terça-feira, 6 de novembro de 2018

25.20 António da Silva Leite. Oficinas de construção de violas e comercialização de instrumentos musicais de cordas - (actualização em 14/01/2021)

António da Silva Leite
 
“Até à Revolução Francesa, qualquer acontecimento relevante na monarquia portuguesa, o nascimento ou o batizado de um príncipe, por exemplo, era motivo para toda a nação celebrar. Em 1785 o duplo casamento de dois dos filhos de D. Maria I, infante D. João e infanta D. Mariana, levou todo o Reino à celebração por vários dias. No Porto houve três noites de comédias públicas, três tardes de corridas de touros e um “Te Deum” de David Perez com os melhores músicos da cidade, por exemplo. (Conde & Lessa, 2015)”
Cortesia de Magna Ferreira (Instituto Politécnico do Porto, 2015) - “VOTA MEA DOMINO REDDAM” de António da Silva Leite (1759 – 1833): um testemunho
 
 
 
É numa época em que a música, de um modo geral, durante a celebração de cerimónias religiosas e que, o teatro, tinham importância e relevo no quotidiano das pessoas, que nasceu em 23 de Maio de 1759, na freguesia de S. Nicolau, mais propriamente, na Rua da Fonte Taurina, no seio de uma família católica e burguesa, aquele que terá sido o primeiro e grande divulgador da viola e do ensino prático da execução deste instrumento musical tendo, para o efeito, escrito o primeiro compêndio sobre o tema publicado em Portugal - o portuense António da Silva Leite.
Tendo começado por seguir a carreira eclesiástica e chegado a receber as Ordens Menores, acabaria por renunciar, dedicando-se, então, à carreira de músico.

 
 
"Estudo de Guitarra" – António da Silva Leite (1796)
 
 
Na capa da obra publicada e acima representada, pode ler-se que a mesma era uma oferta a Antónia Madalena de Quadros Sousa e Sá, 12ª Senhora de Tavarede, senhora das Lezírias de Buarcos.
Parecendo que a sua principal educação tenha ocorrido na Escola de Música e Canto da Sé do Porto, António da Silva Leite escreveu muitas e variadas peças de música religiosa, empregada durante longos anos nas cerimónias da igreja, em quase todo o País, produzindo inumeráveis obras de música profana, de várias modalidades e dirigindo vários agrupamentos músico-litúrgicos que, no seu tempo, floresciam na cidade, tendo sido, ainda, director artístico do Real Teatro S. João e, já na década de 1810, mestre de capela na sé catedral do Porto.
António da Silva Leite era, assim, frequentemente solicitado para proceder à composição de obras que eram executadas nos conventos femininos, para os quais a música, associada às cerimónias religiosas, tinha uma grande importância.
Para se entender, tal facto, diga-se que as noviças tendo que se apresentar, à entrada na instituição, acompanhada de um dote, aquelas que possuíssem qualidades vocais importantes seriam dispensadas de o fazer, especialmente, nas de orientação beneditina.
Entretanto, os conventos e mosteiros batiam-se para obter o serviço das noviças com qualidades para o canto.
A religiosa do Mosteiro de S. Bento da Avé-Maria, Florinda Roza do Sacramento, posteriormente, Maria Amália e Mestra da Capela do Real Convento de S. Bento de Ave Maria, chegou a ser comparada às famosas cantoras de ópera da época.

 
 
Caricatura de António da Silva Leite publicada na revista “O Tripeiro”, IVª série, nº 12, Outubro de 1931
 
 
“Este estudo pretende evidenciar a vida e obra de António da Silva Leite, compositor nascido no Porto em 1759 de uma família católica da média burguesia. Seguiu a carreira eclesiástica que veio a interromper quando era clérigo menor – in minoribus – e seguiu a carreira musical. Músico revelador de personalidade bem vincada, não hesitou em recorrer ao Tribunal Régio a pedir a nulidade de uma Ordem do Provisor do bispado, que afectava a vida profissional dos músicos, não obstante a sua formação ligada à Sé do Porto. Foi professor de muitos alunos para quem escreveu Estudo de Guitarra, obra importante na prática musical portuguesa. Compôs obras sacras e profanas, literárias e didáctico-pedagógicas, modinhas e hinos patrióticos. A confiança que mereceu das instituições que o convidaram para músico, “mestre de capela” e cerimónias, a contratação para maestro, compositor e director artístico do Teatro de S. João e a nomeação para Mestre de Capela da Catedral, revelam-no um homem competente, de grande saber e reconhecido pelos seus contemporâneos. A presente dissertação dará particular destaque à Missa Moisés, paródia da Ópera Mosè in Egitto de Gioacchino Rossini, que escreveu em idade avançada sendo o ponto alto da sua obra religiosa, revelando-se um compositor actual e actualizado, com uma linguagem criativa e perfeitamente enquadrada na “moda” do tempo”.
Cortesia de Rui Manuel Pereira da Silva Bessa – Tese de doutoramento em Ciências Musicais (Ciências Musicais Históricas) apresentada à Fac. Letras da Univ. Coimbra
 
 
Com setenta anos morre António da Silva Leite, sendo as cerimónias fúnebres estado a cargo de sue irmão, Bento da Silva Leite, conforme notícia do jornal “O Leal Portuguez”:
 
 
“António da Silva Leite morador na rua de Sao Francisco desta cidade faleceo desta vida presente aos dez de Janeiro de mil oito centos e trinta e tres asestido e dados os Sacramentos fez testamento, e era maior de setenta annos e foi sepultado na igreja aos onze do dito de que foi este asento era como asima.
O Cura Bento da Silva Leite”
 
 
 
Guitarra Portuguesa


A Guitarra Portuguesa tem uma extensa história no nosso País, na qual surgem, com grande realce, os nomes dos artesãos que, de geração em geração, ao longo de séculos, a têm fabricado. É o caso daqueles que as produziram em oficinas na cidade do Porto, com enorme sucesso.

“O instrumento a que damos hoje o nome, de Guitarra Portuguesa, foi conhecido até ao século XIX em toda a Europa sob os nomes de Cítara (Portugal e Espanha), Cetra e Cetera (Itália e Córsega), Cistre (França), Cittern (Ilhas Britânicas), Zither e Cithren (Alemanha e Países Baixos)”.
Fonte: Pedro Caldeira Cabral, 09/06/2007, Construtores da Guitarra Portuguesa


 “No século XIX já existiam em Portugal muitos mais construtores, instalados um pouco por todo o País e, em particular, na cidade do Porto, onde trabalhavam vários (os mais importantes eram a família Sanhudo) construindo instrumentos com características relativamente aproximadas, naquilo que poderia ser uma espécie de ‘escola’ local. Nesse período também houve estrangeiros na lutherie (construção de violas) nacional, como é o exemplo do francês Pierre Blaisot que aportuguesou o nome para Pedro Blaison e que tinha oficina em Lisboa. Ainda no final do século XIX, as Casas Duarte e Guimarães, duas lojas no Porto, vendem instrumentos feitos por construtores portugueses, mas utilizando etiquetas das próprias empresas, algumas vezes coladas por cima da marca dos verdadeiros autores”.
Fonte: “matriznet.dgpc.pt”


António Duarte foi o mais importante fabricante de guitarras do seu tempo, na cidade do Porto, tendo fundado em 1870 uma oficina na Rua da Bainharia.
Mudou-se depois para a Rua Mouzinho da Silveira, onde abriu uma loja de grande dimensão (do nº 159 ao nº167) e, paralelamente, uma oficina na Rua da Ponte Nova, na qual chegaram a trabalhar 40 homens.
Especialista em escalas, António Duarte construía guitarras (tendo criado o modelo da guitarra portuense), violas, violas braguesas, violões e bandolins. Esteve activo até cerca de 1919. O filho, António Carvalho Duarte, construía também rabecas chuleiras e violinos.
A Casa António Duarte, Sucessores teve o seu tempo áureo nas primeiras décadas do século XX, exportando inclusive para o Brasil.
Posteriormente, verificou-se um decréscimo progressivo nas encomendas. A oficina da Rua da Ponte Nova foi encerrada no final dos anos cinquenta e substituída por uma outra em frente à loja da Rua Mouzinho da Silveira. Em 1965 a loja sofreu uma redução de área, mantendo-se apenas nos números 165 e 167.
Esta grande casa comercial resistiu até final dos anos 90, altura em que foi vendida pelos herdeiros à Casa Castanheira.
O estabelecimento que foi de António Duarte, na Rua de Mouzinho da Silveira, nº 165, já não existe.


No prédio à esquerda, a cerca de uma dezena de metros da Rua da Ponte Nova, ficava o António Duarte, construtor de instrumentos musicais de corda



De entre dos construtores do Porto do início do século XX, salientam-se, José do Nascimento Lopes e António Pereira Cattão, “fabricantes de guitarras de boa qualidade, esmerado acabamento de verniz e decoração cuidada”.
Porém, já no século XIX outros artesãos se tinham evidenciado no fabrico de instrumentos de corda.
Assim:

No século XIX, no Porto

António Teixeira (Activo entre 1817-1820, R. Nova do Almada, guitarras);
Irmãos Antunes (Activos em 1850);
Custódio Cardoso Pereira & Cia (Activo desde 1861);
António J. da Cruz Moura (Activo em 1867, guitarras)
António Duarte (Activo desde 1870/1919, guitarras, violas, rabecas, etc.)
Joaquim da Cunha Mello (Activo de 1870 a 1895)
Júlio Thomaz da Silva (Activo entre 1890-1910, guitarras, violas, etc.)
A. Rodrigues do Amaral (Activo em 1890, guitarras, etc.)
Manuel da Silva Espírito Santo (Activo desde 1895)

Primeira metade do século XX, no Porto:

José do Nascimento Lopes (Entre 1890-1905, guitarras, violas, etc)
Júlio Teixeira (Rua Alexandre Herculano, 198, activo em 1920, guitarras, etc.)
José António Miranda (Viela do Anjo, nº 1, activo em 1955, guitarras)
Domingos Cerqueira da Silva (Rua Costa Cabral, 388, com actividade entre 1901-1980, guitarras, violas, etc.)
Júlio Thomaz da Silva (Activo entre 1890-1910, guitarras, violas, etc.)
A. Rodrigues do Amaral (Activo desde 1890, Porto, guitarras, etc.)
Luís da Cunha Mello (Activo de 1895 até 1912)
Manuel da Silva Espírito Santo (Activo desde 1895)



“António Duarte teve a primeira oficina na Rua da Bainharia, fundada em 1870 e mais tarde mudou-se para a Rua Mouzinho da Silveira nº 165/167 (cuja oficina ainda existe, actualmente gerida por António Couto).
Construia 3 modelos com comprimentos de corda vibrante de 470 mm, 440 mm e 420 mm e utilizava também medidas diferentes para os corpos (35 cm a 27 cm ) e ilhargas que podiam variar entre os 8,5 cm e os 7 cm (máximo) e os 5,5 cm e 4 cm (mínimo).
António Duarte é também conhecido como bom construtor de violinos, rabecas “chuleiras”, violas “braguesas” e bandolins, sendo justamente considerado o criador do “modelo” de Guitarra do Porto, o qual se distinguia do de Lisboa pela sua forma mais arcaica (próxima do perfil das cítaras italianas) e pela cabeça geralmente ornamentada com motivos fitomorficos.
Construiu entre muitas outras, a guitarra da célebre cantora e actriz Adelina Fernandes, onde se pode notar o esmerado fabrico em pau-santo, cercadura da boca com embutidos de madre-pérola e cravelhal em chapa de leque, encimado por escultura representando uma cabeça de bacante, com o cabelo envolto em cachos de uva.
Joaquim da Cunha Mello, também do Porto, foi contemporâneo do anterior, tendo sido sobretudo fornecedor dos estudantes de Coimbra, para os quais realizava guitarras em materiais baratos, fabricando segundo os modelos e medidas de António Duarte.
Criou uma firma, cuja gerência passou a seu filho Luis da Cunha Mello tendo este abandonado a actividade em 1910.
Ainda inserido na chamada “escola do Porto” encontramos Manuel Pereira dos Santos, com oficina em Alfena e mais tarde em Matosinhos, o qual foi premiado com medalha de prata na Expo Universal de Paris em 1889”.
Fonte: Pedro Caldeira Cabral, 09/06/2007, Construtores da Guitarra Portuguesa


O que distingue os três tipos de guitarras existentes em Portugal, ou seja, de Coimbra, de Lisboa e do Porto, reside principalmente, no acabamento da cabeça da mesma.
A de Coimbra possui uma lágrima incrustada, enquanto a de Lisboa, apresenta um caracol.
A do Porto goza de maior liberdade, podendo ter  um dragão esculpido ou uma flor.
Os três estilos têm em comum as seis ordens duplas de cordas metálicas.


Guitarra do Porto com acabamento do braço em flor – Ed. “casadaguitarra.pt/”



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