sexta-feira, 1 de setembro de 2017

20. QUINTAS - Actualização em 30/01/2018 e 24/05/2019

Neste capítulo irão fazer-se referências breves a algumas quintas existentes na cidade e no seu termo, pelo que, interessará dissecar o conceito.

«Sobre a origem do conceito «quinta» contamos com o precioso estudo de Alberto Sampaio - As Vilas do Norte de Portugal, obra editada em 1923. Segundo este investigador vimaranense foi o processo de desagregação das vilas romanas na Alta Idade Média que originou a formação de várias “subunidades culturais” designadas por casales, quintanas ou quintas, e vilares. O casal era uma pequena parcela de terreno arrendado (com casa) ao caseiro “de casariius”. As subunidades agrícolas: quintana, quintanale ou quintal (“gleba hortícola junto a uma casa”) designavam uma “superfície de cinco ou de um múltiplo de cinco medidas agrárias”. Os vocábulos quinta /quintã traduzem a mesma realidade económica, fundiária e até sociológica. A quinta funcionava como um prazo ou casal e, dependendo do tipo de propriedade, podia incorporar várias parcelas dispersas constituídas por casais, quintas, quintãs, vilares (…). Segundo Aurélio de Oliveira, este “tipo de estrutura orgânica” foi consolidada no período medieval, sendo composta por uma unidade central que “muitas vezes herdou diretamente o nome do assento da antiga domus ou paço ou residência do senhor”, ou ao “assento da grande casa ou solar”. Geralmente estava ligada a uma parcela de terreno de dimensões reduzidas que fazia parte do domínio eminente e funcionava como uma unidade administrativa ou prestamista. As restantes parcelas de terrenos formavam o domínio útil sendo alienada a terceiros sob a modalidade do foro ou da simples colónia. A prática desta modalidade de exploração agrária, dominada por uma aristocracia terratenente, militar e religiosa vigorou no Antigo Regime até às leis da desamortização (1832-1834).»
Com a devida vénia ao Professor Manuel Almeida Carneiro; Dissertação de Doutoramento, 2016

No âmbito das matérias a tratar seguidamente, importa dissecar outras realidades de carácter toponímico e de divisão administrativa, como sejam, o Casal o Lugar e a Aldeia.
Referente à primeira insere-se o conceito de casal que deve ser entendido como aglomerado populacional que etimologicamente deriva de casa. Casal significará então:
1. Conjunto de propriedades duma família;
2. Propriedade rústica = Quinta ou Herdade;
3. Pequeno povoado; 
4. Pequena propriedade murada e produtiva não longe da residência (significado regional transmontano).
Estes aglomerados populacionais partiam duma Casa e cresciam em volta dela tornando-se nalguns casos lugares de maiores dimensões que foram depois assumindo classificações de aldeias, vilas etc.
Oficialmente a classificação de aldeia não existe mas sim a de lugar que representa um aglomerado populacional de pelo menos 15 habitações ocupadas não distantes entre si de mais de 100 metros.
A classificação de aldeia, vila, cidade é já uma nomenclatura de divisão administrativa que corresponde a aglomerados com um número mínimo de habitações contíguas, um mínimo de população e a existência de determinados serviços às populações. 
Por outro lado, uma personalidade que passará a ser diversas vezes referida é Robert Chester Smith.
Este cidadão estado-unidense, nascido em Cranfort (New Jersey) em 1912, no seio de uma abastada família norte-americana, tornou-se a partir da década de 40 do século XX, um dos maiores especialistas internacionais em arte portuguesa, tendo também dedicado uma parte da sua vida, ao estudo da arte monumental brasileira.
Na Exposição do Mundo Português participou como delegado dos Estados Unidos. Deixou ainda um legado imenso de fotos de monumentos e igrejas, etc. 
Sobre o Porto e as suas quintas, dizia Júlio César Machado na sua obra “Scenas da minha Terra”:
 
 
 
«Diz-se geralmente que é para sentir que no Porto, nem mesmo nos arrabaldes, haja quintas: quintas? Como: quintas? quintas, para que, — se o paiz por si só é uma quinta, a maior das quintas, uma quinta em grande! Eu nunca por ali olhei para um lado ou para outro, que não visse arvores a erguerem-se! É uma vegetação esplendida, de que não tem, não podem ter ideia os que nunca saíram de Lisboa!» 



20.1 Quinta do RIO


A Quinta do Rio, inicialmente chamada Casal do Moinho, situa-se na freguesia de Ramalde, em Ramalde do Meio, entre a Travessa de Requesende e a Rua Direita do Viso, junto da bifurcação dos dois ribeiros que formam o espesso caudal da Ribeira da Granja, ou do Rio da Granja que deu nome à referida propriedade, no antigo Lugar do Moinho.
Foi então o rio que deu nome à propriedade, também conhecida por Quinta da Ponte por se situar junto da antiga travessia que unia a antiga estrada da Senhora da Hora ao centro da cidade do Porto, como vem assinalado na Planta da cidade do Porto e arredores.



Quinta do Rio - Ed. Teófilo Rego 1958


A Quinta do Rio é constituída, além do vasto espaço verde de pomar, horta, jardim e campos agrícolas, por um conjunto de edifícios de que se destacam o núcleo habitacional e a capela.
Sobre a sua história, a denominada, a partir da década de 1880, como Quinta dos Meireles, sabe-se que fora do Capitão Manoel da Silva Guimarães, homem de negócios e morador em “Sima do Muro dos Banhos”, na cidade do Porto, que edificara a Capela Setecentista de invocação a Santo António.


“Para a fábrica da capela, Manoel da Silva Guimarães tinha de assegurar património suficiente para a manutenção dos ofícios divinos. Para esse efeito, adquiriu a Damião de Sousa Botelho Lucena, seis leiras de terra lavradia e de mato, mais as bouças: dos Outeiros, do Padrão, da Cancela, da Feiteira, da Detrás e a bouça Da Metade, localizadas na freguesia de Leça do Balio75, por 39.300 réis76. O rendimento anual destes prédios atingia os quatrocentos mil réis, para garantir a manutenção do culto com
«bom ornato e decência».”
Fonte: Manuel Almeida Carneiro



Manoel da Silva Guimarães contrai matrimónio em 17 de Setembro de 1756, com Antónia Maria de Jesus.
No respectivo contrato de casamento, o noivo entrou com "1 conto e 400 mil réis" e a noiva foi dotada de algumas leiras e pelo Casal do Moinho, propriedade foreira do Marquês de Abrantes e de Fontes, a título de prazo de vidas com uma renda anual de: três alqueires de trigo, quatro alqueires de centeio, quatro e meio alqueires de milho, quinze alqueires de cevada, um carro de palha triga e uma galinha. Domínio de vinte um.
O Casal do Moinho era então constituído pelos seguintes prédios:
Pomar de Cima, Campo de Meio ou cortinha de Baixo, Bouça da Fonte, Bouça Grande, Campo da Bouça do Meio, Campo de Feital, Campo do Rio, Bouça do Paúl e Campo da Cavadinha.
A 1 de Setembro de 1759, Manoel da Silva Guimarães, é dado como alferes e morador na Quinta do Rio. Ascendeu ao posto de Capitão das Ordenanças e recebeu a patente, do Brigadeiro das Armas do Partido do Porto, João de Almada e Melo, a 16 de Julho de 1760, com todas as «honras, privilégios, liberdades, isenções e franquezas».
A 17 de Agosto de 1774, na quinta do Rio, na Freguesia de Ramalde do Julgado de Bouças, é feita uma escritura de dote de casamento, por Manoel da Silva Guimarães e sua mulher, a sua filha Dona Ana Maria Joaquina, para casar com o capitão José Gonçalves Lopes, acto ao qual esteve presente a mãe do noivo, Ana Maria do Espírito Santo, viúva de Domingos Gonçalves Lopes.
Para esse efeito, deslocou-se, propositadamente, até à quinta do Rio, o tabelião.
José Gonçalves Lopes, capitão-mor do couto de Leça do Balio, era quem administrava a Quinta de Sam Thiago, em Custóias.


“O Capitão Manoel da Silva Guimarães lavrou testamento a 30 de Setembro de 1781 e após o seu falecimento, sucedeu no governo da Casa o seu filho homónimo que também enveredou pela carreira das armas no Regimento de Milícias da cidade do Porto. Em 19 de Outubro de 1811, Manoel da Silva Guimarães (II) reformou-se no Posto de Major com o aval do Príncipe Regente. Faleceu em 1818, no estado de solteiro, mas tinha um filho que foi desvalido na Roda dos Expostos da cidade do Porto e que veio a suceder na Casa após ter sido legitimado por testamento.
O Auto de Posse de todos os prazos de vidas da Quinta do Rio, datado de 1818, permitiu a Manoel da Silva Guimarães (III) tornar-se o herdeiro universal dos bens do seu progenitor. Tendo sido exposto na Roda, o então Segundo Sargento da Segunda Companhia do Batalhão de Caçadores Número Nove, tornou-se o sucessor directo «[de] todas as propriedades da mencionada Quinta (
…)»”.
Cortesia do Dr. Manuel Almeida Carneiro



Para além da Quinta do Rio, o património da Casa incluía também a «Propriedade do Seixo», que ficava em Ramalde, e a «Quinta da Devesa» localizada junto à Estrada Velha de Braga, em S. Mamede de Infesta.
Manoel da Silva Guimarães (III) não tem descendentes, acabando os seus bens por beneficiar uma sua prima, em 2º grau, Marcelina Nogueira da Silva Guimarães.
Segundo a tese de doutoramento do Dr. Manuel Almeida Carneiro, em meados do século XIX a propriedade pertenceu a um filho de Jacinto da Silva Pereira fundador da Fábrica de Fiação e Tecidos Jacinto, de seu nome Henrique da Silva Pereira Magalhães em virtude do seu matrimónio concertado com Marcelina Nogueira da Silva Guimarães, filha de Joaquim Francisco da Conceição e de Ana Nogueira dos Reis, moradores no Lugar de Gondivai, na freguesia de Leça do Balio. Para ter acesso à herança, a herdeira-sucessora, Marcelina Guimarães devia dar de entrada sete ou oito contos de réis, como garantia das obrigações de dívida eventualmente existentes em nome de Manuel da Silva Guimarães (neto do capitão de ordenanças), seu segundo primo.
Em 11 de Abril de 1857, Henrique da Silva Pereira Magalhães pediu ao Bispado a cessação do culto religioso na sua capela, em virtude da «mui pouca concorrencia do pôvo, pois que até mesmo em alguns dias se acha devoluta, e somente com a familia do suplicante.
O casamento de Henrique com Marcelina, durou pouco e dele resultou a orfandade de três filhos menores, um rapaz e duas raparigas. O rapaz viria a falecer com 19 anos no Brasil, e as suas irmãs assegurariam a continuidade do património familiar e aliando-se pelo matrimónio à família da Quinta das Virtudes.
Emília da Silva Pereira Magalhães casou com Artur de Azevedo Meireles e Júlia da Silva Pereira Magalhães casou com Álvaro de Azevedo Meireles. Desde então, o património ficou na posse dos herdeiros da Casa até aos anos de 1985.


“Em 1985, o imóvel já se encontrava numa situação de abandono e semi-arruinado. Foi também nesse ano que a Quinta do Rio recebeu o estatuto de Imóvel Classificado de Interesse Público, depois de um conturbado processo de expropriação desencadeado pelo Estado que punha em causa a sua preservação e salvaguarda. Posteriormente o imóvel foi adquirido por Artur Brás que o reabilitou para fins de residência e a obra ficou a cargo do arquitecto Manuel Teixeira de Carvalho”.
Com a devida vénia a Manuel Almeida Carneiro




Casa da Quinta do Rio em 1966 (alçado poente, o andar e a eira) – Fonte: Manuel Almeida Carneiro, Mestre em Arqueologia, Faculdade de Letras da Universidade do Porto



Quinta do Rio, passadiço e fonte à esquerda - Ed. João Vieira Caldas, “Casa Rural”


Quinta do Rio na actualidade - Ed. Google Maps


Esquema representativo da área de implantação da Quinta do Rio – Ed. Manuel Almeida Carneiro, 2003



Legenda:

A – Casa Nobre
B – Estrebarias
C – Capela
D – Casa secundária
E – Casa dos caseiros
F – Anexos de Lavoura
G – Casa-celeiro
H – Casa-celeiro
I – Eira
J – Área ajardinada
L – Tanque
M – Casa do Moinho
P – Poço


Casa da Quinta do Rio – Ed. “lifecooler.com/”


“A casa de granito assenta em base rochosa. O primeiro piso era utilizado para habitação. O piso térreo funcionava com arrecadações e estábulos. Exteriormente, o corpo central é dividido por pilastras com uma porta ao meio emoldurada e com um óculo.
A quinta do Rio foi vendida por Mª Isabel Perdigão a Artur Armindo Rola Sousa Bráz em 1987. Em 1988 a casa sofreu obras de reabilitação e restauro.
Considerado Imóvel de Interesse Público pelo Dec. nº 45/93, DR 280 de 30 Novembro 1993.”
Fonte: “lifecooler.com/







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