Revolta dos
Taberneiros
Esta revolução teve lugar em 1757 contra a decisão do
Marquês do Pombal de proibição de venda de vinho “avulso” e, pretendia evitar,
assim, a degradação da qualidade do vinho do Porto, que era alvo de muitas
mixórdias, quando era um produto que permitia a entrada de largas divisas no
País, após a assinatura com os ingleses, em 1703, do tratado de Methuen, que vigoraria até 1836.
Foram seus negociadores o embaixador extraordinário
britânico John Methuen, por parte da Rainha Ana da Grã-Bretanha, e D. Manuel
Teles da Silva, marquês de Alegrete, pela coroa portuguesa.
Esta passaria, a partir de então, a controlar através da
Companhia Geral de Agricultura e das Vinhas do Alto Douro, todo o circuito
comercial do vinho, inclusive os locais de consumo e venda – As Tavernas.
Na manhã do dia 23 de Fevereiro de 1857, uma Quarta-Feira
de cinzas, estalaria a revolta, mas, quando pelas três horas da tarde saía à
rua a procissão das Cinzas da igreja dos Terceiros de S. Francisco, a mesma,
pareceu acalmar.
Pretendia o povo que fosse revogada a criação da Companhia e
que se restabelecesse o comércio do vinho a retalho da forma que estava antes.
“Não eram cumpridos
cinco meses após a instituição da Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do
Alto Douro, em 10-9-1756, quando eclodiu na cidade do Porto uma revolta popular
contra a Companhia que o romancista histórico Arnaldo Gama memorou em Um Motim Há Cem Anos. Serviu
também de tema na dissertação de licenciatura de Fernando de Oliveira, na
antiga Faculdade de Letras da Universidade do Porto, publicada sob o
título O Motim Popular de 1757.
Camilo Castelo Branco
relata o acontecimento em Como Deus Castiga – Crónica Portuense, mas
despreocupado com a exactidão dos factos, na irreprimível expansão da sua
imaginação criadora. No decorrer da reconstituição do motim, vão-se comentando
as apontadas versões.
Tudo aconteceu na
manhã de quarta-feira de Cinzas, dia 23 de Fevereiro de 1757. Nas igrejas
cumpria-se a liturgia da penitência e à tarde, como de costume, saía a
procissão de S. Francisco. Gente dos arredores veio à cidade.
Camilo, na obra citada, erra ao escrever que a procissão de Cinza recolhia pela
uma hora e três quarto, quando os sinos da Catedral e da Misericórdia picaram a
rebate, pois a verdade histórica é que a procissão saiu da Igreja de S.
Francisco às quatro horas da tarde depois de acalmada a cidade. O acórdão
proferido em Relação pelos juízes da Alçada em 12-10-1757, publicado em livro
no ano de 1758, sob o título Sentença
da Alçada que El-Rei Nosso Senhor mandou conhecer da Rebellião na cidade do
Porto em 1757, e da qual Sua Magestade Fidelíssima nomeou presidente João
Pacheco Pereira de Vasconcelos «…» refere expressamente que os
vendeiros se juntaram na manhã do dia 23 de Fevereiro.
Livro editado em 1758 com a sentença da Alçada e narrativa
do julgamento
(…) Arnaldo Gama,
sempre escrupuloso, também indica as 10 horas e meia da manhã para o começo da
rebelião.
O local da
concentração dos amotinados foi na Porta do Olival, à Cordoaria. A sentença o
confirma:
«Mostra-se mais, que José
Rodrigues de alcunha o Grande, João Francisco chamado o Mourão, e António de
Sousa de alcunha o Negres ou o Negro, Soldado do Regimento de Infantaria da
Guarnição desta Cidade, foram dos principais Amotinadores do Povo; de tal sorte
que o dito Soldado, sendo persuadido pelo Réu António de Sequeira Teixeira a ir
ao Tumulto, foi dos primeiros, que se acharam na Porta do Olival, aonde ele
principiou» (pág. 35, ver também pág. 42).
As mulheres que faziam
parte daquele grupo principiaram, em altos gritos, «as vozes sediciosas de Ah que
de Povo, Viva o Povo, e morra a Companhia» e para concitarem todo o povo da cidade, os amotinadores
planearam mandar tocar a rebate os sinos da Igreja da Misericórdia e da Sé
Catedral, logo que principiasse o tumulto, o que veio a acontecer.
Continua a descrição
no relatório da sentença: «Mostra-se mais que os Amotinadores para
melhor concitarem a Plebe, e fazerem mais pública e formal a sua manifesta
rebelião, determinaram que alguns rapazes levassem umas bandeirinhas
encarnadas, com ramos de oliveira, para o Povo as seguir» (págs. 53 e
54).
Desta forma, os
amotinados foram pela Rua de S. Bento, desceram as Escadas da Esnoga e tomaram
a Rua de Belomonte a caminho do Largo de S. Domingos. Levavam o propósito
previamente combinado, de se dirigirem à casa do juiz do povo, José da Silva
por alcunha o Lisboa, um alfaiate e taberneiro que morava defronte do chafariz,
interpelando-o para que tomasse a direcção do protesto.
Camilo cometeu um erro
palmar neste ponto. Afirma que José da Silva, o tal juiz do povo, morava à
entrada da Rua do Loureiro, para quem sai da Rua Chã: “Ao toque de rebate, ergueu-se
medonho alarido na Rua Chã, à entrada da Rua do Loureiro, onde morava o Juiz do
Povo, José da Silva, justamente na casa onde hoje está aberta uma loja de
barbeiro (pág. 253)”.
(…) quem morava na
primeira casa da Rua do Loureiro, do lado esquerdo no sentido de quem desce, e
que actualmente tem os números de polícia 166-168, depois da última casa da Rua
Chã - esta tem os números 133-137 -, era o Dr. Luís Beleza de Andrade.
Casa de Beleza de Andrade na Rua Chã, após recuperação
(…) Tudo se tinha
combinado previamente no sentido de que o juiz do povo, o tal Lisboa,
pretextaria o estado de doente por ter tomado uma purga e que fora violentado
ao tumulto (sentença, pág. 23), de forma a não cair nas malhas da justiça
inculpado por comparticipação no motim.
A multidão reclamava a sua presença, e escutado pretexto, rolou-se ameaçadora
contra a porta da casa pois o povo não sabia a prévia combinação com os
dirigentes do movimento. Ele apareceu e continuou a invocar a sua doença: “Viva
o povo! Eu sou do povo! Mas, senhores, eu estou muito mal…estou muito doente.
Tomei uma purga… não posso ter-me em pé”. Assim reconstrói Arnaldo Gama os seus dizeres.
Os amotinados José Rodrigues,
João Francisco e o soldado José Pinto de Azevedo foram à vizinha Rua Nova,
buscar uma cadeirinha de mãos em que, segundo o plano ajustado, devia nela ser
transportado o juiz do povo (como consta do relatório da sentença (pág. 36 - §
XVI), a fim de ser o cabecel da revolta.
(…) Assomada a Rua
Chã, a multidão já calculada em 5.000 pessoas, dirigiu-se à casa de morada do
desembargador Bernardo Duarte de Figueiredo, corregedor do crime e chanceler
das justiças, «insultando, e violentando o dito Ministro com atrevidas vozes, e
ameaças, para que desse por extinta a Companhia, como consta da sentença, o que
ele formalizou assinando os documentos, coacto, e violentando-o a que os
mandasse afixar e publicar a som de caixas, e que nomeasse para o caso as ausências
do Juiz do Povo actual, Joseph Fernandes da Silva, de alcunha o Lisboa, outro
também da sua facção, chamado Thomaz Pinto, determinando, que se fechassem as
Tavernas da mesma Companhia, e se devassassem os seus Armazéns (pág. 7 da sentença - § 1º)».
A referida casa de
morada do desembargador Bernardo Duarte de Figueiredo fica sobre o arco da
antiga Viela da Cadeia, actualmente designada Travessa da Rua Chã, e tem na
dita Rua Chã o número de polícia 92 .
Casa onde morava o Corregedor Dr. Bernardo Duarte de
Figueiredo
A mole imensa,
galvanizada pelo êxito, propôs-se continuar a cumprir o programa
preestabelecido de queimar a documentação da instituição e ajustar contas com o
provedor Luís Beleza de Andrade que morava a escassos metros do corregedor da
justiça, ao fundo da Rua Chã, ou mais precisamente, na última casa da Rua do
Loureiro, do lado esquerdo quem desce, junto da qual os amotinados ainda há
pouco tinham passado quando subiram este arruamento”.
Com o devido crédito ao Dr. Rui Moreira de Sá e Guerra, adm.
blogue “ruisaeguerra.blogspot.com”
“Em 1757 o Porto foi
palco de duas revoltas populares contra a Companhia Geral de Agricultura e das
Vinhas do Alto Douro, instituída em 1756 por Sebastião José de Carvalho e Melo,
futuro Marquês de Pombal.
O descontentamento
motivado pela formação desta companhia monopolista não só se fez sentir entre
os agentes ligados à produção e comercialização de vinho do Porto, nomeadamente
os comerciantes ingleses e seus colaboradores, mas também entre os numerosos
taberneiros, tanoeiros e pequenos armazenistas da cidade.
O primeiro e principal
motim aconteceu na manhã do dia 23 de Fevereiro ao som dos sinos da Sé e da
Misericórdia. Os amotinados, reunidos na Cordoaria e gritando palavras de
ordem, avançaram até à casa do juiz do povo, sita no Largo de S. Domingos, que
foi arrastado pela turba e conduzido numa cadeirinha por, alegadamente, se
encontrar indisposto.
O numeroso e exaltado
cortejo seguiu até à Rua Chã, ao encontro das residências do regedor das
justiças, a quem foi exigida a extinção da Companhia, e do provedor Luís Beleza
de Andrade. O escritório da Companhia, a habitação do seu provedor - de onde um
criado disparou sobre os revoltosos - e as casas vizinhas de Manuel Barroso
(secretário da Companhia) e de Custódio dos Santos (seu deputado) foram
vandalizadas.
Depois destes
episódios violentos os ânimos serenaram e pelas três da tarde a cidade já
assistia à Procissão das Cinzas. Porém, esta afronta ao poder central estava
longe de ser esquecida, pois, apesar da aparente passividade das autoridades, a
notícia do motim chegara rapidamente a Lisboa através da relação enviada pelo
Desembargador Bernardo Duarte de Figueiredo.
Cinco dias mais tarde,
a 28 de Fevereiro, D. José I ordenou a João Pacheco Pereira de Vasconcelos que
abrisse no Porto uma devassa.
A 15 de Março, pouco depois da chegada do enviado régio, rebentou
segundo motim.
Destes levantamentos
populares resultou o apuramento de 462 suspeitos, 26 dos quais foram condenados
à pena capital (21 homens e 5 mulheres), a ocupação militar da cidade por
vários regimentos da Beira, do Minho e de Trás-os-Montes, a responsabilização
dos portuenses pelo aboletamento das tropas, o lançamento de um imposto para
pagar os soldos e munições de guerra, a mudança da vereação, a extinção da
"Casa dos 24" e, ainda, a nomeação de João de Almada e Melo para
Governador do Partido Militar do Porto.
No final, oito
condenados conseguiram fugir, uma mulher escapou à forca por se encontrar
grávida e os restantes 17 sentenciados à pena capital foram enforcados ou
decapitados no dia 14 de Outubro de 1757. As suas cabeças foram colocadas nos
patíbulos e os corpos, esquartejados, expostos no Largo de S. Domingos, nas
ruas Chã e de Cimo de Vila e no terreiro de Miragaia”.
Fonte: “sigarra.up.pt”
Sem comentários:
Enviar um comentário