Estavam passados cerca de 30 anos sobre o Cerco do Porto imposto pelas tropas do usurpador do trono, D. Miguel, e morria o rei D. Pedro V
(16/09/1837; 11/11/1861).
Dois anos antes, já o rei tinha ficado viúvo após o
falecimento de D. Estefânia (15/07/1837; 17/07/1859), com a qual nunca teria
consumado, de facto, o matrimónio, pois, quando foi feita a autópsia à rainha,
verificaram que continuava virgem.
Pedro era o filho mais velho do 2º casamento de D. Maria II
com o rei-consorte, D. Fernando II e neto de D. Pedro IV.
D. Maria II tinha ficado viúva em 1835, de um primeiro
casamento com Augusto Beauharnais que durou apenas 2 meses.
Pedro era dotado de uma grande cultura (teve como pedagogo
Alexandre Herculano) e de uma apurada sensibilidade artística, sendo ainda conhecedor
das novidades científicas da época.
Depois de muita insistência da família real, teria aceitado
casar-se com uma menina escolhida, para ele, filha de um príncipe Hohenzollern
e de uma filha do grão-duque de Baden.
Desenhos de D. Pedro V quando tinha 12 anos – Fonte: “gisaweb”
O casamento com a prussiana era politicamente útil.
Os noivos tinham feitios compatíveis e, acima de tudo,
Portugal precisava de um herdeiro, o que o futuro revelaria nunca se
concretizar.
Casados por procuração, o casamento só sobreviveria um ano
ao enlace, pois, a rainha morreria de difteria.
As comemorações acontecidas na cidade do Porto aquando do
casamento real foram muito participadas pelos portuenses, como nos dão conta os
textos jornalísticos seguintes.
Enquanto durou a união, o casal real dedicar-se-ia,
sobretudo, a dar o seu apoio a obras de assistência social.
Assim, sendo a saúde pública um dos interesses do casal
real, D. Pedro V correspondendo à vontade da mulher, fundou o hospital público
D. Estefânia (em Lisboa), assim como diversas outras instituições de caridade.
«Escreveu Ricardo
Jorge, nos cinquenta anos da morte da rainha: "[Estefânia] faleceu, como
se sabe, de difteria: como as falsas membranas se propagassem à vulva, os
médicos examinaram-na, ficando surpreendidos ao deparar-se-lhes o hímen".
O assunto era melindroso, e obviamente não foi divulgado. E é impressionante
lermos hoje os relatos da época: ela ia no caixão vestida de branco, grinalda
de flores brancas, sapatos de cetim branco, luvas brancas. Uma rainha virgem
para um rei virgem.»
Fonte: Cortesia do Dr. Pedro Mexia (11/04/2009), In
“publico.pt”
Depois de um primeiro enquadramento da estória de vida que
se pretende transmitir, o que interessa para aqui, é a ligação de D. Pedro V à
cidade do Porto.
Diga-se, porém, em complemento, que alguns anos antes, a 9
de Julho de 1832, tinha desembarcado na Praia de Pampolido, também conhecida
por Praia dos Ladrões, D. Pedro IV e uns milhares de patriotas, vindos dos
Açores, para fazer da cidade do Porto o seu quartel-general e daí implantarem a
liberdade e estendê-la a todo o país.
Por sinal, essa data de 9 de Julho, ainda nas últimas décadas do século XIX, era comemorada com uma festa popular levada a cabo na Praça D.
Pedro, antiga Praça Nova (actual Praça da Liberdade).
A seguir pode visualizar-se o programa dos festejos para
comemoração do 9 de Julho no ano de 1882:
Jornal “O Comércio do Porto”, em 2 de Julho de 1882
Veteranos reunidos, em 1883, durante as comemorações do
cinquentenário do 9 de Julho – Ed. revista “O Occidente”
Aquela festa lembrava as que ocorriam em honra dos oragos
das capelas de aldeia, com luminárias e bandeiras.
Bandas de música tocavam durante as comemorações, em coretos
improvisados, principalmente os acordes do “Hino da Carta” que sobrou da
revolução Liberal.
As mamãs e as meninas burguesas escutavam as flautas das
bandas dos Regimentos 6 e 18, sentadas em cadeiras alugadas e abanando-se com
os seus leques de cores berrantes,
Os visitantes passeavam-se, então, em volta da estátua do
rei-soldado e iam matar a fome e a sede ao “Restaurante Rainha” (ficava onde
hoje está a delegação do Banco de Portugal) ou ao Camanho que lhe ficava em
frente, a nascente da praça (onde hoje está o Mcdonalds).
Por sua vez, o povo originário das classes laboriosas,
olhava com curiosidade aquela burguesia, pavoneando-se como se estivessem numa
romaria da aldeia.
À noite apareciam alguns veteranos das lutas pela Liberdade
que contavam as suas histórias e passeavam as suas condecorações.
O “9 de Julho” na Praça Nova – Desenho de Manuel Monterroso
“Escrito pelo Rei D.
Pedro IV em homenagem à Carta Constitucional que o próprio outorgou aos
portugueses em 1826, o Hino da Carta (Hymno da Carta na grafia antiga) foi o
hino nacional de Portugal entre Maio de 1834 e Outubro de 1910.”
Fonte: “pt.wikipedia.org”
LETRA do HYMNO da
Carta
Ó Pátria, Ó Rei, Ó Povo,
Ama a tua Religião
Observa e guarda sempre
Divinal Constituição
(Coro)
Viva, viva, viva ó Rei
Viva a Santa Religião
Vivam Lusos valorosos
A feliz Constituição
A feliz Constituição
II
Ó com quanto desafogo
Na comum agitação
Dá vigor às almas todas
Divinal Constituição
(Coro)
Viva, viva, viva ó Rei
Viva a Santa Religião
Vivam Lusos valorosos
A feliz Constituição
A feliz Constituição
III
Venturosos nós seremos
Em perfeita união
Tendo sempre em vista todos
Divinal Constituição
(Coro)
Viva, viva, viva ó Rei
Viva a Santa Religião
Vivam Lusos valorosos
A feliz Constituição
A feliz Constituição
IV
A verdade não se ofusca
O Rei não se engana, não,
Proclamemos, Portugueses
Divinal Constituição
(Coro)
Viva, viva, viva ó Rei
Viva a Santa Religião
Vivam Lusos valorosos
A feliz Constituição
A feliz Constituição
Uma comemoração do 9 de Julho ficou célebre, quando, em 1872,
o rei Luís I e a rainha Maria Pia presidiram aos festejos, no 40º aniversário
da entrada na cidade do exército libertador.
Tudo começou a ser preparado, uns dias antes, nomeadamente, a
21 de Junho, quando se iniciaram os preparativos para os paços do concelho
serem iluminados a gás nas noites em que a família real permanecesse na cidade.
Às duas da tarde, do dia 9 de Julho, daquele ano, saiu do
edifício da Câmara uma bandeira do batalhão de Caçadores 5, empunhada por um
ex-sargento, condecorado com Torre e Espada, de seu nome, António Carlos Araújo
Mota, e que tinha estado quarenta anos antes presente no desembarque na praia
de Pampolido, que desfilou sob aplausos da multidão pelas ruas da cidade,
acompanhado por dezanove sobreviventes do batalhão dos Voluntários da Rainha,
sob o comando do general Mosqueira.
O cortejo seguiu para a igreja da Lapa, onde as comemorações
tiveram o seu início com um “Te Deum” na presença do rei, da rainha, dos
príncipes reais e do infante D. Augusto.
A cerimónia religiosa teve a oração pronunciada pelo abade
de São Cristovão de Mafamude, o célebre abade Santana, amigo de Camilo Castelo
Branco.
Ali às portas, no Campo de Santo Ovídio, as tropas de
Cavalaria 6 e cavalaria 7, começaram um desfile, que seguiu pela Rua do Almada
abaixo em direcção à Praça D. Pedro, com os Voluntários da Rainha e o seu
estandarte, à frente, seguindo-se, Caçadores 5 e Caçadores 9, Infantaria 5 e
Infantaria 18 e a Guarda Municipal.
Logo que chegados à praça, junto da estátua equestre de D.
Pedro IV, subiram ao ar os morteiros e os aplausos da multidão, enquanto que as
bandas de música tocavam o “Hino da Carta”.
A tudo isto, assistiam das varandas da Câmara, o rei, a
rainha e os membros do governo presentes.
À noite houve sessão de teatro com a representação da peça
“A Boceta de Pandora”.
De referir que as senhoras presentes tinham combinado,
previamente, apresentarem-se todas vestidas de azul e branco.
No primeiro intervalo da representação foi proferida a
partir de um camarote uma longa poesia por Manuel Vieira de Andrade, enquanto
em resposta Guerra Leal recitou um soneto.
No segundo intervalo, o entusiasmo atinge o rubro quando
Guilherme Braga declama uma poesia da sua autoria alusiva ao desembarque, 40
anos antes, do exército do Duque de Bragança.
Ao desfazer do espectáculo, quando a comitiva real voltava
para o paço ao passar defronte da igreja de Santo Ildefonso, foi lançado ao ar
um “bouquet” de setenta dúzias de foguetes.
As comemorações contemplaram ainda, nos restantes dias da
presença da comitiva real, um faustoso baile de gala na sede do Clube Portuense
e um concerto realizado no Teatro S. João, em benefício da Academia de Música
de que era director o maestro Carlos Dubini e organizado por distintas senhoras
da sociedade portuense.
Antes destas comemorações, cujo alvo era avivar a memória do
9 de Julho de 1832, decorriam no mesmo local, umas outras, com o mesmo
folclore, mas em que a motivação era diferente.
Tratava-se de assinalar, em 8 de Setembro, o dia da Senhora da Natividade, que
tinha imagem e devoção assente na chamada fonte da Natividade, aí existente e
que dava, inclusive, nome à Calçada da Natividade (hoje a Rua dos Clérigos).
Aquele dia era, assim, o da comemoração do nascimento da mãe
de Cristo.
A dita fonte era sucessora no local de uma outra chamada de
fonte da Arca que tinha já sido transladada, do que é agora a área fronteira à
Igreja dos Congregados (inexistente à data).
A fonte da Natividade estava a cota mais baixa do que a
Praça das Hortas, depois Praça Nova, descendo-se para ela por umas escadas. Em
volta existiam uns barracões de madeira, constituindo um pequeno mercado – o
mercado da Natividade.
Num nicho existente no espaldar da fonte encontrava-se uma
imagem de Nossa Senhora da Natividade, alvo da devoção e dos cuidados dos comerciantes
das redondezas.
Depois do fim das lutas liberais o complexo de fonte e
mercado foi sendo abandonado.
Primeiro a fonte, da qual alguns elementos arquitectónicos
(carrancas) foram para a Praça de Santa Teresa (hoje a Praça Guilherme Gomes Fernandes)
e, por fim, o mercado que se tinha degradado completamente.
Voltando a D. Pedro V, diga-se que morreu de febre tifóide,
no Paço de Vila Viçosa, em 11/11/1861, tendo sido acometidos do mesmo mal, no
mesmo ano, dois dos seus irmãos: o príncipe Fernando Maria Luís de Bragança, em
6/11 e o príncipe João de Bragança (Duque de Beja), em 27/12.
Desconfiando de envenenamento, o povo, de início, esboçou
amotinar-se, mas não passaria daí.
D. Luís, um outro irmão de D. Pedro V, por certo só sobreviveu
a esta catástrofe por se encontrar, à data, a viver no estrangeiro, donde foi
chamado para assumir a sucessão ao trono.
Por certo aquela desgraça teria tido a sua origem na água
inquinada de um poço existente no Paço de Vila Viçosa.
Ruben Andersen Leitão considerava D. Pedro V o «primeiro homem moderno do nosso país» e
na sua obra “D. Pedro V, Um Homem E Um
Rei”, apresenta-nos um olhar perspicaz sobre a breve vida do monarca.
Ruben Alfredo Andresen Leitão foi um escritor, romancista,
ensaísta, historiador, crítico literário, e autor de textos autobiográficos,
português, com o pseudónimo Ruben A.
Foi ele que escolheu o nome e a sigla PPD para o Partido
Social Democrata num encontro com Francisco Sá Carneiro.
Era primo da poetisa Sophia de Mello Breyner Andresen, com
quem passava umas temporadas na quinta da família que agora acolhe o Jardim
Botânico do Porto.
“Voltar ao Campo
Alegre foi para mim qualquer coisa de enorme na vida, mais importante do que ir
à Lua, ou andar em órbita à volta da Terra,”
Ruben A. (1964), In texto introdutório à edição da sua
autobiografia “O Mundo à Minha Procura”
D. Pedro V e a cidade
do Porto
Desde as lutas Liberais, durante o Cerco do Porto, de que
resultaram alguns milhares de vítimas, que a família real ficou com uma dívida
de gratidão para com a cidade.
Desse facto decorre desde essa época a atribuição pela
rainha D. Maria II, ao Porto, do título de “Antiga, Mui Nobre, Sempre Leal e Invicta
Cidade” (título único entre as demais cidades de Portugal e, ainda hoje,
presente no listel das suas armas).
Falecido D. Pedro IV, em 1834 (pois durou apenas alguns
meses para além do desfecho do Cerco do Porto), a rainha D. Maria II e o
rei-consorte D. Fernando II foram os executantes de relações privilegiadas com
as gentes do Porto.
Subindo ao trono, D. Pedro V acabou por ser o continuador da
política dos seus pais, principalmente da de D. Fernando II que governou quando
ele ainda era menor de idade.
Esteve assim ligado a várias intervenções e visitas à cidade,
e não escondia o carinho que nutria pelos portuenses.
A infância e a adolescência do monarca ficaram marcadas por
tempos de convulsões políticas e sociais, como sejam o pronunciamento de Castelo
Branco, a restauração da Carta Constitucional por Costa Cabral, a revolta
Setembrista de Torres Novas, a revolta da “Maria da Fonte”, a Patuleia e o
golpe da Regeneração.
Em 1852, com 15 anos, D. Pedro faz com os pais, a primeira
visita ao Porto, enquadrada numa mais ampla ao Norte de Portugal.
A passagem pela cidade do Porto aconteceu, numa primeira
fase, entre 29 de Abril e 5 de Maio e antes do retorno à capital, entre 18 e 22
de Maio. Pelo meio ficou uma digressão pelo norte do País.
Foi durante o breve reinado de D. Pedro V que se iniciou a
Regeneração e Portugal entrou na modernidade - de que a inauguração do
telégrafo e do caminho-de-ferro são talvez os exemplos mais evidentes.
O monarca acabaria por criar um laço com a cidade que
haveria de perdurar muito para além da sua morte.
Como rei, D. Pedro V visitou a cidade em 1860 e 1861.
Em 1860, chegaria à cidade no dia 20 de Novembro, viajando
desde Lisboa, por terra.
No dia seguinte, o jornal “O Commercio do Porto” descrevia o
término daquela viagem.
No dia 21 de Novembro de 1860, D. Pedro V esteve na abertura
da Exposição da Sociedade Agrícola do Porto (sem aviso prévio) que decorreu no Campo
da Torre da Marca e que contou ainda com a presença dos Infantes D. Luís e D.
João.
Durante a visita real à cidade do Porto, ficou célebre o
encontro que teve com Camilo Castelo Branco e Ana Plácido na Cadeia da Relação,
onde o casal aguardava julgamento, indiciados pelo crime de adultério.
Foi a 23 de Novembro de 1860 que D. Pedro V visita a Cadeia
da Relação do Porto.
“O Rei apeara
inopinadamente à porta da cadeia.
O carcereiro era um
alferes dos veteranos…
… D. Pedro V correu-o com
os olhos, e disse:
– Conduza-me às
enxovias.
Abriram-se os alçapões
dos calabouços…
Sua Majestade desceu
rapidamente, como se pisasse os tapetes das marmóreas escadarias dos régios
paços. À sua chegada uns presos petrificaram, outros ajoelharam, e alguns, voz
em grita, pediam a liberdade…
… Passou Sua Majestade
à enfermaria dos presos, e à das presas, em seguida. Na extrema desta há uma
porta que se abre para o quarto de uma senhora, que ali estava presa.
– Que é ali dentro?
– Saberá Vossa
Majestade – disse o carcereiro – que é o quarto da senhora [D. Ana Plácido].
O rei entrou, e a
senhora foi chamada do corredor aonde tinha a seu asilo de trabalho.
Com a senhora veio um
menino nos braços de sua ama.
D. Pedro V
cumprimentou a presa, perguntando-lhe o tempo de sua prisão. Reparou no menino,
e acarinhou-o, perguntando-lhe o nome e a idade. A mãe respondeu pela
criancinha, e o rei deteve-se a contemplar a infeliz. Ao lado do monarca
compungido estava o marquês de Loulé, pensando, porventura, que naquele dia
tinha de banquetear-se no palácio de ima irmã daquela encarcerada.
Saiu Sua Majestade e,
ao descer as escadas, proferiu as palavras iniciais deste capítulo:
Isto precisa de ser
completamente arrasado.”
Camilo Castelo Branco (In Memórias do Cárcere)
Retrato de D. Pedro V
A viagem de D. Pedro V ao norte do país, em 1861, teve como
principal objectivo a inauguração da Exposição Industrial Portuense, embora não
se esgotasse apenas neste acontecimento.
O rei permaneceria no Porto entre os dias 24 e 28 de Agosto,
partindo na madrugada do dia 29 para Braga, onde se demorou até ao dia 2 de
Setembro. Retorna, às 10 da manhã do referido dia ao Porto e partirá para
Lisboa definitivamente no dia 4 de Setembro.
D. Pedro V, ao contrário do que inicialmente se esperava,
viajou para o Porto “numa carruagem mala-posta”, saindo de Lisboa às 3 horas da
tarde do dia 22 de Agosto, parando em Caldas da Rainha, Leiria e Condeixa, até
Oliveira de Azeméis, onde chegou no dia 23, pelas 8 horas e 37 minutos,
pernoitando lá.
Entrou finalmente no Porto no dia 24 de Agosto por volta das
3 horas da tarde. No regresso, voltou de barco, no vapor Mindello, para Lisboa.
Sobre a Exposição Industrial Portuense diz, Pedro Joaquim
Martins, In Seminário de História Contemporânea, UP-2011:
“decorreu no Palácio
da Associação Comercial, ou da Bolsa, entre os dias 25 de Agosto e 16 de
Setembro de 1861, dedicando oito galerias, numerosas salas e o pátio à exibição
dos produtos, um autêntico estado da arte da indústria nacional ou “verdadeiro
recenseamento das forças produtivas do país.”
Sobre a estadia de D. Pedro V, diz Pedro Joaquim Martins, In
Seminário de História Contemporânea, UP-2011:
«A crónica
jornalística d’ O Comércio do Porto destacava, nesses dias, a beleza da
iluminação nocturna da cidade (curiosamente esta começou a ser iluminada a gás
em 1855, ano da aclamação de D. Pedro V) e dava-nos conta do percurso do
monarca desde a rua das Flores, onde “foi
acompanhado por grande quantidade de povo e pelas pessoas que tinham formado
alas com as tochas”, subindo para a Rua da Almada “sempre vitoriado por uma grande quantidade de cidadãos”, seguindo
para a praça de Carlos Alberto e “dali
para a rua dos Clérigos, dignando-se suas M. e A. subir ao adro da igreja, que
estava devidamente acomodada para o receber, e dali poder observar o belo
efeito da iluminação da calçada dos Clérigos e do fogo de vistas que teve lugar
na mesma rua.”»
E Pedro Joaquim Martins, continua:
“(D. Pedro V
assiste) dia 24 a um espectáculo da
companhia portuguesa no teatro S. João, enquanto no dia 25 deslocou-se ao
teatro Baquet, onde representou a companhia nacional de ópera cómica, tendo lá
voltado algumas vezes em dias posteriores para assistir a representações de
diferentes companhias.
No dia seguinte, antes
da partida para Braga, a assembleia portuense organizou um baile dedicado ao
rei, tendo a associação britânica organizado outro no dia 2 de Setembro. No
baile da associação portuense, os jornais dão nos conta que “S.M. el-rei dignou-se
a abrir o baile dançando uma contradança com a Sr.ª marquesa de Monfalin …”
Sobre o espectáculo que o rei assistiu no Teatro Baquet
dizia o periódico “A Revolução de Setembro” em 26 Agosto 1861.
“No domingo, quando
S.M. assistia ao espectáculo do teatro Baquet, houve um conflito entre o
governador civil e o presidente da câmara municipal por causa da precedência
dos camarotes […] A questão foi debater-se nos corredores para não incomodar os
espectadores, e gastou-se ali legislação sobre o grave assunto, citaram-se
autores de nomeada, foram chamadas as ordenações do reino, com um calor tal,
que a cena já começava a ter espectadores. Por fim (oh! maravilhosa resolução)
o governador civil convidou para o seu camarote o presidente da câmara, e a
ordem restabeleceu-se”.
O monarca visitaria ainda o Hospital de Santo António e o
Hospital Militar, tendo determinado que a cidade deveria ter um futuro Hospital
Militar com a dignidade que a cidade merecia.
O Hospital Militar estava sedeado no convento de S. João Novo
desde 12 de Maio de 1835 e aí se manteve até 20 de Maio de 1862, quando foi
transferido para o Hospital da Ordem
Terceira de S. Francisco até à construção do Hospital D. Pedro V.
Começado a construir em 1862, o novo hospital militar, teve
como principal mentor precisamente o soberano, que entretanto já tinha
falecido, tendo ficado, porém, para sempre, com o seu nome – Hospital Militar
D. Pedro V (descontado um período de tempo em que alguém pretendeu reescrever a
história).
Hospital Militar D. Pedro V no Lugar de Pardelhas c. 1900
Aproveitando a oportunidade, o rei decidiu também visitar
algumas unidades industriais de envergadura da cidade.
É o caso da fábrica de saboaria de Vale de Amores (V. N. de
Gaia), depois de no baile da Assembleia Portuense (palacete da Ferreirinha à
Praça da Trindade), dignar-se a prevenir o Sr. Visconde de Castro Silva, de que
na manhã seguinte visitaria a sua fábrica.
A comitiva visitou também a fábrica de tecidos da Rua do
Poço das Patas e a fábrica de estamparia do Sr. Joaquim António da Silva
Guimarães, na Rua Fernandes Tomás e, desta vez, sem anunciar.
A fábrica no Poço das Patas (Campo 24 de Agosto) era a “Companhia
de Fiação Portuense”.
A estamparia citada era a famosa “Estamparia do Bolhão”,
cujos operários haveriam de levantar um obelisco junto das instalações, para
que fosse lembrada a visita do rei.
O obelisco seria retirado em 1914 do local, apenas quando o
mercado do Bolhão foi sujeito a obras e seria transladado para o cemitério do
Prado do Repouso, onde ainda pode ser visto.
Encontra-se junto ao jazigo dos bombeiros falecidos.
Estamparia do Bolhão (à esquerda) e Mercado do Bolhão em
obras (à direita) – Ed. Alvão
Na foto acima é possível observar o obelisco que os
funcionários da Estamparia do Bolhão e da Fundição do Bolhão, que lhe era
próxima, levantaram para comemorar a visita do rei e denominado “Memória a D.
Pedro V” ou “Memória do Bolhão”.
No correr de casas da esquerda para a direita é possível
divisar, ao fundo, a capela das Almas ainda sem azulejos, que só os ostentaria
após 1929.
“Memória do Bolhão” no cemitério do Prado do Repouso - Ed. “andanhos.blogs.sapo.pt”
Depois de um salto a Braga e de uma breve estadia por lá, no
dia 2 de Setembro, às 8 da manhã, D. Pedro V parte para o Porto, onde no dia 3
de Setembro, preside ao lançamento da primeira pedra do projecto que
conduziria, em 1865, à inauguração do Palácio de Cristal, em terrenos do campo
da Torre da Marca.
Inclusive, nesta viagem, o rei aproveita um dos últimos dias
para inspeccionar as obras das linhas férreas em Valadares.
Da relação entre a cidade e o monarca sobram para memória, a
estátua na Praça da Batalha, a Rua D. Pedro V e uma outra perpendicular a esta
com o nome da rainha – Rua D. Estefânia; o museu Soares dos Reis; um quadro do
rei no Tribunal da Relação e um outro que pode ser apreciado no Palácio da
Bolsa; o obelisco do cemitério do Prado do Repouso.
Cerca de dois meses após esta visita ao Porto D. Pedro V
faleceria.
Na cidade do Porto, D. Pedro V ficou ainda com o seu nome associado
ao Museu Soares dos Reis, cujo edifício foi comprado por sua vontade e que
tinha sido a residência da família Moraes e Castro.
Antes, tinha sido também o quartel-general de D. Pedro IV
durante O Cerco do Porto, e a partir de 1840 tinha sido usado como residência
real nas deslocações efectuadas pela família real ao Porto, nomeadamente por D.
Maria II.
Após a visita régia de 1852, um jornal do jornal do Porto
anunciou a venda do palácio "o qual
tem lindas vistas sobre uma parte da Cidade, Vila Nova de Gaia, e o mar,
capela, jardim, quinta unida de terra lavradia, que dá pão, vinho, fruta e
água".
A promessa de venda do palácio só se concretizaria no
reinado de D. Pedro V em 1861, que o adquiriu.
O Tribunal da Relação do Porto criou o Museu - Sala D. Pedro
V, onde podemos apreciar um quadro de 1860 do monarca.
Cerca de 6 meses após a sua morte, a Escola Médica-Cirúrgica
prestava homenagem a D. Pedro V, ao descerrar um seu retrato.
Retrato a óleo (1860) de D. Pedro V de A. M. Fonseca – Museu
judiciário do Porto
Estátua de D. Pedro V na Praça da Batalha – Fonte: “gisaweb”
A estátua de D.
Pedro V é da autoria do escultor J. J. Teixeira Lopes (pai) e foi inaugurada em
1866.
A primeira pedra do
monumento foi lançada em 11 de Julho de 1862.
Adnirável. Uma forma simples de conhecer o muito da gloriosa História da nossa cidade.
ResponderEliminarAs multiplas facetas de D. PedroIV, são exemplos da determinação dos portuenses.
Foi pena a TUberculose tê-lo levado tão cedo. Como seria Portugal se ele tivesse vivido para além dos trinta e quatro anos?
Não merecia o sofrimento dos seus ultimos dias.
Concordo com o seu comentário e acrescento: Portugal teria, certamente, sido diferente, mas o Porto sê-lo-ia muito mais.
ResponderEliminarEsperamos continuar a merecer as suas visitas a este blogue.
Cumprimentos