Delfim Ferreira. Um
capitalista com rectaguarda familiar
A actividade hoteleira era para Delfim Ferreira (Riba-d’Ave,
1888 – Porto, 1960) uma gota de água num imenso oceano e, nestas águas, vogava
o sector energético que, para além da pioneira indústria têxtil, compreendia
muitas outras que foi abraçando ao longo da sua vida.
Tudo começou pela iniciativa de seu pai, Narciso Ferreira, que
depois de ter começado como tecelão (actividade de cariz familiar), foi
abraçando outros empreendimentos menores no sector têxtil, até que, viria a
constituir uma sociedade em 1894, com o empresário Manuel Joaquim Oliveira, o
banqueiro José Augusto Dias, o engenheiro Ortigão Sampaio e com o proprietário
José Fernandes, legalizada por escritura em 1896, denominando-se Sampaio
Ferreira & Cia. Lda. (Riba-d’Ave, Famalicão), com duzentos teares mecânicos,
alimentados pela energia de um açude construído no rio.
Mas, falar de indústria têxtil em Riba d'Ave, implica
referir a pequena fábrica de lã do Barão da Trovisqueira, a Fábrica de Sant’Anna criada c. 1883/85,
parecendo representar o primeiro aproveitamento hidráulico conhecido para o
concelho, assentando a estrutura motora do maquinismo numa turbina.
José Francisco da Cruz Trovisqueira (1824-1898),
natural de Gavião, tendo embarcado para o Rio de Janeiro, em 1834, regressou,
mais tarde, tornando-se político (administrador do concelho; presidente da
câmara municipal durante os mandatos 1868/69, 1870/71, 1872/73, 1874/75 e
1878/81; deputado em várias legislaturas), cacique do partido reformista e
depois do progressista. Participou ainda em várias iniciativas industriais,
obtendo concessões para linhas de americano (no Porto e em Coimbra) e para
a via férrea em Arganil, representando a fábrica de lanifícios
sobre o Ave a sua demonstração local como empreendedor, estabelecendo as óbvias
conexões com a sua actividade política.
A concessão que obteve c. 1870, para construir uma linha férrea
entre o Porto e Matosinhos, pelo sistema americano, foi por ele vendida, sem a
ter executado.
Um Americano puxado por muares, na Praça da Batalha –
Cortesia: STCP
“Sampaio & Ferreira”, actualmente desactivada – Fonte:
jornal “O Minho”
Voltando à família Ferreira, em 1905, Narciso Ferreira (07 /07/1862 – 23/03/1933)
fundaria a “Empresa Têxtil Eléctrica,
Lda.” (Bairros, Famalicão), concebida desde o início para utilização da
electricidade, produzida a partir de uma pequena central instalada no Ave.
O seu objecto era o de "exploração da indústria de
fiação e tecelagem de algodão e de electricidade, e quaisquer outros ramos
inerentes.
É, no médio Ave, na zona da confluência do rio Vizela com o
rio Ave, que se regista um primeiro núcleo de centrais hidroeléctricas
(centrais de Amieiro Galego, do Bairro, da Têxtil Eléctrica e de Caniços),
resultando daí um maior dinamismo na relação com os cursos de água existentes.
Para além de estarmos na presença de centrais ligadas às principais unidades
industriais associadas ao têxtil, são também aquelas que atingem ou atingiram
maior dimensão empresarial.
Outra grande fábrica (do grupo empresarial) seria montada
por Narciso Ferreira, a “Oliveira
Ferreira & Cia. Lda.”, criada em Riba de Ave em 1909.
Em sequência, em 1909, Narciso Ferreira electrificou as suas
duas outras empresas de Riba d'Ave - a “Sampaio
& Ferreira” e a “Oliveira &
Ferreira”, erguendo, para isso, a Central de Amieiro Galego, no rio Ave.
Esta central começa a funcionar em 1909 e permitiu o trabalho
por turnos, e electrificar a freguesia de Riba d'Ave que, por essa razão, foi
uma das poucas do concelho a dispor de energia eléctrica para consumo
doméstico.
O fornecimento energético ao complexo industrial (em censo
de 1928 tinha no total, 1400 trabalhadores), e o consumo doméstico viria a ser
reforçado, pela exploração da central do Varosa, da “Companhia Hidro-Eléctrica do
Varosa”, concessionada em 1907 e construída para iluminação da Régua e
de Lamego.
Esta central energética foi sendo transformada, desde 1918,
pelo grupo empresarial de Narciso Ferreira, que faz chegar a energia ao Vale do
Ave, proveniente do Varosa, reforçando-a com o funcionamento da Central Termoeléctrica de Caniços
(Bairro) e, a partir de 1925, a energia chega ao Porto, por concessão de uma
linha de abastecimento a partir da barragem do rio Varosa e da sua Central do Chocalho.
Central de Caniços da Empresa Têxtil Eléctrica, Lda., em Bairro - Fonte: Câmara Municipal de Famalicão
Note-se que, a Barragem do Lindoso, determinante para a
região Norte, apesar de concessionada em 1907, só começaria a funcionar em
1922, fornecendo energia para Porto, Gaia e Braga.
Barragem de Varosa, em Lamego – Cortesia de Vítor Oliveira
Narciso Ferreira também montou e organizou, já com a ajuda
dos seus filhos, a “Fábrica de Fiação e Tecidos (Ferreira & Irmão, 1924)” de
Vila de Conde e a “Empresa Têxtil Algodoeira de Arcozelo”, em V. N. de
Gaia.
Porém, entre os seus filhos, na condução dos negócios, a
herança do comando de Narciso Ferreira (falecido em 1933), vai para o filho Delfim
Ferreira que, face ao eclipsar natural de Narciso Ferreira, vai lançar outros
projectos, em diferentes áreas.
Assim, Delfim Ferreira terá um papel fundamental no fabrico
de seda artificial, em Portugal, com a criação, em 1930, da “Empresa Nacional
de Sedas” (sedeada em V. N. de Gaia, Arcozelo, Aguda) e, em 1951, funda a “Sociedade
Industrial do Mindelo”, em Vila do Conde.
A grande capacidade de inovação industrial revelada por
Delfim Ferreira foi reconhecida, a nível nacional, tendo o Governo convidado o
industrial a aproveitar as águas do rio Ave, nascendo então a “Companhia
Hidro-Eléctrica de Portugal”, apoiada na Barragem do Ermal (funcionando por gravidade) e na sua Central de Guilhofrei, com
funcionamento a partir de 1938.
Barragem do Ermal e albufeira – Fonte: “portugalfotografiaaerea.blogspot.com”
Pela associação em 1943 da “Companhia Hidro-Eléctrica de Portugal”
e da “Companhia
Hidro-Eléctrica do Varosa” (que
tinha associado as centrais eléctricas de Chocalho e do Caniço) resultaria o aparecimento da “CHENOP” – “Companhia Hidro-Eléctrica do Norte de Portugal” que, tendo
sido nacionalizada em 1975, ficou sob a alçada da EDP.
Em 1953, e novamente a convite do Governo, Delfim Ferreira
explorou as águas do rio Douro, dando origem à “Hidroeléctrica do Douro”.
Delfim Ferreira, noutras áreas de negócio, foi ainda o
responsável pela construção de grandes edifícios na Avenida António Augusto
Aguiar e Sidónio Pais (em Lisboa) e na Rua Sá da Bandeira (Porto).
Entre todos eles, destaca-se o Palácio do Comércio (na parte
nova da Rua Sá da Bandeira) projectado em 1944, pelos arquitectos David Moreira
da Silva e Maria José Marques da Silva Martins (respectivamente genro e filha
do arquitecto Marques da Silva).
A escultura “O Triunfo da Indústria”, que assenta na sua
platibanda, é da autoria de Henrique Moreira.
Palácio do Comércio – Fonte: Fundação Marques da Silva (“arquivoatom.up.pt/”)
Outra área que Delfim Ferreira explorou, foi a da produção
vinícola, nomeadamente a ligada ao vinho do Porto, tendo criado, nas suas
explorações vinhateiras, no Douro, novos métodos de produção vinícola e de
arroteamento, nomeadamente nas suas propriedades de “Quinta dos Frades”
(Armamar) e “Quinta do Castelo” (Santa Marta de Penaguião).
“A Quinta dos Frades,
primitivamente designada de Quinta da Folgosa, como é referida nos documentos
mais antigos, localiza-se na freguesia da Folgosa, concelho de Armamar. As suas
origens remontam ao século XIII, tendo sido doada aos monges do Mosteiro de
Santa Maria de Salzedas em 1256, como comprovam os dois Brasões da Congregação
Autónoma dos Cistercienses de São Bernardo de Alcobaça que a quinta possui. Foi
uma das mais ricas e produtivas quintas deste Mosteiro.
(…) Com a extinção das
Ordens religiosas e dos seus mosteiros em 1834, como foi o caso do Mosteiro de
Santa Maria de Salzedas, ao qual pertencia a Quinta dos Frades, os bens destes
mosteiros foram inventariados e colocados à venda em hasta pública. A Quinta
dos Frades, acabaria por ser arrematada a 6 de Novembro de 1841 pelo 1º barão
da Folgosa, Jerónimo de Almeida Brandão e Souza, mantendo-se na posse dos seus
herdeiros, sua filha e marido (Conde da Folgosa) até 1941.
Em 1941, o Comendador
Delfim Ferreira, um importante industrial e impulsionador da economia
portuguesa, adquire a Quinta dos Frades, levando a cabo um projecto de
reabilitação da mesma, da autoria do arquitecto Rogério de Azevedo, também
responsável pelo projecto do emblemático Hotel Infante Sagres, mandado
construir por Delfim Ferreira. A quinta passava agora a estar dotada de
infraestruturas modernas de produção e de lazer e Delfim Ferreira introduziu
também o método de plantação das vinhas em declive livre.
Já nos anos 70 do
século XX a Quinta dos Frades, vê a sua área reduzida pela construção da
Barragem de Bagaúste e pelas obras de desvio da E.N. 222, tendo sido
expropriada uma grande área incluindo os terrenos abaixo do solar onde estavam
implantadas as vinhas mais antigas. Actualmente a quinta possui cerca de 200
hectares de área.
Após décadas a
produzir para outras casas exportadoras de vinho e de um período de
reestruturação, finalmente em 2008 os bisnetos de Delfim Ferreira, aproveitando
as potencialidades das vinhas da quinta, iniciam um projecto de produção do
primeiro vinho de mesa com a marca “Quinta dos Frades”, contando presentemente
com mais marcas e uma edição especial dedicada ao Comendador Delfim Ferreira”.
Fonte: “quintadosfrades.pt”
Marco Pombalino da Quinta dos Frades
Quinta dos Frades, na Folgosa, Armamar
Delfim Ferreira morreu em 1960, na sua casa na Quinta de
Serralves, que tinha adquirido nos anos 50 ao conde de Vizela.
Casa de Serralves
2. Hotel Aliados
O Hotel dos Aliados, que já foi Pensão dos Aliados, é o
único de 3 estrelas existente na Avenida dos Aliados.
“Numa zona onde
existiam outrora duas ruas muito movimentadas e um conjunto de ruas curtas e
vielas a que chamavam “os lavadouros”, a demolição em 1916 do palacete barroco
da Praça da Liberdade — que desde 1816 alojara a Câmara do Porto — representou
o primeiro passo para a edificação do que viria a ser a Avenida dos Aliados,
que deriva de Avenida das Nações Aliadas com que foi baptizada aquando da sua
inauguração em homenagem à vitória aliada na 1ª Guerra Mundial (1914-1918).
Desde meados do século
XIX, a Praça da Liberdade era já o “ponto
predilecto de reunião dos homens graves da política e do jornalismo, da alta
mercancia tripeira e dos brasileiros”. Projectada pelo arquitecto inglês
Barry Parker, a Avenida dos Aliados veio estabelecer a ligação entre esta praça
e a da Trindade, convertendo-se prontamente numa espécie de “sala de visitas da cidade”.
A avenida está rodeada
de edifícios monumentais e coroada na sua parte superior pelo edifício da
Câmara Municipal, constituindo um conjunto harmonioso com fachadas decoradas de
forma a criar um ambiente monumental e luxuoso, entre as quais se encontra o edifício
que alberga desde 1932 o Hotel Aliados..
É neste contexto
efervescente que Fernando Guimarães inaugura, em 28 de Maio de 1932, a Pensão
dos Aliados. O seu filho, Manuel Guimarães, viria a ser um nome de marca da
relevância no cinema português, sobretudo enquanto realizador, (Costureirinha
da Sé) mas também enquanto assistente de realização, operador ou repórter
cinematográfico. O seu potencial artístico ver-se-ia no entanto ferozmente
travado pela censura e pela falta de financiamento.
Visitada por gente
ilustre, frequentemente ligada à arte e à cultura, a Pensão dos Aliados viu
também crescer o filho de Manuel Guimarães, Dórdio. Poeta, cineasta,
ficcionista e jornalista, Dórdio Guimarães celebraria em 1990 um casamento de
conveniência com a sua colaboradora e amiga, a célebre intelectual, poeta e
activista social Natália Correia, que contava por essa altura 67 anos de
idade”.
Fonte: “hotelaliados.com”
“Por falecimento dos
pais — Fernando Guimarães e D. Bibelinda Pinheiro de Guimarães — respectivamente
a 25 de Março de 1946 e a 27 de Maio de 1945, sucede-lhes a 16 de Agosto de
1946, Álvaro Pinheiro de Guimarães, que já exercia a gerência da pensão desde
15 de Novembro de 1934.
Quando, a 15 de
Setembro de 1971, falece Álvaro Pinheiro de Guimarães, a gerência passa para o
Sr. Acácio Martins. A Pensão dos Aliados seria adquirida a 28 de Janeiro de
1987 por Agostinho Barrias, tendo actualmente como sócio-gerente e director o
Sr. Fernando Barrias, e viria a ser finalmente restaurada em 2012, convertendo-se
no Hotel Aliados ao abrigo da nova lei da Direcção Geral de Turismo.
A família Barrias é
também responsável por locais de referências como os cafés Guarany e Majestic,
o Hotel Internacional, o Hotel Vera Cruz, e o Hotel Pão de Açúcar”.
Fonte: “portonosso.pt”
Pensão Aliados - Fonte: “hotelaliados.com”
Natália Correia numa varanda da “Pensão dos Aliados” –
Fonte: “hotelaliados.com”
“Hotel Aliados” e, no rés-do-chão, o “Café Guarany”
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