18.5 Campo 24 de Agosto e ribeira de Mijavelhas
Em 24 de Agosto de 1820 eclodiria no Porto no Campo de Santo
Ovídio (actual Praça da República), uma revolução que aproveitava a ausência no
Brasil do comandante inglês, Beresford, levada a cabo por um grupo militar
fundado por Manuel Fernandes Tomás, denominado Sinédrio. Aquela data, viria a
dar desde 1 de Agosto de 1860 nome ao primitivo Campo de Mijavelhas, como Campo
24 de Agosto.
Este local teve várias denominações ao longo da história.
Na Idade Média, denominava-se Campo de Mijavelhas.
Depois, seria O Poço das Patas (sendo que uma
ponte conhecida por Ponte do Poço das Patas foi construída em 1700, e demolida cerca de 1850) e, em
1833, era o Campo da Feira do Gado (aí ali realizava-se um mercado de gado
bovino) e, também, a partir de 1839, o Campo Grande.
Aquando da invasão francesa do general Soult, na qual os
soldados invasores entraram na cidade a 28 de Março de 1809, os vereadores da
Câmara seriam intimados, segundo uma
testemunha da época, a proceder, "no
prazo de vinte e quatro horas, ao enterramento de todos os cadáveres que se têm
tirado do rio e existem pelas ruas da cidade", e continuava: "(…) e como os franceses haviam
proibido os enterros no interior das igrejas e nas cercas dos conventos onde
estivessem a funcionar hospitais ou quartéis, ao serviço deles, muitos mortos
foram sepultados numa bouça acima da feira do gado".
Aquela bouça situava-se no antigo sítio de Mijavelhas, ou do
Poço das Patas, actual Campo de 24 de Agosto, onde, por aquele tempo, se fazia
uma importante feira de gado. Diga-se ainda que, na sua fuga, ficaram em
diversos hospitais da cidade cerca de 4000 franceses feridos.
Em 1 de Agosto de 1860 por decisão camarária, foi designado
Campo 24 de Agosto. Um arruamento adjacente, hoje a Travessa do Campo 24 de
Agosto, chamou-se em tempos Monte das Feiticeiras e ligava à Travessa
de Montebelo.
Entre os mananciais para abastecimento de água mais
importantes da cidade, estava o manancial ou aqueduto do Campo Grande.
Uma das fontes que beneficiava da água daquele manancial era
a “Fonte de Mijavelhas”. Esta fonte
ficava situada onde se encontra hoje a estação do metro do Campo 24 de Agosto.
“Quem já usou a
referida estação deve ter reparado com toda a certeza no achado arqueológico
que foi encontrado no local e que retrata aquela que foi a “Arca de Água de
Mijavelhas” antigo chafariz, reservatório. A sua reconstrução aviva a memória
de todos os portuenses e relembra a sua história”.
Fonte: “monumentosdesaparecidos.blogspot.pt”
O contrato para o abastecimento de água ao domicílio, feito
entre a Câmara do Porto e a Companhia (Compagnie Général des Eaux pour
l'Etranger), é de 22 de Março de 1882.
Isto quer dizer que, até àquele ano, os cidadãos do Porto
que não tivessem poços privados, abasteciam-se nas fontes e nos chafarizes que
estavam espalhados por toda a cidade.
Por sua vez, as fontes e chafarizes eram abastecidos por
água proveniente de vários mananciais.
Os mais célebres eram: o de Paranhos ou Arca d'Água, por ter
nesta última localidade as nascentes, que eram três; o de Camões e o da
Aguardente (actual Praça do Marquês de Pombal); e outros, entre os quais estava
o manancial ou aqueduto do Campo Grande, que abastecia um significativo número
de fontes e chafarizes.
Neste local passava
um regato conhecido por Ribeira de Mijavelhas e também por Ribeira
das Lavadeiras ou ainda, Ribeira do Poço das Patas.
O topónimo
Mijavelhas, já assim chamado no séc. XIV, é uma designação pitoresca que teve
origem, segundo uma antiga tradição, por ser ali que as mulheres se
"aliviavam" quando vinham de Valongo e São Cosme à cidade,
para vender produtos agrícolas e pão nas feiras de São Lázaro.
Tinha, na
confluência das actuais Ruas do Duque da Terceira e Morgado de Mateus, bem
perto da residência dos Cirnes,
“uma ponte com
uma largura de 4 metros e assente sobre um arco de granito. Foi mandada
construir pela câmara municipal no ano de 1700 com o fim de melhorar o trânsito
da estrada Porto-Valongo, que nesse ponto descia até ao riacho e do riacho
subia até ao Bonfim. Quer dizer: o rio de Mijavelhas, nesse sítio, corria ao
longo de uma pronunciada fundura. Passados 150 anos, ao nivelarem toda a zona
do Campo Grande, ficou a ponte soterrada… Na frente do actual casario, quase no
ângulo da Rua do Bonfim, havia, ainda, abaixo do nível da rua, a Arca d’Água do
Poço das Patas, alimentada por aqueduto pela citada nascente com frontispício
de pedra encimado por brasão régio.”
In Tripeiro, Série
VI, Ano XII
Esse local passaria a chamar-se Poço das Patas devido às
características alagadiças do terreno que originava a formação de grandes poças
que as “patas” frequentavam e a ponte atrás referida era a Ponte do Poço das Patas.
Pelo Poço das Patas esteve a Casa da Pólvora.
Sobre o ribeiro de Mijavelhas um outro texto da Sociedade
Metro do Porto diz:
“…Estes trabalhos
permitiram registar uma ocupação do local entre o Séc. XIV e o Séc. XIX, com 4
grandes marcos na sua construção: 1.º, no século XIV, antes de 1384, a sua
fundação, com a construção do chafariz de Mijavelhas que consistia numa fonte
de mergulho; 2.º, no Séc. XVI, antes de 1548, com o seu alteamento em arca e a
pavimentação de uma área extensa na envolvente; 3.º, no Séc. XVII, depois de
1633, a ligação à cidade, pela alimentação da fonte da rua Chã, construída a
propósito; 4.º, no Séc. XIX, ano de 1819, com a ampliação de que resultou o
reservatório arcado.
Em paralelo, a partir do século XVIII, este espaço sofreu um paulatino
assoreamento, possivelmente devido à construção logo a jusante da Ponte das
Patas, em 1700.
Até que, por este,
desapareceu o primitivo vale da ribeira de Mijavelhas. De destacar no início
desse processo, a acumulação acidental de um depósito rico em materiais
invulgares.
Mas, de toda esta
estratificação, será de, sobremaneira, realçar a intervenção do século XVI
assinalada com armas reais de D. João III (?). Num certo esforço de organização
proporcionada do novo espaço, o indício de possível presença de um programa
arquitetónico renascentista, plausível à luz do ambiente cultural vivido, à
época, no Porto, e que é por alguns historiadores designado de Renascimento de
granito do Norte.
…Investimento
certamente justificado pela sua localização junto à saída da cidade para a
"Estrada de Valongo e além.
Em inícios do século
XIX, ainda este local se encontrava na zona periurbana do Porto, na sua saída
para a "Estrada para Valongo e além".
Remonta a sua
definição atual a 1850, altura em que a Câmara executou um aterro com vista à
regularização da sua topografia e subsequente urbanização. Tal implicou o
encanamento da ribeira de Mijavelhas e o soterramento da Ponte das Patas,
construída no ano de 1700”.
Foz da Ribeira do Poço das Patas no rio Douro
No séc. XIX havia duas feiras neste espaço, a do gado
bovino, que se realizava às terças e sextas-feiras que já funcionava em 1833 e
passou, em 1868, para o Largo da Póvoa de Cima, actual Praça da Rainha D.
Amélia e a de cavalos, que era mensal, só em 1892 foi mudada para a Praça da
Corujeira.
Uma capela da invocação da Senhora da Saúde existiu nas
imediações do actual Campo de 24 de Agosto, em frente, mais ou menos, à Rua do
Duque de Terceira, encontrando-se nela guardado o cruzeiro, transladado por
meados do século XIX, do seu local de implantação original na aldeia da Formiga
na confluência da Viela de Sacais (actual Travessa do Bom Retiro) com a Rua do
Heroísmo.
Bem perto desta capela, junto à residência dos Cirnes, teria
existido uma outra de formato redondo, onde iam rezar os condenados antes de
subir ao patíbulo em Mijavelhas. Era conhecida por ”Capela do Poço das Patas”, desaparecida no século XVIII.
Outra Capela existiu, por essas bandas, da invocação de S.
José que se situava um pouco além da saída da Rua de Santo Ildefonso.
“Nessa zona existiu,
uma capela da invocação de S. José, propriedade de um tal José Lopes, cónego
da Sé, e que se situava, sensivelmente, um pouco adiante da entrada da Rua de
Santo Ildefonso, naquele espaço que fica entre esta artéria e a Rua do Duque
de Terceira, "na margem direita do Poço das Patas, antes da entrada na
ponte", lê-se numa notícia dos meados do século XIX”.
Fonte: Germano Silva
O jardim, existente é melhorado nos primeiros anos da
República, entre 1912 e 1914, a maior parte das suas árvores são ainda
originais da altura da sua criação. Normalmente usado como local de passagem,
este jardim de forma triangular integra um lago irregular à volta do qual
predominam cedros e camecíparis ainda jovens. O jardim é dominado a norte por
um miradouro que aí foi edificado, aumentando o declive natural do terreno. Em
torno do jardim plantaram-se plátanos. A sul encontra-se uma série de
jacarandás originários do Brasil, bastante raras no norte do país. Destaca-se
no jardim uma escultura representando Afonso Costa.
Campo 24 de Agosto antes da explosão industrial
Campo 24 de Agosto - Ed. Alberto Ferreira - Batalha-Porto
Perspectiva da foto anterior. Actualmente, os prédios 1, 2 e
3 parecem coexistir
Campo 24 de Agosto antes de eclodir a explosão industrial
No início do séc XX, neste espaço, foi implantada alguma indústria
importante, podendo observar-se, em sequência, várias chaminés de fábricas, na foto e postal, que se seguem.
Campo 24 de Agosto, em 1919 - Fonte: “Bosspostcard, Delcampe”
Jardim no início do século XX – Fonte: Arquivo Municipal do
Porto
Foto actual e estátua de Afonso Costa - Fonte: Panoramio.com
Mapa do Campo 24 de Agosto, em finais do século XIX
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