Revolta dos
marceneiros
“Em 1836 o convento de
S. Domingos, segundo Artur Magalhães Basto, servia para armazém de diversos
produtos da Alfândega. Estas instalações seriam invadidas quando naquele ano
ocorreu a revolta dos marceneiros, que visou a destruição de mercadoria
estrangeira importada. Durante aquela revolta vários estabelecimentos que
comercializavam foram assaltados e a mercadoria destruída, tendo-se salvado os
armazéns principais da Alfândega porque alguns funcionários da mesma as defenderam
até à chegada de reforços policiais.
Vamos primeiro
contextualizar: estamos em meados de 1836. O país vai ainda no início da sua
caminhada pela monarquia liberal, que só estabilizara realmente cerca de quinze
anos depois. A cidade passa por um período de grande aperto alimentar com a
falta do cereal, matéria-prima do pão, ao mesmo tempo que o comércio nesta
secular cidade comercial se vai abrindo aos bens comprados no estrangeiro. Ora,
se eu tenho fome mas não consigo vender os bens que produzo por não conseguir
competir com a concorrência... (isto sou eu a colocar-me na pele de um artesão
português da época); Entram agora os tumultuários (que não se lhes pode chamar
revoltosos)…
Com o devido crédito A Nuno Cruz Adm. do Blogue “A Porta
Nobre”
“Houveram ontem sérios tumultos nesta cidade,
mas nenhuma cor política os acompanhava – era a miséria e a fome a guerrear a
indolência do Governo. É este o caso.
Souberam os
sambladores que estavam desembarcando de um brigue hamburgês muitos trastes,
como mesas, cómodas, relojos (sic),
pianos, e outras cousas de mão-de-obra estrangeira. Foram ter-se com o Exmo.
Governador Civil, representando-lhe que desse as providências necessárias para
cessar o desembarque de similhantes móveis que vinham fazer a sua miséria, por
virem empatar a venda dos nacionais, e sujeitar por conseguinte milhares de
pessoas há morte. Sossegou-os o Exmo. Governador Civil dizendo-lhes que não
podia violar a Lei suspendendo o desembarque, mas que estivessem certos que
iria representar a S. M., e que havia de obter o remédio para os seus males.
Partiu o povo, mas este que não atende à lei quando a necessidade urge, foi
fazer ao Ilmo. Administrador da Alfândega a mesma petição que ao Exmo.
Governador Civil tinha feito, no que também não foi atendido.
Exasperaram-se então
os pretendentes, e determinaram fazer-se justiça por suas próprias mãos. Foram
às barcas que conduziam os móveis, e quebraram toda aquela quinquilharia, não
deixando um cavaco direito. - Não contentes com isto foram ao armazém da igreja
velha de S. Domingos, e fizeram outro tanto aos que aí se tinham já recolhido.
- Quiseram ir também a casa de Mr. Guichard, mas o Exmo. Governador Civil que
aí se achava presente, pode conseguir que se retirassem sem barulho algum. -
Dizem que alguns pequenos grupos quiseram fazer o mesmo por diversas partes. Na
Alfândega quiseram também entrar por fim, mas aparecendo o Exmo. Governador
Civil, e uma patrulha da Guarda Municipal lançando fora o grupo e fechando as
portas, pôs fim àquela pertenção.
Tanto na igreja velha
de S. Domingos, como na Alfândega, apareceu o Exmo. Governador das Armas,
sossegando o povo, e dando com ele vivas à rainha e à Carta.
Na calçada dos
Clérigos foi aonde os tumultos duraram até à noite, defronte das lojas de
Guichard e Tallone.
Chegada que foi a
noite tudo se retirou a suas casas sossegadamente, isto é – sem força alguma
que a isso os obrigasse.
Diga-se uma vez em
abono do povo – não consta que alguém fosse ofendido em sua pessoa, nem que se
cometesse roubo nem ainda do mais pequeno valor – era uma multidão inerme que
não usou de outras armas além das que lhe deu o furor desatinado.
E diga-se também em
justo louvor do Exmo. Governador das Armas, que só a sua prudência salvou o
Porto ontem dos horrores da anarquia. Nenhuma violência usou para com o povo –
e a sua presença – a persuasão e o bom modo, foram as únicas armas que empregou
para com a multidão que lhe pedia pão, ou meios honestos de o ganhar. Uma
autoridade que carregasse o povo, ou que ousasse contra ele arrancar a espada,
faria correr rios de sangue, e não conseguiria talvez o desejado fim.
(...) “
In “A Vedeta da
Liberdade”; Fonte: “aportanobre.blogs.sapo.pt”
Revolta dos marceneiros – Ed. In O Tripeiro, Série V, Ano II; Fonte: “portoarc.blogspot.pt”
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