“A fábrica criada por
Ferdinand Claus e Georg Phillip Shweder mantinha no anonimato a origem dos seus
produtos, utilizando a marca “FPC” (as iniciais de Fábrica de Produtos Chimicos) nas suas embalagens, como forma de
poder fazer frente ao espirito português de depreciação dos produtos nacionais
em prol dos estrangeiros, conquistando assim a preferência não só dos
consumidores como também dos revendedores.
Esta pequena mas
próspera industria, iniciou-se de forma modesta na Rua de São Dinis, perto do
antigo matadouro, num armazém de uma única e grande porta, um recinto amplo com
uma pequena caldeira de vapor, os recipientes para a saponificação e outros apetrechos
indispensáveis para o fabrico e acabamento dos produtos.
Mais tarde em 1891,
visto que os produtos que fabricavam já tinham ganho reconhecimento no mercado,
Ferdinand Claus decide criar uma fábrica de raiz, comprando um terreno na Rua Serpa Pinto, 195 onde se construiu
uma fábrica dotada de máquinas de vanguarda, iguais às que uma casa francesa da
especialidade apresentou na Exposição de Paris em 1887. As preocupações da
Claus & Schweder iam além da inovação tecnológica, pois eram frequentes as
viagens de estudo a laboratórios estrangeiros da especialidade, trazendo
consigo as últimas novidades nesta indústria.
Toda a documentação
legal sobre esta fábrica surge a partir de 1891, nomeadamente o Alvará de
Licenciamento que se encontra no Arquivo Distrital do Porto, bem como o registo
industrial do nome da empresa e também as licenças de obra pedidas à C.M. Porto.
Os Boletins de Propriedade Industrial existentes no INPI (Instituto Nacional de
Propriedade Industrial), dão conta que o nome Fábrica de Produtos Chimicos composta por três letras (F.P.C.)
entrelaçadas em forma de monograma e tendo por baixo os dizeres “Marca da
Fábrica”, foi registado por Ferdinand
Claus em 1892. E só em 1895 é
registado o nome Fábrica de Produtos Chimicos Claus & Schweder.
A construção da nova
Fábrica teve várias fases de acordo com as licenças de obras requeridas à C.M.
Porto relativas ao novo edifício na Rua Serpa Pinto, tendo a construção do
edifício ter sido iniciada em 1891. Em 1895 é requeria uma licença para a
construção de uma rampa de acesso e só em 1896 é que é construído um anexo
destinado ao escritório da fábrica. Um ano mais tarde, em 1897, é construído um
armazém e uma casa para o guarda. Apenas em 1907 são construídos novos
escritórios e armazéns na Fábrica, sofrendo ainda outras ampliações em 1910 e
1911, requeridas por Ferdinand Claus. Após esta data, não se conhecem mais
licenciamentos de obras relativas a intervenções realizadas no edifício a
pedido de Ferdinand Claus ou da Claus & Schweder.”
Cortesia de Sónia Couto (“Industria Portuense de Sabonetes e
Perfumaria – As Emblemáticas Fábricas Claus & Schweder e Ach. Brito“, In Revista
“O Tripeiro”, 2017)
Com o antigo matadouro lá bem ao fundo, esteve, por aqui,
até 1929, a “Fábrica de Produtos Chimicos
(FPC) e, a partir de 1895, a “Claus & Schweder”, quase em frente ao
“Quartel de Cavalaria, nº 9” – Fonte: Google maps
Única gravura conhecida da fábrica “Claus & Schweder”,
na Rua de Serpa Pinto, nº 195
A origem dos sabonetes produzidos era, de início, escondida
dos revendedores que julgavam vender artigo importado. À época, o nosso País,
que se conhecesse, não produzia nesse ramo da higiene pessoal.
O desvendar do segredo é contado no livro de comemoração das
bodas de ouro da Claus & Ach. Brito, do seguinte modo:
“ (…) quando a senhora
que costumava transportar as caixas de cartão onde eram acondicionados os
sabonetes, que eram fabricadas fora, ao atravessar o largo do Carmo no caminho
para a Fábrica na Rua de Serpa Pinto, tropeçou e caiu com ela a grade
cheia de caixas, estas espalharam-se pelo chão e logo quis o destino que
passasse nesse instante por ali um dos seus revendedores. Ao descobrir que
afinal os sabonetes não vinham do estrangeiro, este revendedor terá ido a correr
ao escritório de Ferdinand Claus, demonstrando a sua indignação. Claus, porém,
com o seu fino tato e com a razão que lhe assistia, não teve dificuldades de
maior em fazer-lhe ver a necessidade desse inocente e legítimo subterfúgio, num
país onde a mania de adorar o que é estrangeiro e de mal tratar o que é
nacional, teriam de outra forma impedido a criação da sua indústria. E o
“descobridor” prometeu guardar segredo e continuar a comprar os mesmos
sabonetes “estrangeiros” de tão boa qualidade.”
À época, a “Claus & Schweder” era uma empresa já
conceituada e com prémios ganhos, desde a Exposição Industrial Portuguesa, em
1897 (medalha de ouro), e outras distinções internacionais, destacando-se,
ainda, em 1907, o prémio conquistado na Exposição Agrícola do Porto.
Entre os produtos produzidos, são salientadas também as
águas de toilette “Violette de Parma”, a “Coriopsis do Japão” (grande perfume
da moda), a “Água de Colónia” e a “Água de Cassandra”. Na perfumaria
destacavam-se o “Muguet”, “Peau d’espagne”, Yiang-Yiang”, “Heliotrope”,
“Lilas”, “Jasmim”, “Royal Bouquet” etc.
Em relação aos sabonetes, desde os mais vulgares aos mais
finos e extra-finos, destacavam-se naquela época o “Violeta de Cintra”,
“Marguerite”, “Rainha de Portugal”, “Luzitana”, “Rainha das Flores”, “Fleurs du
Congo”, “Portuguez”, “Lilás”, “Suc-de-Laitue”, “Lana”, “Patchouly”,entre
outros, e ainda os sabonetes transparentes “Santa Izabel”, “Antoninos”,
“Benjoim”, etc.
Devido ao progresso da fábrica, foi decidido estabelecer em
Lisboa um depósito geral, na Rua da Prata.
No Porto, o depósito geral esteve na Rua Sá da Bandeira, nº
183, até 1904, ano em que passou a estar junto à fábrica, num anexo.
Na Rua de Sá da Bandeira, teria ocupado um prédio, situado
onde hoje assenta uma das estátuas equestres (a situada do lado nascente), da Praça D. João I, que
como é óbvio, já foi demolido, há algumas décadas.
Ferdinand
Claus já vivia, naquele ano de 1904, na Rua da Índia, à Foz do Douro.
Projecto de
Mirante que Ferdinand Claus se propunha, em 1904, levantar nos terrenos da sua
casa, à Rua da Índia (à data com o nº de polícia, 48) e que confinava, também,
com a Rua Marechal Saldanha
Casa de
Ferdinand Claus, à Foz do Douro, c. 1908
A foto anterior
faz parte do espólio de Aurélio da Paz dos Reis, entregue pelo seu neto Hugo,
filho do seu terceiro de quatro filhos, de seu nome Hugo da Paz dos Reis (1891-1949),
ao Centro Português de Fotografia, em 1997.
Em 1903,
Achilles de Brito, com 24 anos, chega à “Claus & Schweder”, fábrica
erguida pelos dois empresários alemães, no Porto, com o cargo de guarda-livros,
na mesma altura em que um dos sócios, Georges Schweder, se retira da
empresa, por razões de saúde.
.
Publicidade aos sabonetes e perfumes da “Claus e Schweder”,
na Rua Serpa Pinto, nº 195, em 1905
Claus & Schweder, em 1906, na Rua de Serpa Pinto
Em Dezembro de 1908, o rei D. Manuel II, durante uma visita
que faz ao Porto e ao Norte do País, visita as instalações da “Claus &
Schweder” e abre com a sua assinatura o Livro de Honra.
No fim daquele mês, a 30 de Dezembro de 1908 (data da
escritura), Achilles de Brito e WillyThessen (chegado à empresa em 1905) entram
para a sociedade como sócios e assumem os cargos da gerência comercial e
financeira e direcção técnica, respectivamente.
A partir daí, a firma adquire novo registo como “Claus &
Schweder, Sucessores”.
Com o eclodir da 1ª Guerra Mundial, a empresa seria afectada na sequência do conflito entre Alemanha e
Portugal, já que um dos seus fundadores, Ferdinand Claus e o sócio Willy
Thessen, também director da empresa, entrado em 1905, são obrigados a recolher
à Alemanha.
Acontece que um dos primitivos fundadores de seu nome Georg Phillip Shweder, já se tinha afastado
da empresa, por razões de saúde, em 1903.
Assim, esta empresa, em
1917, foi nacionalizada, mas findo o conflito, Willy Thessen voltaria, como sócio e director técnico, por
convite do novo proprietário, Aquiles de Brito.
Na sequência da nacionalização da “Fábrica Claus & Schweder, Sucessores”, foi nomeado para
administrador depositário dos bens de Ferdinand Claus, no Porto (incluindo a fábrica),
Aurélio da Paz dos Reis e, dos bens em Lisboa, José Ferreira Amado.
A fábrica, por solicitação de Aquiles de Brito, foi
autorizada a continuar em funcionamento, porém, acabaria por ser colocada à
venda e adquirida em Maio de 1917, por um industrial do Porto, Engº Américo
Augusto Vieira de Castro, que era dono da “Fundição Tipografica Portugueza”,
que produzia tintas e vernizes.
Na sequência da compra da fábrica, é fundada, a 9 de Maio
1917, a “Companhia Portugueza de Perfumaria”.
Foram, então, realizadas obras no edifício da primitiva fábrica,
em 1918, a pedido da nova companhia.
“Entretanto Achilles
de Brito, homem de personalidade forte, persistente e batalhador, não baixou os
braços e logo em 1917 adquire um terreno dando inicio à construção da Fábrica
Ach. Brito. Em 1918 Achilles Brito, juntamente com o seu irmão Affonso Alves de
Brito, fundam a Ach. Brito & Companhia na Rua D. António Barroso, 270, uma
fábrica moderna semelhante às existentes em França, que viria a reforçar a sua
equipa, em 1920, com a entrada de Willy Thessen, como técnico e sócio, que já
tinha dado provas da sua qualidade como perfumista-químico na Claus &
Schweder.
Affonso de Brito, além
de sócio era responsável pelos serviços de contabilidade.
Além do edifício onde
funcionava a fábrica e escritórios, a Ach. Brito possuía uma agência em Lisboa
que, em 1921, localizava-se na Rua de S. Nicolau e, posteriormente, passou para
a Rua do Poço do Borratém, nº 13, junto ao Martim Moniz.
Em 1919, a Companhia Portugueza de Perfumarias,
Sucessora de Claus & Schweder Sucessores, é dissolvida derivado à sua
fusão com Companhia Industrial do Norte
(CIN), uma outra empresa fundada em 1917 e que foi resultado da
transformação da Fundição Tipografica Portugueza. Desta forma, esta nova
sociedade passava agora a dedicar-se à produção de óleos, sabões, tintas e
vernizes. A Fábrica da Claus &Schweder Sucessores, na Rua Serpa Pinto no
Porto, continuava em laboração, agora com esta nova designação, conforme nos
dão conta os rótulos dos seus produtos, que agora passam a constar com a sigla
CIN.
Neste período existem licenças de obra que foram requeridas pela
Companhia Industrial do Norte para
intervenções realizadas no edifício da Fábrica da Claus & Schweder,
Sucessores, obras essas realizadas em 1919, 1922 e 1923, que incluíam
ampliações de armazém, construção de cozinha e sanitários e ainda a reconstrução
de uma parede do portão”.
Cortesia de Sónia Couto (“Industria Portuense de Sabonetes e
Perfumaria – As Emblemáticas Fábricas Claus & Schweder e Ach. Brito“, In Revista
“O Tripeiro”, 2017)
Willy Thessen, Achilles de Brito e Affonso de Brito (imagem
do acervo fotográfico da Ach. Brito) c. 1924
Em 31 de Dezembro de 1924, Aquiles de Brito compra à CIN a
fábrica da Rua Serpa Pinto.
Faz uma triagem dos equipamentos adquiridos e dos produtos
fabricados, sabonetes e perfumes.
O edifício da Rua de Serpa Pinto manteve-se até 1928 e, em
1929, é completamente desactivado, passando a produção a ser feita no edifício
ocupado pela “Ach Brito”.
O novo edifício ficava na Rua D. António Barroso, com “Ach. Brito. 1918. Sabonetes” numa
ponta e “Claus. 1887. Perfumarias”
na outra ponta, e com aquelas datas, bem gravadas na fachada.
Entretanto, o edifício da fábrica da Rua de Serpa Pinto, em
1929, é arrendado à “Citroen”, em 1941, é vendido à Fábrica de Artefactos de
Borracha (FABOR) e, em 2008, o que restava dele, foi demolido e hoje, aquela
área, é ocupada por um prédio, propriedade da IURD (Igreja Universal do Reino
de Deus).
Como curiosidade, diga-se que Willy Thessen, em 1925, vindo de um outro casamento, já pai de duas filhas, acabaria por fazer um segundo matrimónio, do qual resultaria uma filha e um filho, com Maria Joana Andressen, que tinha também sido casada em primeiras núpcias com Walter Stüve, e era uma das filhas de João Henrique Andressen e de Joana Henriqueta Lehmann.
Como curiosidade, diga-se que Willy Thessen, em 1925, vindo de um outro casamento, já pai de duas filhas, acabaria por fazer um segundo matrimónio, do qual resultaria uma filha e um filho, com Maria Joana Andressen, que tinha também sido casada em primeiras núpcias com Walter Stüve, e era uma das filhas de João Henrique Andressen e de Joana Henriqueta Lehmann.
De acordo com o "Anuário Comercial do Porto" para
1935, Willy Thessen tinha residência na Rua do Campo Alegre, 1379.
Aliás, esta morada era vizinha do palacete da família
Andressen na mesma rua.
Em 1940, a propriedade que Willy Thessen possuía na Rua do
Campo Alegre, seria expropriada, em parte da sua área, em virtude de um
alinhamento efectuado na Rua do Campo Alegre.
Hoje, naquela propriedade, estão as Residências
Universitárias Campo Alegre I.
Local da residência de Willy Thessen, na Rua do Campo Alegre
– Ed. Duarte Azevedo
Porém, em Dezembro de 1935, já Willy Thessen solicitava ao
arquitecto António Júlio Teixeira Lopes um projecto para construção de uma
moradia na Avenida Marechal Gomes da Costa.
Se a intenção da construção desta nova futura residência se
destinava a ser afecta ao casal, o certo, é que ela acabaria, durante o
conflito da Segunda Guerra Mundial, por ser a residência do cônsul alemão na
cidade do Porto.
Algumas curiosidades, em sequência daquela ocupação, são
descritas no texto seguinte, pelo cônsul dos USA, Vernon Penner, chegado à
cidade do Porto em 25 de Janeiro de 1975.
“Dizia-se que essa
enorme casa com jardins encantadores (considerada a mais bonita de qualquer
consulado americano na Europa) tinha sido igualmente a residência do cônsul
alemão durante a Segunda Guerra Mundial e que um túnel a ligava ao mar. Nunca
encontrei pinturas nazis nas paredes, mas posso dizer que existiam grandes
suportes de metal nas madeiras sob o telhado, capazes de suportar o equipamento
pesado de comunicações, e sim – existia um túnel lateral, na saída do velho
poço, no pequeno pátio. Reparei nele, mas não podia entrar, porque a água do
poço tinha desaparecido durante uma seca severa.”
In “Quando Portugal Ardeu” da autoria do jornalista Miguel
Carvalho
Mais tarde, a casa teve funções idênticas, mas servindo de
residência ao cônsul dos USA, conforme o descrito no texto anterior.
Desenho de fachada principal de projecto de uma moradia para
a Avenida Marechal Gomes da Costa, 720 – Fonte: AHMP
A vivenda do desenho anterior foi demolida em 2019, para a
construção de uma série de moradias integrantes de um condomínio fechado.
Antes de 2019, a moradia mandada erguer por Willy Thessen
estava para lá do muro – Fonte: Google maps
Condomínio Marechal 720 – Fonte: “idealista.pt”
Voltando à história da "Ach Brito",
“O sabonete Patti é lançado em 1929 em homenagem à cantora de ópera italiana Adelina Patti. O sucesso foi instantâneo. Durante a década de 20 e o início dos anos 30, a marca acumulou vários prémios, não só pela qualidade dos produtos, mas também pela riqueza estética dos rótulos e embalagens. Enquanto a Claus Porto atravessava fronteiras, a Ach. Brito conquistava as famílias portuguesas. Em 1934, o Porto recebia a Exposição Colonial Portuguesa e com ela uma ótima oportunidade para as marcas portuguesas se divulgarem. A Ach. Brito deu tudo. Contratou Heinrich Gleiser, um alemão que caminhava sobre andas, a quatro metros do chão. Além de reproduções de produtos em proporções gigantes, foram atirados sabonetes para quem quisesse apanhar”.
Cortesia de Mauro Gonçalves, In jornal “Observador” (22/07/2018)
Ach Brito c. 1924, na esquina da Rua D. António Barroso e da
Avenida de França
Mesma perspectiva de foto anterior (hoje, um condomínio
fechado) – Ed. Google maps
Ach Brito e a sua fachada voltada para a Avenida de França,
c. 1920
Fachadas das antigas instalações da “Ach Brito” - Ed.
facebook.com/Ach-Brito
Carrinha de transporte de carga da Ach Brito (imagem do
acervo fotográfico da Ach. Brito)
Heinrich Gleiser, o homem das andas, a distribuir sabonetes
Ach. Brito na Exposição Colonial Portuguesa, em 1934 (imagem do acervo
fotográfico da Ach. Brito)
Publicidade à pasta de dentes "Superba" - In Ilustração Portugueza, Março de 1935
(Continua)
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