Exposição Colonial do
Porto de 1934
“As exposições
coloniais eram realizadas mundialmente durante o século XIX e na primeira
metade do século XX nos países europeus. Destinavam-se a mostrar aos habitantes
da metrópole, as diferentes facetas das colónias. As exposições coloniais
resultavam das reconstruções espetaculares dos ambientes naturais e monumentos
de África, Ásia e Oceânia. A encenação dos habitantes das colónias, muitas
vezes deslocados à força do seu local de origem, deu-lhes posteriormente a
classificação de zoológicos humanos.”
Fonte: “pt.wikipedia.org”
Esta exposição seria inaugurada em sessão solene no Palácio da
Bolsa, a 15 de Junho de 1934, abrindo as suas portas no dia seguinte, nos
jardins do Palácio de Cristal e prolongou-se até 30 de Setembro, do mesmo ano, tendo durado, por
isso, 3 meses e meio e, para o efeito, sido erguidos cerca de
quatrocentos pavilhões, montados em cinco meses.
A que a antecedeu tinha-se realizado em 1931, em Paris.
Anos antes, também no Porto, tinha o Rei D. Carlos inaugurado, a 2 de
Março de 1894, uma “Exposição Insular e Colonial”, que tentou unir a nação,
após o Ultimato Inglês.
Agora, pretendia-se uni-la em torno de um regime político, que nos iria
governar por algumas décadas.
O presidente da Câmara do Porto era, na altura da exposição, o
portuense António Augusto Esteves Mendes Correia, principal fundador da
Sociedade de Antropologia e, também, o fundador do Museu da Universidade do
Porto.
Com o seu stand na Avenida da Índia (Avenida das Tílias), Domingos
Alvão fez as imagens diárias para o jornal privativo da Exposição. Além dessas,
realizou largas centenas de fotografias, que hoje se encontram no Centro
Português de Fotografia. Foi, ele, o único fotógrafo da exposição.
Mapa mostrando a extensão do Portugal colonial (Todas as salas
de aula, da escola primária, tinham um, nas suas paredes)
Cartaz publicitando a Exposição Colonial do Porto (1934)
“Em 1934 o Regime
já consolidado e inspirado pela Exposição Colonial de Paris de 1931, promove no
Porto a primeira das suas grandes exposições - a Exposição Colonial do Porto –
destinada a propagandear o Estado Novo como um regime moderno, activo num
Portugal Imperial. Para Comissário da Exposição, é escolhido o capitão Henrique
Galvão (1885-1970), então ainda um dos militares ligados ao Regime e um dos
homens mais conhecedores dos nossos territórios coloniais, já que tinha sido
Governador da província de Huíla em Angola (1929), participado na Exposição
Colonial de Paris em 1931 e organizado as feiras coloniais de Luanda e Lourenço
Marques (1932).
(…) Mas, se os
objectivos da Exposição são claros, mostrar interna e externamente a unidade e
a grandeza do Império Colonial Português, a ideia da sua realização no Porto,
deve-se provavelmente ao volume e importância da emigração e das importações de
mercadorias com o Brasil e as Colónias, que se efectua através do porto do
Douro.”
Ercílio de Azevedo,
“Porto 1934 - A Grande Exposição”. Fonte: Blogue “doportoenaoso”
Com um novo regime político instituído desde 1932, e com Salazar no seu
comando, não foi deixada de lado, a possibilidade de glorificar o Chefe do
Governo.
Apologia de Salazar durante a “Exposição Colonial do Porto” (1934)
Capa do catálogo da “Exposição Colonial do Porto” (1934)
Tenente Henrique Galvão – Director Técnico da Exposição Colonial do
Porto (1934)
Vista aérea da entrada do Palácio de Cristal, com o Pavilhão das
Colónias, à entrada, à direita – Ed. Foto Beleza (1934)
Palácio das Colónias e Monumento ao Esforço Colonizador Português
Monumento ao Esforço Colonizador Português – Ed. Alvão
O conjunto escultórico da foto acima é da autoria do Alferes Alberto
Ponce da Castro e de José Sousa Caldas. À volta do obelisco, estão as 6 figuras
simbólicas, com 3 metros de altura, a quem se deve o esforço colonizador: o
Missionário, o Soldado, a Mulher, o Médico, o Agricultor e o Comerciante. Na
base, uma inscrição:
“Em comemoração da Exposição Colonial Portuguesa no
Porto de 16 de Junho a 30 de Setembro de 1934”.
Este monumento encontra-se, actualmente, na Praça do Império, na Foz do
Douro.
“Os preparativos da Exposição foram
acompanhados pela própria cidade, que deveria estar preparada para dar resposta
ao elevado número de visitantes que se esperava aí acorrer. Nos periódicos o
número de anúncios aumentava de forma proporcional à aproximação da data de
inauguração, dando informações àcerca de hotéis, pensões e transportes, não só
na cidade como também nos seus arredores. Neste contexto, a imprensa tomaria um
importante papel, cobrindo os principais momentos do evento e dedicando muitas
das suas páginas à análise e discussão de assuntos coloniais.
O Comércio do Porto publicou entre Junho
de 1934 e Setembro do mesmo ano um total de cinquenta e nove números de um
periódico distribuído gratuitamente, “O Comércio do Porto — Colonial”, ao mesmo
tempo que Henrique Galvão dirigia a revista Ultramar: Órgão Oficial da I
Exposição Colonial , publicada entre Fevereiro e Outubro”.
Cortesia de Vera
Lúcia Penetra Gonçalves (Faculdade de Letras da Universidade do Porto) O Palácio de Cristal Portuense na Primeira
Exposição Colonial Portuguesa (1934)
Nave Central do
Palácio de Cristal durante a Exposição Colonial Portuguesa (1934)
Pavilhão da
Companhia União Fabril Portuense das Fábricas de Cerveja e Bebidas
Refrigerantes (CUFP), na Exposição Colonial Portuguesa (1934)
Capa d’ “O Comércio
do Porto – Colonial” de 22 de Junho de 1934
Comboio percorrendo
os jardins do Palácio de Cristal, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed.
Alvão
Teleférico construído para servir os visitantes, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão
“No jardim do Palácio de Cristal procurava-se
apresentar o Império Colonial com a floresta tropical, o deserto, uma picada
angolana, aldeias típicas de todas as colónias e muitas outras simulações que
tinham por intenção dar ao visitante, após o passeio, a sensação de ter viajado
por todo o Império Português. Cada Colónia enviou os seus nativos, que foram
alojados em aldeias ou habitações típicas, continuando na Exposição a sua vida,
usos e costumes coloniais.
(…) Na Avenida da Índia (Avenida das Tílias),
eixo estruturante dos jardins do Palácio, estavam, à entrada, o Arco dos Vice-
Reis da Índia, e ao fundo, uma réplica do Farol da Guia de Macau.”
Fonte: “portoarc.blogspot.com”
Arco dos Vice–Reis
da Índia na Exposição Colonial de 1934, que se erguia no topo Norte da Avenida das Tílias
Réplica do Farol da
Guia de Macau na Exposição Colonial de 1934
Pavilhão do Chá, de
Macau, na Exposição Colonial de 1934
Pavilhão de S. Tomé
e Príncipe na Exposição Colonial de 1934
Pavilhão de Timor na
Exposição Colonial de 1934
Aldeia de Moçambique
na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão
Feiticeiros de
Moçambique na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão
Aldeia Balanta da
Guiné, na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão
Lago e aldeia do
arquipélago dos “Bijagós” (Guiné- Bissau), na Exposição Colonial de 1934 – Ed.
Domingos Alvão
Aldeia de Angola na
Exposição Colonial de 1934
A Exposição Colonial
de 1934 propiciaria o encontro de realidades etnográficas diversas, como nos
narra o jornal “O Comércio do Porto” de 17 de Julho de 1934.
“(…) o famoso rancho típico dos Zés P’reiras
do Marco de Canavezes (…) visitou o pavilhão de O Comércio do Porto Colonial
oferecendo, por momentos, um espectáculo de cor e de ruído.
Um preto da aldeia lacustre da Guiné,
assistindo casualmente, ao espectáculo desta visita regional, improvisou um
bailado violento e agitado, entre o grupo dos Zés P’ reiras.
Estabeleceu-se por instantes uma
confraternização entre o Douro e a Guiné… o bailado estranho do negro que se
saracoteava e regougava modas bárbaras do seu sertão africano, no meio dos
trajes escarlates, verdes, negros, pletóricos de cor das raparigas e homens do
Douro que o som dos bombos ensandecia de entusiasmo.”
«Uma parte dos visitantes foi simultaneamente
objecto de exposição. Isto aconteceu no âmbito de dois cortejos que balizaram o
calendário da mesma: a Parada Regional de Entre Douro e Minho, que
ocorreu a 15 de Julho, e o Cortejo Colonial, que marcou o encerramento
da exposição, a 30 de Setembro de 1934. Parece ser esclarecedora, se lermos os
seus subentendidos, uma nota surgida a 7 de Julho, no noticiário local de “O Primeiro de Janeiro”, a
propósito da organização do certame referido para 15 de Julho:
Continua o entusiasmo por esta grandiosa
festa no concelho de Vila Nova de Gaia. A classe rural sabe que não se trata
apenas de uma Parada de costumes, danças e folklore regionais, mas também de um cortejo cívico
do povo das aldeias que patrioticamente vem manifestar o seu contentamento e
admiração pelos feitos gloriosos dos seus maiores».
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia, professor
no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica
Press, 2003
Desfile de
representantes na “Parada Regional do Entre Douro e Minho”, na Rua de Santa
Catarina, em 16 de Julho de 1934 – Fonte: jornal “O Século”, Arquivo de
Fotografia de Lisboa
As manifestações
presentes durante Exposição Colonial de 1934, de exaltação de costumes de raiz
popular, estender-se-iam e contagiariam a própria burguesia.
Assim, mais uma vez
o jornal “O Comércio do Porto” dava conta de uma festa ocorrida num hotel de
Vizela.
“Como era de esperar foi de uma grandiosidade
nunca vista a festa puramente nacional que os proprietários do Hotel Cruzeiro
do Sul ontem proporcionaram aos seus hóspedes (…) surgiu inesperadamente um
numeroso grupo de senhoras e cavalheiros que vestidos com trajes do Minho e de
Marias de Portugal despertaram a alegria e a boa disposição (…). Pelas duas
horas da madrugada teve princípio a ceia à portuguesa que principiou pelo
tradicional caldo verde, que foi seguido.
As mesas arranjadas com louça grossa, candeeiros
de três bicos, velas, pequenos pires de tremoços, garfos de ferro e pão de
milho davam bem a impressão das mesas dos lavradores.”
In jornal “O
Comércio do Porto” de 14 de Agosto de 1934
A 30 de Setembro de
1934, acontece o encerramento da exposição com um grandioso cortejo cívico que
percorreu algumas ruas da cidade.
“Um dos acontecimentos
mais simbólicos que marcou o seu encerramento foi a realização do cortejo
alegórico. Esse cortejo, que integrou dezenas de carros alusivos, centenas de
figurantes históricos e as populações trazidas das regiões metropolitanas e
coloniais, bem como espécimes animais, percorreu as ruas da cidade desde da Foz
do Rio Douro até aos Jardins do Palácio de Cristal, teatralizando episódios e
figuras da história dos Descobrimentos.
Foram ainda
organizados concursos, saraus, paradas, congressos, romagens, provas
desportivas e excursões. Promoveu-se a deslocação de grupos e de pequenas
comunidades de todos os pontos do país como escolas, orfanatos, quartéis,
institutos e sindicatos corporativos. A CP (Caminhos-de-Ferro Portugueses)
organizou mesmo uma “Grande Excursão Nacional” à cidade do Porto, transportando
cerca de cinco mil passageiros em 21 comboios e a Igreja católica também se
mobilizou (Martins, 2012:171). De Vigo, na Galiza (Espanha) vieram jornalistas;
houve visitantes estrangeiros ilustres, como o príncipe de Gales e o ministro
das Colónias da Bélgica, Paul Tschoffen; ou ainda o director do jornal Le
Temps, bem como outros jornalistas. No final, as estatísticas oficiosas vieram
a contabilizar o movimento de entradas, entre meados de Junho e finais de
Setembro, em cerca de um milhão e trezentos mil visitantes, número que serviu a
propaganda da exposição no estrangeiro”.
Cortesia de Filomena Serra (Drª em História da Arte
Contemporânea e investigadora integrada do Instituto de História da Arte da
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa)
Carro alegórico de
Macau, durante desfile do Cortejo
Colonial, na Exposição Colonial de 1934
Desfile do Cortejo Colonial, na Exposição Colonial
de 1934 – Ed. Domingos Alvão; Fonte Maria do Carmo Serén, In “A Porta do
meio a Exposição Colonial de 1934, Fotografias da casa Alvão. Porto Centro
Português de Fotografia, 2001”
Cortejo histórico durante
a Exposição Colonial Portuguesa, em 1934 – Fonte: CMP, Arquivo Histórico
Municipal
Medalha e selos comemorativos da Exposição Colonial de 1934
Heinrich Gleiser, o homem das andas, a distribuir sabonetes da
Ach. Brito na Exposição Colonial Portuguesa, em 1934
“Apesar da relativa
modéstia dos meios usados, a Exposição Colonial foi um evento visitado em
massa. Passaram pelo recinto centrado no Palácio das Colónias — nome do Palácio
de Cristal no verão de 1934, quando foi transformado pela implantação de
fachada temporária de linhas modernistas — cerca de um milhão e meio de
pessoas, segundo os cálculos mais optimistas do seu director técnico, Henrique
Galvão. Aquele dado quantitativo sugere a importância e o impacte social da
iniciativa nos distritos do norte do país.
(…) A maioria das
pessoas que foram meus informantes no Porto, não sabia nada da Exposição
Colonial. As suas lembranças de infância, de idas nos fins-de-semana aos
jardins do Palácio de Cristal, davam conta de confrontos com algumas marcas e
objectos que tinham sobrado daquela iniciativa: uma “Aldeia dos Macacos” — no
pequeno lago que acolhera a “Aldeia Lacustre Bijagoz” —, um leão que sobreviveu
miseravelmente, um aviário malcheiroso com pássaros exóticos. Em Junho de 1934,
um jornalista anotou sem má-consciência nenhuma: “O exotismo na Exposição
Colonial é dado sobretudo pelos indígenas e pelos exemplares zoológicos, que
têm constituído para o público um motivo de excepcional curiosidade.” (O
Comércio do Porto Colonial 16/6/1934). Hoje já desapareceram dos jardins do
palácio os rastos da iniciativa pedagógica que o estado pagou em 1934.”
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia,
professor no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica
Press, 2003
Da exposição sobreviveria, após o seu final, um leão com
“residência”, durante dezenas de anos, numa jaula dos jardins do Palácio – era
o “Sofala”.
Numa outra jaula e também com uma boa longevidade, esteve um
chimpanzé – o Chico.
Ambas as jaulas eram visita da miudagem que antes da década
de 1980 demandavam o Palácio de Cristal.
Hoje, tal não seria possível. Neste caso, chama-se
progresso.
O “Chico” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de
Henrique Tavares
O “Sofala” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de
Henrique Tavares
(Continua)
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