeiramento pelo hábil Mestre o Sr. Manuel Moreira da Silva,
tudo debaixo do risco esboçado pelo cidadão o Sr. António Luís d’Abreu.’
Em 1822 a Camara
decide abrir concurso para que fossem apresentados os trabalhos para o
monumento a erguer na Praça. Em sessão da Camara são apresentados dois
projectos de Joaquim Rafael e um de João Francisco Guimarães, também portuense,
sendo seleccionado o primeiro de Joaquim Rafael. Em seguida, é aprovada na
Camara uma planta intitulada ‘Plano da Praça da Constituição levantado para
designar o lugar em que se há-de colocar o monumento designado a perpetuar o
fausto dia 24 de Agosto de 1822, da autoria de Joaquim da Costa Lima Sampaio,
na qual se deve levantar o monumento aprovado e mandado executar. A planta
apresenta a Praça envolvida por uma geometrização desenhada de elevada
regularidade, representando as linhas de vista, tidas por quem se aproxima da
Praça. Demarca o ponto central desta como o escolhido para a colocação do
monumento. É lançada na data a que a planta alude a primeira pedra do
monumento, que não chegaria a ser concluído, sendo os seus alicerces
desmantelados em 1823, em virtude da queda do regime liberal”.
Com a devida vénia ao Dr. Rafael Santos Silva.
Praça D. Pedro em 1900 com a sua estátua equestre
Ignácio de Vilhena Barbosa (1811-1890), no Archivo
Pittoresco de 1864, quando está já em execução a estátua escreve, após
enaltecer o facto de ela se concretizar na cidade do Porto:
“…E todavia, nenhum monumento commemora ainda aquelles
serviços e dedicação.
Por duas vezes tentou Lisboa lavar essa nódoa de ingratidão,
que mancha os seus annaes, que os mancha não só como a parte principal, ou mais
conspícua, de um paiz onerado com deveres de reconhecimento, mas também, e
ainda mais, como a cidade que maior quinhão tem desfructado na partilha dos
benefícios que provieram d'aquelles serviços e dedicação.
Não obstante, faltava-lhe a viva fé, o enthusiasmo fogoso
que borbulha nos corações portuenses, fazendo-os levar a bom termo qualquer
empresa, por mais árdua que seja.
Em Lisboa confia-se mais na iniciativa dos governos que
no próprio esforço, e d'ahi vem jazer a capital do paiz, n’este como em outros
assumptos, em culpável indolência, em pouco honroso esquecimento. Exigir que o
governo appareça em tudo aquillo onde só deve intender a actividade dos membros
da nação, é desviar do caminho adequado o desempenho da pesada missão de quem
administra, é dar novos foros à incúria, e annullar a iniciativa feliz que tem
produzido a grandeza de diversos povos do mundo, tanto modernos como antigos.
Além disso, como os governos são commummente variáveis,
tão depressa se forma um plano, ou se desenha um monumento, como vem apagal-o
nos esboços o vento da política, umas vezes procelloso, outras mais
tranquillo, mas sempre travessio e vário.
Honremos, pois, a cidade das nossas gloriosas tradições
n'esta presente manifestação de seu acrisolado amor ao heróico soldado, que ha
de ser no futuro o merecido protagonista de uma epopéa que novo Homero ha de
legar, por certo, ás letras pátrias.
Honremol-a ainda, porque o monumento é digno do heroe a
quem se erige, e da invencível cidade de que ficará sendo para sempre o
sacrosanto palladio.”
(O sublinhado é meu, já que bairrismos à parte isto podia
ter sido escrito hoje!)
Vilhena Barbosa descreve de seguida o concurso e o
monumento:
“…Foi a 27 de agosto que se publicou o programa do
concurso, marcando-se o praso para a remessa dos projectos desde 1 de setembro
até 30 de outubro do mesmo anno, e abrindo-se, tanto a nacionaes como a
estrangeiros, o honroso certamen, porque o Porto bem sabe que o engenho tem o
mundo por pátria, e que o primeiro desejo de todos era obter o melhor e mais
bem acabado monumento. Appareceram, pois, sete modelos em gesso, merecendo a
preferencia de 16 votos sobre 22 votantes o que era devido ao trabalho
intelligente do esculptor Anatole Calmels.”
“…Façamos, pois, uma breve descripção do correcto desenho
que o Archivo offerece a seus leitores, podendo cada um apreciar como a cidade
do Porto sabe traduzir na pedra e no bronze os grandes sentimentos que lhe
florecem no coração…
Estátua equestre de D. Pedro IV
…”O monumento deve ter de altura 10 metros desde o nivel
da praça de D. Pedro, onde é erigido, até à parte superior da cabeça da estatua
do imperador. Esta ha de medir a altura de 4m,70, incluindo o
plintho, e a parte architoctonica 5,30. Os baixos relevos terão de
comprimento 2m,45, e de altura 1m,21. Será de bronze
fundido a estatua, e de mármore branco-claro de Carrara os baixos relevos.”
Segue a descrição de o Archivo Pittoresco:
“…Levanta-se em pedestal ornado de dois baixos-relevos,
e das armas da casa de Bragança e da cidade do Porto, a estátua equestre do
imperador.
Sua magestade imperial D. Pedro IV veste o uniforme de
caçadores 5, trajando por cima, segundo o uso por elle adoptado, uma sobrecasaca,
que no tempo do cerco se chamava polaca. Com a mão esquerda dá a rédea ao
cavallo, que escarva insoffrido, e com a direita ostenta a carta
constitucional, código santo das nossas publicas liberdades…
…Illumina-lhe o rosto a confiança do seu destino, e,
dando largas à impaciência do seu corsel, demanda, resoluto e fortalecido, os
horisontes do futuro, sem que o amedronte a opinião dos homens d'esta geração
nos juízos da rigorosa historia.
Tem ao lado a espada, mas na bainha; o que elle mostra, o
que o glorifica, o que elle apresenta como titulo para a sua admissão no templo
da immortalidade, é o código das nossas liberdades, manifestação externa dos
nobres sentimentos que abrigava no coração, o qual, elevando-se à altura
d’este século, soube adequadamente sentir que um rei só pode ser grande quando
governa um povo moralisado e livre.
Gravuras em baixo-relevo que envolvem a estátua equestre
Nas gravuras acima, está representado na superior o Desembarque no Mindelo e a Outorga da Bandeira Constitucional à cidade
do Porto (1862/66- Baixo-relevo em mármore de Carrara 121 x 245 cm) e na
inferior a Entrega do coração de D. Pedro
IV à cidade do Porto (1862/66 Baixo-relevo em mármore de Carrara 121 x 245
cm).
Estas placas primitivas acabaram por ser arrecadadas no quartel do Largo de Santo Ovídio (Praça da República) onde ainda se encontram.
Estas placas primitivas acabaram por ser arrecadadas no quartel do Largo de Santo Ovídio (Praça da República) onde ainda se encontram.
“O baixo relevo à direita da estatua representa o momento
em que sua magestade, depois do seu desembarque, entrega ao commandante dos
voluntários da rainha a bandeira bordada pelas senhoras do Fayal. O da esquerda
representa a entrega do coração de sua magestade. Ás figuras principaes dos dois
quadros são retratos dos personagens que tomaram parte nas scenas históricas,
que os ditos baixos-relevos representam. Em alguns d’esses retratos foi o
artista muito feliz, sobre tudo nos dos srs. marquezes de Sá da Bandeira, e
de Ficalho, visconde de Vallongo, e barão de Grimancellos, os quaes avultam no
baixo-relevo que representa o desembarque e entrega da bandeira acima
referida…”
No baixo-relevo oriental do pedestal da estátua de D. Pedro
IV, da entrega do coração à cidade, podemos ver ao centro um homem envergando
um uniforme de oficial militar que entrega uma pequena urna a um grupo de
quatro homens à sua esquerda. Trata-se possivelmente do Conde de Campanhã que
foi encarregado de entregar o coração do recém-falecido D. Pedro IV à Câmara
Municipal do Porto. Os quatro homens que recebem a urna são membros do senado
portuense.
À esquerda, mais um elemento da Câmara Municipal do Porto e
um oficial militar que cobre a rosto em pranto e tapa quase completamente uma
terceira personagem. Atrás dos três homens está o pequeno sarcófago que irá
alojar a urna (encontra-se hoje na Lapa, também no Porto), numa das faces do
sarcófago vemos a inicial P e o numeral IV coroados;
trata-se do monograma real de D. Pedro IV (Petrvs IV)
Do lado direito do painel vemos ainda cinco soldados de
infantaria e duas figuras populares: um homem cabisbaixo e triste e uma mulher
de cabeça coberta que ergue os olhos dirigidos para o céu.
Em 1998, a Câmara do Porto procedeu ao restauro e
estabilização da estátua.
Entretanto, já na 1ª metade do século XX, tendo sido alvo de vândalos, os baixos-relevo em mármore foram substituídos por réplicas, que serão de bronze.
Durante algum tempo constou que teriam sido roubadas, algo que não é inédito, pois, nos nossos dias, factos semelhantes aconteceram e, por isso, continuam em parte incerta o busto de Raúl Dória que estava no Largo Tito Fontes e, mais recentemente, o busto de António Nobre do Jardim João Chagas, vulgo Cordoaria. Nos dois casos restam os pedestais.
Entretanto, já na 1ª metade do século XX, tendo sido alvo de vândalos, os baixos-relevo em mármore foram substituídos por réplicas, que serão de bronze.
Durante algum tempo constou que teriam sido roubadas, algo que não é inédito, pois, nos nossos dias, factos semelhantes aconteceram e, por isso, continuam em parte incerta o busto de Raúl Dória que estava no Largo Tito Fontes e, mais recentemente, o busto de António Nobre do Jardim João Chagas, vulgo Cordoaria. Nos dois casos restam os pedestais.
Estátua equestre de D. Pedro IV, envolta por gradeamento
Detalhe da Planta de 1892 de Teles Ferreira esc. 1:500
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