segunda-feira, 12 de novembro de 2018

25.21 Companhia Geral de Agricultura das Vinhas do Alto Douro ou Companhia Velha – Importância Económica


A Companhia Geral das Vinhas do Alto Douro surgiu de uma determinação régia de D. José I e de um sonho de três portuenses.
São eles: Dr. Luís Beleza de Andrade, D. Bartolomeu Pancorbo de Ayala e o dominicano padre mestre Dr. frei João de Mansilha.
Luís Beleza de Andrade convenceu o governador da cidade, ao tempo, António Bernardo Alves de Brito, a informar o ministro de D. José I, da enorme pobreza que grassava nas terras do Alto Douro, onde o pai possuía algumas propriedades e das inúmeras adulterações que o vinho sofria na sua qualidade.
Tendo levado a cabo reuniões com outros produtores daquela região vinhateira, na qual esteve presente o tal Mansilha, decidiram da necessidade de fazer a demarcação das terras onde o vinho era produzido.
Pancorbo seria escolhido para apresentar o projecto em Lisboa, o que foi feito, mas, aquele acabou por sugerir ao Dr. Beleza de Andrade que, dali por diante, fosse ele a dar, pessoalmente, seguimento ao caso.
Beleza de Andrade acabaria por incumbir frei João de Mansilha de proceder a diligências na capital para o que se comprometeu a custear-lhe as despesas que fizesse nesse sentido.
As diligências foram coroadas de êxito no dia 1 de Junho de 1756, chegava ao Porto a notícia da formação da Companhia de que veio a ser primeiro provedor o Dr. Luís Beleza de Andrade.
Eram privilégios da Companhia:





“A Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro recebeu a sua personalidade jurídica pelo Alvará de 10 de Setembro de 1756, formada com o capital de um milhão e duzentos mil cruzados repartido em acções de quatrocentos mil reis cada uma, e propunha-se restituir o bom nome ao vinho do Douro, garantindo a genuidade, elevar o nível de vida da região e sustentar o comércio de exportação do vinho que era um dos mais importantes do Reino.
As vantagens que da sua criação resultaram foram indiscutíveis, introduzindo o regime de demarcação que os franceses também adoptaram quase um século depois (§ XXIX dos Estatutos)”.
Com o devido crédito a “ruisaeguerra.blogspot.com”




A Companhia Geral de Agricultura das Vinhas do Alto Douro começou por ter o seu escritório ou casa do despacho, como era uso dizer-se, na Rua Nova (hoje, do Infante D. Henrique).
Entretanto, em 1761, acabaria por arrendar na Rua das Flores uma casa a
Manuel Pamplona Carneiro Rangel Veloso Barreto Miranda de Figueiroa, herdeiro de seu padrinho, sem descendentes, Manuel Figueiroa Pinto (1721 – 1775).
Aquele Manuel Pamplona venderia por 23 contos de réis, em 1 de Dezembro de 1809, o prédio à Companhia Velha.
 
 
 
 

Casa da Companhia, c. 1900 – Ed. Foto Guedes; CMP, Arquivo Histórico Municipal
 
 
 
A Companhia da Agricultura das Vinhas do Alto Douro foi fundada, como é sabido, pelo nosso rei D. José I ou,  melhor dizendo, pelo seu  primeiro-ministro, Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, no ano de 1756.
Nos seus três primeiros anos de existência foi administrada por uma junta composta por, um Provedor e 12 deputados que eram coadjuvados por seis conselheiros.
No Porto,  a Companhia instalou a sua primeira Administração ou Sala de 
Despacho, como então se dizia, numas casas da Rua Chã, pertencentes a  Manuel de Figueirôa Pinto.
Foi a estas casas que se dirigiram os revoltosos que,  na manhã do dia 4 de  Fevereiro de 1757,  percorreram as ruas do Porto  protestando  contra uma das medidas que haviam sido tomadas pela recém-criada Companhia e que tirava aos taberneiros da cidade e arredores o direito da  venda do vinho a retalho. Por essa razão o motim passou à história como a Revolta dos Taberneiros. Da Rua Chã a sede da Companhia transferiu-se, pouco tempo depois,  para a Rua das Flores, para um edifício que também pertencia a Manuel Figueirôa Pinto.
Luís Beleza de Andrade foi o primeiro Provedor da Companhia.
Natural do Porto, vereador da Câmara no ano em que se fundou a Companhia, Beleza de Andrade era também um grande produtor de vinho com boas e vastas propriedades em Valdigem, na região do Douro. Com o religioso dominicano, D. frei João de Mansilha, e com o negociante biscainho,  D. Bartolomeu Pancorbo, que vivia na Rua Nova, hoje Rua do Infante D. Henrique, Luís Beleza de Andrade foi um dos três impulsionadores da ideia para a criação da Companhia.
Diz-se que tendo ido a Valdigem para as vindimas de 1756 sentiu de tal modo "a desgraça da terra do vinho" que imediatamente convocou os mais importantes viticultores durienses para  uma reunião da qual saiu o projecto da Companhia de que viria a ser o primeiro Provedor.
A família Beleza de Andrade viveu numa casa das Escadas do Monte dos Judeus, na esquina com a Viela da Ilha do Ferro, muito perto portanto dos armazéns da Companhia. A casa ainda lá está agora recuperada depois de ter estado muitos anos ao abandono. 
O brasão que figurava na fachada desapareceu corroído pela acção do tempo.


 

Casa de Beleza de Andrade na Escada do Monte dos Judeus

 
 
 
Armazéns de vinhos e Caves
 

É através da voz do povo e da gíria comercial, que a pombalina, Real Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro fundada em 1756, começa a ser conhecida por Real Companhia Velha, e a utilizar essa designação como marca comercial a partir dos finais do Século XIX, sendo a sua designação comercial de Real Companhia dos Vinhos do Porto.
No que diz respeito à armazenagem dos vinhos, aquando da fundação da Real Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, a norma que vigorava há séculos, era que eles fossem armazenados na margem esquerda do rio Douro, em V. N. de Gaia, na sequência de importantes questões quanto ao pagamento de impostos.
Após a fundação do reino de Portugal, as duas povoações de Gaia e de Vila Nova mantiveram-se autónomas. Gaia recebeu Carta de Foral passada pelo rei D. Afonso III, em 1255, seguindo-se Vila Nova, por D. Dinis, em 1288.
Em 1383, no entanto, ambas foram integradas no julgado do Porto, perdendo a sua autonomia.
No final das guerras liberais, Gaia e Vila Nova foram, finalmente, agraciadas com autonomia política e, ao fundirem-se, nasceu o actual concelho de Vila Nova de Gaia com o Decreto n.º 23, de 16 de Maio de 1832.
Assim, até à atribuição do foral a Gaia, em 1255, pelo rei D. Afonso III, todos os direitos relativos ao comércio que era feito pela barra do rio Douro aproveitava, apenas, ao Bispo e ao Cabido.
Este senhorio da cidade do Porto nascera da doação, ao Bispo do Porto D. Hugo, e a seus sucessores, feita por D. Teresa, em 1120 (era 1158) e confirmada, mais tarde, por D. Afonso Henriques em 1138.
Na sequência da primeira doação e dos direitos que ela lhe conferia, promulgou D. Hugo, em 1123, o Foral da cidade do Porto, que ordenava a cobrança de vários impostos, entre os quais a “Portagem da Terra”, somente extintos por D. João VI, em 11 de Junho de 1822, sendo que, contra eles, haviam reclamado os comerciantes da cidade, nas Cortes Constituintes de 28 de Agosto de 1821.
O pagamento de impostos sobre o vinho foi, assim, o primeiro motivo para a instalação dos armazéns e caves em Gaia e Vila Nova.
Os vinhos de exportação que da região Duriense vinham nos típicos barcos rabelos, sempre se armazenaram, por isso, em V. N. de Gaia.



Rua da Praia, na marginal e entrada da Rua Direita, em V. N. de Gaia, no século XVIII




Largo D. Luís I, em V. N. de Gaia, em perspectiva idêntica à da gravura anterior



Anteriormente ao século XVII, o nosso comércio de exportação de vinhos fazia-se pelos portos do Norte, principalmente pelo de Viana, para os vinhos com proveniência no Minho, com uma participação principalmente dos comerciantes ingleses e, ainda, pela barra do rio Douro.
Só em 1678, se regista o primeiro embarque, no montante de 408 pipas, feito pelos ingleses.
Fundada a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, em 1756, a descarga dos vinhos do Douro fazem-se nos cais da cidade do Porto.
Em 1777, primeiro ano do reinado de D. Maria I, um litígio judicial promovido pela igreja representada pelo bispo do Porto, bispo de Penafiel, bispo de Bragança-Miranda e o Cardeal Patriarca de Lisboa contra aquela companhia, reclamava dela o pagamento em atraso (quase 20 anos) dos direitos devidos ao bispo do Porto, sobre as descargas efectuadas nos cais da Ribeira do Porto e respectiva comercialização do vinho.
A razão seria dada aos reclamantes, pelo que o pagamento passou a ser feito em terras do bispo do Porto até 1821 e foram, entretanto, liquidadas as dívidas em atraso.
Porém, os restantes negociantes de vinho do Porto, procurando fugir à jurisprudência que aquele caso poderia despoletar, com consequências nefastas para as suas bolsas, trataram de transferir os seus armazéns e cais de descarga para a margem esquerda do rio Douro, pois, aí, em Gaia, funcionava o foral de D. Afonso III e o território estava fora do alcance dos bispos e do foral de D. Teresa que cobria a margem direita daquele rio.
É, nestes tempos, que se irá assistir a uma procura de terrenos para instalação de armazéns de vinhos, na margem esquerda do Douro, sobretudo na encosta que ia desde do lugar das Devezas até ao rio, todo ele pertencente à imensa Quinta das Devezas que, no século XVI, também era conhecida pela Quinta do Estado e, depois, ficou conhecida pela Quinta do Conde das Devezas.
A partir daqui, os armazéns que iam surgindo para escoar pela barra do rio Douro a produção dos vinhos finos, que se juntava à dos vinhos tradicionais, acabaram por se localizar na margem esquerda do rio Douro.
Os britânicos que tinham a sua feitoria no Porto passaram, também, a guardar os seus vinhos em V. N. de Gaia e muitas das famílias britânicas escolheriam o Candal para viverem ou, por aí, instalarem as suas quintas de férias.
Para além da localização dos armazéns de vinhos na margem esquerda do Douro, decorrente do alívio no pagamento de impostos, juntava-se, também, uma justificação tecnológica.
Aqueles terrenos estando voltados a norte, eram abrigados dos ventos fortes da barra, disfrutavam de um clima ameno e fresco, um pouco húmido e dotados de imensas minas de água.




Cais de V. N. de Gaia por onde foram surgindo os armazéns de vinho do Porto – Cortesia de “Gaia à la carte”



A própria Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, por aí, haveria de ter, então, os seus armazéns, no entanto, haveria de decidir montar, também, armazéns na margem direita, em Miragaia.

 
 
 
 

Armazéns da Companhia Velha em Miragaia
 
 
 
Com efeito, no ano de 1807, depois de já ter construído armazéns na Régua, junto á margem do rio Douro, em Vila Real de Santo António, no Algarve,  no Pinhão e junto ao Tua, e no Vimieiro, na margem esquerda do Douro, a Companhia comprou uma série de casas térreas e vários barracões que havia no areal da praia de Miragaia que mandou demolir para, em seu lugar, construir os seus armazéns.
O edifício, ainda existente,  na actual Rua de Miragaia, era enorme. 
Inicialmente tinha capacidade para guardar mais de 4.000 pipas de vinho. 
Posteriormente, porém,  essa capacidade viria a ser aumentada para poder acolher cinco e seis mil pipas.
Os armazéns de Miragaia para além das amplas e arejadas dependências que possuía para arrecadação dos vinhos provenientes do Alto Douro e dos escritórios, dispunha de grandes oficinas de tanoaria; dependências onde se procedia á destilação da aguardente; e um terceiro mas não menos  importante sector para a fabricação de vinagre.
Aos armazéns de Miragaia e aos de V. N. de Gaia, chegavam os vinhos transportados desde o Alto Douro nos barcos rabelos, barcos próprios de rio de montanha. O rabelo, por essa razão, não tem quilha e é de fundo chato. Com uma vela quadrada, era manejado por seis ou sete homens. Para manobrar, utiliza um remo longo à popa - a espadela.

 
 
“A Real Companhia Velha conta com mais de 250 anos de história, um marco ímpar para empresas do ramo. Para trás, fica o registo de uma história fabulosa e de um passado glorioso. Para o futuro, existe a vontade de manter a elevada qualidade dos produtos e a confiança numa Companhia onde o rigor e a vontade de continuar a escrever a história do Vinho do Porto são uma preocupação constante.
Os ingleses, radicados na cidade do Porto, realizaram várias experiências ao adicionarem aguardente aos vinhos Durienses, com o intuito de os preservar nas longas travessias marítimas.
Para sua surpresa e graças a uma série de circunstâncias felizes, dá-se a descoberta do Vinho do Porto.
Em 1749 a exportação de Vinho do Porto atinge o expressivo número de 19.000 pipas.
Em 1756 a 10 de Setembro de 1756, por Alvará Régio de El-Rei D. José I, sob os auspícios do seu Primeiro-Ministro, Sebastião José de Carvalho e Mello, Conde de Oeiras e Marquês de Pombal, foi instituída a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto-Douro, também denominada, Real Companhia Velha.
Formada pelos "principais lavradores do Alto Douro e Homens Bons da Cidade do Porto, à Companhia foi confiada a missão de sustentar a cultura das vinhas, conservar a produção delas na sua pureza natural, em benefício da Lavoura, do Comércio e da Saúde Pública".  
De entre os inúmeros serviços prestados pela Companhia à causa pública, destaca-se como o mais notável a chamada "Demarcação Pombalina da Região do Douro", levada a efeitos entre 1758 e 1761 pelos deputados da Junta da Administração da Real Companhia Velha. 
Mercê desta medida de grande alcance económico, foi delimitada a Região dos Vinhos de Feitoria do Douro, que é a mais antiga Região Demarcada do mundo. 
A importância do Vinho do Porto para a economia portuguesa é tal que, em 1799, o Vinho do Porto representa mais de 50% das exportações portuguesas.
A Companhia passa a operar em mercado livre quando, a 7 de dezembro de 1865, por Alvará Régio do Regente D. Fernando, é declarada livre a exportação através da barra do Porto de todos os vinhos produzidos em Portugal.
Em 1960, Manuel da Silva Reis adquire, com o apoio do banqueiro Pinto de Magalhães, a maioria do capital - assumindo assim a direção da Real Companhia Velha.
Entre 1961 – 1974, a Real Companhia Velha conhece um dos seus períodos de maior expansão, o qual se traduziu por profundas transformações: mudança das instalações da sede; aumento do capital; renovação de equipamentos e modernização tecnológica da vinificação; preparação, tratamento e conservação dos vinhos; e alargamento dos seus negócios.
Em 1979 após períodos conturbados, a Companhia efetuou uma operação comercial envolvendo vinho generoso de várias colheitas, no valor total de 1 000 000 de contos - o que constitui a maior operação financeira jamais realizada na região do Douro. A Empresa volta, assim, a ocupar um lugar de relevo entre os exportadores do Vinho do Porto”. 
Fonte: “realcompanhiavelha.pt”



 Em 19 Maio 1872, p. 2, o “Jornal do Porto” noticiava:
 
 
“A Rampa de Miragaia: concluiu-se ontem a rampa mandada construir em Miragaia para estabelecer comunicação entre a rua de Miragaia e a Nova Alfândega”.
 
 
 
Em 14 de Junho de 1872, o “Jornal do Porto” informava os seus leitores de que, construída a rampa de acesso dos armazéns da Companhia à Nova Alfândega, a Junta d’Obras tinha aprovado que a contribuição da Companhia dos Vinhos deveria ser 200$000 reis.

 
 
 



 

Rampa de acesso do Bairro de Miragaia à Rua Nova da Alfândega, em 1975


 
Uma outra rampa, mais a poente, seria também construída. 




Acesso ao bairro de Miragaia, junto a Monchique, c. 1907, em foto estereoscópica - Ed. H. C. White Co.



Em 1888, instituiu-se a “Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal”, sedeada no Porto, com funções de agente intermediário entre a produção e o comércio e de comerciante por conta própria, e que será integrada na Real Companhia Velha, em 1963.
O povo começa a identificar duas Companhias Reais, como a Nova e a Velha.
 
 
 
 

Capa de livro ” A Questão do Douro” da autoria da Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal

 
 
A “Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal” vai ter os seus armazéns em V. N. de Gaia.

 
 

Localização dos armazéns da Real Companhia Vinícola do Norte de Portugal, actuais instalações da Real Companhia Velha, na Rua Azevedo Magalhães


 
Após a associação, em 1963, da Real Companhia Velha e da Real Vinícola do Norte de Portugal, as caves e instalações da Real Companhia Velha acabaram por ser sedeadas, na Rua Azevedo Magalhães, nº 314, que tinham pertencido à sua associada.
Actualmente, estão sobre a alçada da Real Companhia Velha as quintas das Carvalhas, Acipestres, Cidrô, Casal da Granja e Síbio.
 
 
 
 

Em 1976, as instalações que já foram da Real Companhia Velha e da Real Companhia Vinícola do Norte, no Cais de V. N. de Gaia, na Avenida Ramos Pinto, passaram a museu da Companhia

 
 

Instalações actuais da Real Companhia Velha, em V. N. de Gaia, na Rua Azevedo Magalhães


(Continua)

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