Antigamente, as
pessoas deslocavam-se a pé ou com o auxílio de animais. Para vencer a distância
entre locais mais distantes, o povo mais humilde, continuava em muitos casos, a
fazê-lo de modo pedestre ou recorria normalmente aos burros, quando os tinham.
Os mais abastados
faziam uso do cavalo e, mais tarde, de veículos por eles movimentados, como a
liteira e a sege.
Por vezes,
recorriam à força humana de outrem, como era o caso das cadeirinhas, que
começaram em meados do século XVII a aparecer no Porto.
Cadeirinha
Liteira
Sege exposta no
Museu de Lamego
Nas primeiras
décadas do século XVIII, na cidade do Porto, apareceu o que se pode chamar de
um primeiro transporte colectivo.
Consistia num
caixote enorme, puxado por uma junta de bois, com a forma de um prédio, munido
de quatro rodas, com duas fachadas laterais de cinco janelas, cada uma, e porta
ao fundo, ao qual o passageiro subia por quatro degraus de escada guarnecida
por um corrimão. Tinha dois bancos corridos laterais para 8 ou 10 pessoas, cada
um. Era o “Carroção”.
Em 1836, deu brado,
um acidente que sofreu uma família vinda do teatro, no seu carroção. Acontece
que, estando a passar uma banda marcial do exército, em plena actuação, os bois
lançaram-se, assustados, e dispararam a correr rua abaixo.
Separaram-se do carro que, aos trambolhões, se imobilizou em frente à fonte, e
continuaram a sua marcha rebocando apenas as rodas frontais, até populares os
imobilizarem em frente à igreja da Misericórdia (Rua das Flores)!
«Num outro apontamento, na Vedeta da Liberdade de dezembro do ano seguinte, 1837, entre
vários casos policiais relatados, conta-se a da prisão de um indivíduo
que “furtou uma junta de bois à
porta do Teatro, que aí tinham conduzido um carroção com a família dos
Machadinhos”.
E, para finalizar, vejam-se estes curiosos anúncios de outubro
do mesmo ano, também da Vedeta,
que se referem a carroções, mas também a outros meios de transporte. Com
efeito, estava para venda “um
carroção de muito boa figura, seguro, e em bom uso; uma traquitana quase nova,
e uma caixa de sege com cortinas, vários arreios de bolea [sic], e duas
cadeirinhas”. Na Vedeta do mesmo mês “vende-se um carroção de bom gosto montado em boas molas”. Já em
novembro outro que diz “quem pretender
comprar uma elegante carruagem inglesa, fale com o Segeiro Francisco José Gomes...”.»
Cortesia de Nuno
Cruz, do blogue “A Porta Nobre”
A ligação entre o
Porto e a Foz do Douro ou Matosinhos, feita por carroção, ficou célebre pela
pena de muitos escritores.
Carroção com 4
janelas laterais
“O carroção
tinha, por aquele tempo, dois séculos de moda.
O carroção era puxado a bois, partindo da cidade do Porto
pelas cinco horas da madrugada para estar em Matosinhos ao meio dia em ponto.
Os carroções do Manel Zé de Oliveira ficaram para sempre
na história pela pena de Ramalho Ortigão ou Alberto Pimentel”.
O carroção para rumar, por exemplo, à Foz do Douro, na mesma
manhã, era ronceiro demais para o permitir. As famílias preferiam, para esses
casos, o aluguer de burros - a “burricada”.
Neste negócio, os animais que eram mais pretendidos
pertenciam aos empresários do ramo, conhecidos por “Mariquinhas do Laranjal” ou “Corta-Macho”.
Noutro âmbito,
Manel Zé ou José Manuel Oliveira era, à data, o empresário que pontificou, no
Porto, durante muitos anos, como alugador dos carroções.
Um dia a
concorrência surgiu sem avisá-lo, como conta Ramalho Ortigão.
“…O primeiro golpe na popularidade enorme de Manel Zé foi-lhe verberado pelo segeiro Tavares, da rua da Boavista. Em
certo dia de função suburbana Tavares pôs na rua três carroções novos, de cores
extraordinárias, maiores do que os de Manel Zé e aperfeiçoados com o apenso
festival de uma bandeira. Estes três carroções chamavam-se o Rápido,
o Veloz e o Ligeiro.”
Ao carroção sucederia o “Ónibus” ou “Omnibus” ,
que terá sido introduzido na cidade, em
1839, aquando da constituição da Companhia de Transportes União que,
para o efeito, importou quatro coches. Era movimentado por quatro
muares, mais tarde substituídos por quatro cavalos, tomando, então, o nome de Char-à-Bancs.
O Ónibus era, como
o carroção, uma grande caixa com 4 rodas.
Tinha 6 janelas e,
sobre o tecto, um assento que se chamava varanda.
Existiram duas carreiras de Char-à-Bancs, com
bastante movimento, tendo por destino a Foz do
Douro: uma, partia do Largo do Carmo para a Foz do Douro, a 6 vinténs; outra,
com o mesmo destino, saía da Porta Nova, a 4 vinténs.
Cada passageiro podia fazer-se acompanhar de 7 quilos de bagagem,
no máximo.
Uma estação de Char-à-Bancs, situada no começo da Rua do Bonjardim
e da igreja dos Congregados, fazia ligações à estação ferroviária das Devesas e,
por isso, tinha um movimento desusado.
A estação de Char-à-Bancs ficava na rua em frente (Rua do
Bonjardim, antes de 1916). À direita, é a Rua de 31 de Janeiro e, à esquerda,
encoberta, estará a igreja dos Congregados
Char-à-Bancs
Também havia o serviço de carreiras, em caleches, entre o
Porto, Foz do Douro e Leça da Palmeira.
Para a Foz do Douro, da Porta Nova (Miragaia), o preço era
80 réis; do Carmo, 120 réis.
De Cedofeita para Matosinhos e Leça, cada viagem custava 240
réis.
Caleche aberta na dianteira, com 4 rodas e 2 assentos
Quem não pretendesse utilizar os carros das carreiras ordinárias,
alugava carruagens, pois, no Porto, em 1860, não faltavam alquilarias e
alugadores de trens. Bem conhecidas ficaram as seguintes:
- Barros & Amorim,
na Praça da Batalha;
- Carneiro &
Marinhas, na Rua do Bonjardim (Pátio do Paraíso);
- Joaquim Gomes
Rodrigues, no Largo do Carmo;
- Raimundo dos Santos
Natividade, na Rua Formosa;
- Viúva de Miguel Sá
Pacheco, no Laranjal;
- José Galiza, na
Rua do Laranjal;
- Albano, na Rua
D. Pedro;
- Companhia de Viação
Portuense, na Rua de S. Lázaro.
A Companhia de Viação Portuense ocupou na Rua de S. Lázaro,
as instalações, à direita. Em 1905, ainda ostentava na fachada, a informação do
aluguer de carruagens e era a garagem “Albino Moura” – Ed. Aurélio Paz dos Reis
Alquilaria do José Galiza, na Rua do Laranjal
Por outro lado, era
norma, os hotéis providenciarem aos seus clientes, um serviço de ligação entre
as suas instalações e as estações de caminho-de-ferro.
Em 1880, era esse o
caso do Hotel Paris, situado na Rua da Fábrica, que o levava à prática, através
de um “soberbo omnibus”.
Para além dos meios
de transporte, já referidos, existiam ainda os Trens de Praça, que poderiam ser considerados os táxis da época, já
que, se fixavam nos principais pontos da cidade, para aí tomarem os seus
clientes e as suas bagagens.
Trens de Praça na
Rua do Infante D. Henrique – Fonte: AHMP
Pormenor da foto
anterior – Ed. Nuno Cruz (administrador de “aportanobre.blogs.sapo.pt”)
Trens de Praça
estacionados na Praça da Batalha
O Hotel Universal (à direita na foto anterior), situado
na Praça da Batalha, disponibilizava aos seus clientes, trens para ligação, em
exclusivo, com a "estação central" (S. Bento) dos caminhos-de-ferro.
Trens de Praça
estacionados na Praça dos Voluntários da Rainha (Praça dos Leões)
Trens de Praça
estacionados (à direita) na Praça Carlos Alberto
Trens de Praça
estacionados na Praça D. Pedro
(Continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário