CLEMENTE MENERES
O patriarca da família Meneres, Clemente da Fonseca
Guimarães, natural da Vila da Feira, do lugar da Cruz, descendia de pais
agricultores que, além de cultivarem os terrenos agrícolas de que eram
proprietários, possuíam uma serralharia que ocupava na ocasião, cerca de 40
operários.
Clemente Guimarães iniciou na oficina a sua aprendizagem
após ter terminado a instrução primária: a oficina dos pais era especializada
em fechaduras e vendia para a cidade do Porto a maioria da sua produção, mas
uma outra parte seguia depois o caminho da exportação, para o Brasil.
Clemente Guimarães à revelia dos seus pais, haveria aos 15
anos, de embarcar para o Brasil para se juntar a um tio.
Quando chegou ao Brasil, acabaria por encontrar o tio, na
altura em que ele tinha acabado de liquidar um estabelecimento que possuía.
Retirado para a chácara, no Catumbi, propriedade do tio,
acaba por casar, por influência deste, em 18/08/1860, no Rio de Janeiro com a
sua filha Maria da Glória Guimarães da Cruz.
Passados 4 anos regressa por influência do tio a Portugal,
passando a viver na Rua da Torrinha.
Entretanto, em 1867,
afasta-se do tio/sogro por desavenças relacionadas com dinheiros e, por acção
do pai, depois de ter alcançado um emprego como caixeiro, ele arranja-lhe um
sócio capitalista, João Joaquim Paes, e os 3 contos de reis que o sogro lhe
negara, para montar um negócio.
É nesta altura que passa a intitular-se, com o intuito de se
afastar do apelido Guimarães que o ligava ao sogro, por Clemente Meneres.
Surge a 'Paes & Meneres' e a fábrica de
rolhas de cortiça em Monchique, em 1872, que depois de diversas vicissitudes
haveria em 1908 de reanimar a sua actividade.
“ (…) da época, surgiu
então a 'Paes & Meneres' como
fabricantes e negociantes de rolhas com depósitos de cortiça para exportação e
ainda como comerciantes de drogas (enxofre, 'cimento romano', petróleo,
aguardente, genebra, sumagre, baga de sabugueiro, pês louro e soda) com porta
aberta na Rua da Ferraria; vendendo
para a cidade do Porto e para província, a empresa estendeu os seus negócios ao
Brasil e a alguns países europeus, para onde enviava produtos tradicionais
(sobretudo vinho, rolhas, palitos e ferragens para o Império do Brasil, e
frutas para Alemanha, França e Inglaterra)”.
Em 10 de Abril de 1874, fez-se escritura de
cessão da 'Paes & Meneres' e escritura de trespasse da quota de João
Joaquim de Paes a Clemente Meneres (avaliado em 28 contos de reis pagos através
da apresentação de 8 letras de 3500$000 reis que seriam sacadas uma a uma de 6
em 6 meses a partir de 02/10/1874 e até 02/01/1878), este já na qualidade de
sócio e único gerente da nova sociedade então criada por ele com a firma 'C. Meneres & Cª' e para a qual
entraram como sócios Joaquim Silvano Filho (em 1897, tendo uma Fábrica de
sabão, requereu a construção de uma casa destinada a escritório e armazém na R.
de Carvalho Barbosa) e Alvaro Carneiro Geraldes (filho duma tradicional família
de comerciantes do Porto com grande ligação ao Brasil, deslocou-se de imediato
para o Brasil como representante da empresa no Rio de Janeiro), para continuar
os negócios da 'Paes & Meneres' que só foi dissolvida por causa da retirada
natural, por idade avançada, do sócio mais velho e capitalista, João Joaquim de
Paes; a 'C. Meneres & Cª' surgiu durante vários anos nos almanaques como
'fábrica de rolhas para exportação, trabalho braçal e a vapor' no cais da Alfândega (na parte oriental do
edifício do extinto Convento de Monchique).
(…) em fins de abril de
1874, a 'C. Meneres & Cª' já estava organizada com Joaquim Silvano Filho a
assegurar o expediente na sede, Álvaro Carneiro Geraldes no Império do Brasil
para controlar e ampliar as exportações, e Clemente Meneres a procurar
potenciar os ganhos a montante assegurando o abastecimento de matéria-prima
(cortiça) a preços e quantidades mais convenientes (assim, e acompanhado de um
amigo conhecedor da cortiça, Clemente Meneres partiu a 14/05/1874 na diligência
da ex-mala posta do Porto para Bateiras, e daqui até Foz Côa, onde verificou
que os sobreiros locais eram consumidos como lenha pelos seus habitantes, tendo
então ambos atravessado o rio Douro para chegarem ao Quadraçal, pelo Vale de
Sinada, a 18/05/1874 e, ás 16:00 desse
dia, chegaram ao lugar do Romeu em Mirandela abancando no tasco da Maria Rita
onde, não havendo nada para comer, mandaram assar bacalhau acompanhado de pão
negro de centeio); a 'C. Meneres
& Cª', para além da sua fábrica de cortiça e da sua loja de comércio,
procurava instalar na R. da Restauração, em espaços alugados a João Joaquim de
Paes (o 1.º sócio de Clemente Meneres), uma fábrica de conservas que veio a ser
conhecida como a 'Companhia Luso-Brasileira - Fábrica de Conservas
Alimentícias'.
Fonte: Professor Jorge Fernandes Alves
Aquela Companhia Luso-Brasileira - Fábrica de Conservas
Alimentícias, com sede na Rua da Restauração, produzia conservas de peixes,
carnes, frutas, legumes e doces. A fábrica foi pioneira no Norte do país na
introdução do método Appert (método de enlatar alimentos), e trabalhava com
produtos oriundos de Trás-os-Montes.
Uma Resolução do Tribunal do Comércio do Porto acaba por
dissolver a 'C. Meneres & Cª' por causa da demanda que os 2 sócios de
Clemente Meneres tinham feito por terem divergências com ele, no âmbito da
gestão. Indemnizados os sócios no mesmo dia associa-se a 2 novos sócios numa
sociedade em comandita com a mesma firma da anterior 'C. Meneres & Cª' e para continuação dos negócios da anterior.
“A 9 de Março de 1876,
a firma C. Meneres reorganiza-se e vai associar-se a Rául Cirne e António Tomás
dos Santos, tendo a sociedade como objectivo a continuação da anterior, com o
património da Fábrica Luso Brasileira em Monchique, no Porto e o
comprometimento de Clemente Meneres de ceder à empresa as rolhas e cortiças lá
fabricadas por sua conta para revenda com uma comissão de 20%; os lucros seriam
distribuídos por metade para Clemente Meneres e por 1/4 a favor de cada um dos
outros 2 sócios; a fábrica de cortiça
passou rapidamente a depósito de cortiça quando Clemente Meneres instalou a
fábrica de cortiça em Mirandela (junto
da ribeira do Quadraçal e designada atualmente por 'fábrica velha') e
passou a enviar a sua produção para o Porto, mas ao mesmo tempo começou a
funcionar na R. da Restauração a 'Companhia
Luso-Brasileira - Fábrica de Conservas Alimentícias' como 2.ª unidade da 'C. Meneres & Cª'.
Era um óbice ao
escoamento dos produtos transmontanos, o custo e demora no escoamento, o que
impediam o desenvolvimento dos negócios. Clemente Menéres apercebeu-se da
necessidade de fazer ali chegar a rede ferroviária.
Em 1878, Fontes
Pereira de Melo, em visita a Mirandela, tinha já prometido uma linha até à
cidade ao longo do Rio Tua. Clemente adere ao fontismo e inicia uma campanha em
prol da construção da linha do Tua, contactando vários potenciais investidores
e fazendo pressão junto de deputados. (Em 1883, chegou a concorrer ao concurso
de construção e exploração do troço entre Mirandela e Bragança, que passava por
Romeu, mas a sua sociedade não foi a vencedora. Este troço, no entanto, só seria
inaugurado apenas em 2 de agosto de 1905, quando entre a foz do Tua e Mirandela
o tinha sido em 1887).
Entretanto a linha do
Douro em funcionamento em 1875 só seria concluída até Barca d’Alva em 1887.
Horário da linha do Douro em 1875 entre Porto e Caíde
A 1 de Fevereiro de
1879 entra como sócio na fábrica Constantino Joaquim Paes, filho de João Paes,
passando a firma a designar-se Santos,
Cirne & Cª - sucessores de Paes & Meneres.
A gerência era assumida
em pleno pelos 2 sócios António Tomaz dos Santos e Raul Cirne, embora sujeitos
a um conjunto de condições.
Em 1881 a empresa
tinha uma sucursal em Espinho para a preparação de sardinha em azeite e a
fábrica da R. da Restauração apresentava alguma debilidade por estar instalada
numa casa de habitação arrendada (inicialmente a João Joaquim de Paes e depois
a seu filho e sócio comanditário Constantino Joaquim Paes) onde funcionavam 2
cozinhas e havia 1 oficina de funilaria para construir e manipular as latas
ocupando 50 operários que subiam sazonalmente aos 120 por ocasião da colheita
da fruta.
No ano de 1881 a
fábrica de cortiça do extinto Convento de Monchique (também antigo armazém da
Alfândega do Porto) era a única existente no Porto e nela todo o trabalho era
manual.
Instalações do Convento de Monchique com a capela em ruínas
em 1º plano
Os negócios do Porto
estavam agora estatutariamente entregues aos 2 gerentes Antonio Tomaz dos
Santos e Raul Cirne, pois Clemente Meneres vivia na sua Quinta do Romeu onde
também tinha a sua empresa agrícola para produzir frutas, vinho e sobreiros e
também instalou uma fábrica de produção de cortiça que era exportada
principalmente para a Alemanha e para o Brasil recebendo deste último ainda importantes
encomendas de azeite em almotolias, para além dos vinhos tratados que enviava
para Gaia.
Em 9 de Julho de 1885,
os sócios comanditários Clemente Meneres e Constantino Joaquim Paes abdicaram
de 1/3 da sua quota a favor de um 5.º sócio, Porfirio de Macedo que passou a
integrar os corpos gerentes da sociedade.
Em 30 de Abril de 1887, A 'Santos, Cirne &
Cª - sucessores de Paes & Meneres' foi dissolvida por retirada amigável
de Clemente Meneres, que ali deu quitação geral, por já ter sido compensado da sua
participação; todo o ativo da extinta sociedade (então representado pela
'Companhia Luso-Brasileira - Fábrica de Conservas Alimentícias' e pela pequena
fábrica de salga e conservas de sardinha de Silvalde a sul de Espinho) passava
para a nova empresa de imediato constituída pelos 4 sócios e que passou a
designar-se de 'Santos, Cirne &
Macedo'.
Em 1887 Clemente
Meneres toma o comboio para o Porto transportando consigo a família, os
operários e as máquinas para montar de novo a fábrica de rolhas num dos armazéns
do extinto Convento de Monchique e parte de novo para o Brasil para arranjar
clientes.
De volta a Portugal
faz com os seus filhos homens (outros já tinham à data falecido), Alfredo da Fonseca Meneres e Agostinho da Fonseca Meneres, a firma 'Clemente Meneres & Filhos' integrando
nela todas as propriedades do Porto e de Trás-os-Montes.
O edifício do extinto
Convento de Monchique foi ampliado, de forma a incluir a residência e as
instalações para a sociedade comercial, arrendando ainda a terça parte que lhe
não pertencia (a parte oriental do ex-convento passou a albergar as 2
principais atividades, a fábrica de rolhas de cortiça e o armazém de vinhos e
doutras bebidas com uma grande variedade de marcas e géneros, desde vinho do
Porto, moscatel e malvasia e licores diversos, tanto de produção própria como
de produção alheia); anúncios em jornais e não só, de produção artística,
apresentavam a empresa 'Clemente Meneres & Filhos' como fornecedora da Casa
Real e costumavam apresentar referências relativas às distinções obtidas nas
exposições internacionais (Filadélfia em 1876, Paris em 1889 e Lisboa em 1884),
tanto mais que uma das marcas de vinho do Porto era a 'Dom Luiz' com
autorização expressa do rei D. Carlos I para o efeito.
Em Maio de 1893 falece
a sua mulher Maria da Glória da qual teve 10 filhos.
Em 1895 cria a 'Meneres & Cª' incluindo na sociedade existente a sua filha Leonor.
Esta casaria em
segundas núpcias com Joaquim da Silva Barbosa.
Em 1897, Clemente
Meneres separou-se do seu genro Joaquim da Silva Barbosa que ficou com a
fábrica de cortiça, mudando-a para a Alfândega Velha sob a firma 'Barbosa &
Cª, em comandita'.
Por sua vez a 'Meneres
& Cª' ergueu em 15 meses os novos armazéns e oficinas da empresa, de acordo
com o projeto do Eng.º António da Silva, no Prado de Matosinhos.
Texto com o devido crédito ao Professor Jorge Fernandes
Alves
(Continua)
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