terça-feira, 26 de novembro de 2019

(Continuação 1)


Exposição Colonial do Porto de 1934


“As exposições coloniais eram realizadas mundialmente durante o século XIX e na primeira metade do século XX nos países europeus. Destinavam-se a mostrar aos habitantes da metrópole, as diferentes facetas das colónias. As exposições coloniais resultavam das reconstruções espetaculares dos ambientes naturais e monumentos de África, Ásia e Oceânia. A encenação dos habitantes das colónias, muitas vezes deslocados à força do seu local de origem, deu-lhes posteriormente a classificação de zoológicos humanos.”
Fonte: “pt.wikipedia.org”


Esta exposição seria inaugurada em sessão solene no Palácio da Bolsa, a 15 de Junho de 1934, abrindo as suas portas no dia seguinte, nos jardins do Palácio de Cristal e prolongou-se até 30 de Setembro, do mesmo ano, tendo durado, por isso, 3 meses e meio e, para o efeito, sido erguidos cerca de quatrocentos pavilhões, montados em cinco meses.
A que a antecedeu tinha-se realizado em 1931, em Paris.
Anos antes, também no Porto, tinha o Rei D. Carlos inaugurado, a 2 de Março de 1894, uma “Exposição Insular e Colonial”, que tentou unir a nação, após o Ultimato Inglês.
Agora, pretendia-se uni-la em torno de um regime político, que nos iria governar por algumas décadas.
O presidente da Câmara do Porto era, na altura da exposição, o portuense António Augusto Esteves Mendes Correia, principal fundador da Sociedade de Antropologia e, também, o fundador do Museu da Universidade do Porto.
Com o seu stand na Avenida da Índia (Avenida das Tílias), Domingos Alvão fez as imagens diárias para o jornal privativo da Exposição. Além dessas, realizou largas centenas de fotografias, que hoje se encontram no Centro Português de Fotografia. Foi, ele, o único fotógrafo da exposição.


Mapa mostrando a extensão do Portugal colonial (Todas as salas de aula, da escola primária, tinham um, nas suas paredes)



Cartaz publicitando a Exposição Colonial do Porto (1934)



“Em 1934 o Regime já consolidado e inspirado pela Exposição Colonial de Paris de 1931, promove no Porto a primeira das suas grandes exposições - a Exposição Colonial do Porto – destinada a propagandear o Estado Novo como um regime moderno, activo num Portugal Imperial. Para Comissário da Exposição, é escolhido o capitão Henrique Galvão (1885-1970), então ainda um dos militares ligados ao Regime e um dos homens mais conhecedores dos nossos territórios coloniais, já que tinha sido Governador da província de Huíla em Angola (1929), participado na Exposição Colonial de Paris em 1931 e organizado as feiras coloniais de Luanda e Lourenço Marques (1932).
(…) Mas, se os objectivos da Exposição são claros, mostrar interna e externamente a unidade e a grandeza do Império Colonial Português, a ideia da sua realização no Porto, deve-se provavelmente ao volume e importância da emigração e das importações de mercadorias com o Brasil e as Colónias, que se efectua através do porto do Douro.”
Ercílio de Azevedo, “Porto 1934 - A Grande Exposição”. Fonte: Blogue “doportoenaoso”



Com um novo regime político instituído desde 1932, e com Salazar no seu comando, não foi deixada de lado, a possibilidade de glorificar o Chefe do Governo.


Apologia de Salazar durante a “Exposição Colonial do Porto” (1934)



Capa do catálogo da “Exposição Colonial do Porto” (1934)


Tenente Henrique Galvão – Director Técnico da Exposição Colonial do Porto (1934)



Vista aérea da entrada do Palácio de Cristal, com o Pavilhão das Colónias, à entrada, à direita – Ed. Foto Beleza (1934)


Palácio das Colónias e Monumento ao Esforço Colonizador Português



Monumento ao Esforço Colonizador Português – Ed. Alvão



O conjunto escultórico da foto acima é da autoria do Alferes Alberto Ponce da Castro e de José Sousa Caldas. À volta do obelisco, estão as 6 figuras simbólicas, com 3 metros de altura, a quem se deve o esforço colonizador: o Missionário, o Soldado, a Mulher, o Médico, o Agricultor e o Comerciante. Na base, uma inscrição:
“Em comemoração da Exposição Colonial Portuguesa no Porto de 16 de Junho a 30 de Setembro de 1934”.
Este monumento encontra-se, actualmente, na Praça do Império, na Foz do Douro.




“Os preparativos da Exposição foram acompanhados pela própria cidade, que deveria estar preparada para dar resposta ao elevado número de visitantes que se esperava aí acorrer. Nos periódicos o número de anúncios aumentava de forma proporcional à aproximação da data de inauguração, dando informações àcerca de hotéis, pensões e transportes, não só na cidade como também nos seus arredores. Neste contexto, a imprensa tomaria um importante papel, cobrindo os principais momentos do evento e dedicando muitas das suas páginas à análise e discussão de assuntos coloniais.
O Comércio do Porto publicou entre Junho de 1934 e Setembro do mesmo ano um total de cinquenta e nove números de um periódico distribuído gratuitamente, “O Comércio do Porto — Colonial”, ao mesmo tempo que Henrique Galvão dirigia a revista Ultramar: Órgão Oficial da I Exposição Colonial , publicada entre Fevereiro e Outubro”.
Cortesia de Vera Lúcia Penetra Gonçalves (Faculdade de Letras da Universidade do Porto) O Palácio de Cristal Portuense na Primeira Exposição Colonial Portuguesa (1934)



Nave Central do Palácio de Cristal durante a Exposição Colonial Portuguesa (1934)


Pavilhão da Companhia União Fabril Portuense das Fábricas de Cerveja e Bebidas Refrigerantes (CUFP), na Exposição Colonial Portuguesa (1934)



Capa d’ “O Comércio do Porto – Colonial” de 22 de Junho de 1934




Comboio percorrendo os jardins do Palácio de Cristal, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão


Teleférico construído para servir os visitantes, durante a Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



“No jardim do Palácio de Cristal procurava-se apresentar o Império Colonial com a floresta tropical, o deserto, uma picada angolana, aldeias típicas de todas as colónias e muitas outras simulações que tinham por intenção dar ao visitante, após o passeio, a sensação de ter viajado por todo o Império Português. Cada Colónia enviou os seus nativos, que foram alojados em aldeias ou habitações típicas, continuando na Exposição a sua vida, usos e costumes coloniais.
(…) Na Avenida da Índia (Avenida das Tílias), eixo estruturante dos jardins do Palácio, estavam, à entrada, o Arco dos Vice- Reis da Índia, e ao fundo, uma réplica do Farol da Guia de Macau.”
Fonte: “portoarc.blogspot.com”



Arco dos Vice–Reis da Índia na Exposição Colonial de 1934, que se erguia no topo Norte da Avenida das Tílias



Réplica do Farol da Guia de Macau na Exposição Colonial de 1934



Pavilhão do Chá, de Macau, na Exposição Colonial de 1934


Pavilhão de S. Tomé e Príncipe na Exposição Colonial de 1934


Pavilhão de Timor na Exposição Colonial de 1934



Aldeia de Moçambique na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



Feiticeiros de Moçambique na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Alvão



Aldeia Balanta da Guiné, na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão


Lago e aldeia do arquipélago dos “Bijagós” (Guiné- Bissau), na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão



Aldeia de Angola na Exposição Colonial de 1934



A Exposição Colonial de 1934 propiciaria o encontro de realidades etnográficas diversas, como nos narra o jornal “O Comércio do Porto” de 17 de Julho de 1934.


“(…) o famoso rancho típico dos Zés P’reiras do Marco de Canavezes (…) visitou o pavilhão de O Comércio do Porto Colonial oferecendo, por momentos, um espectáculo de cor e de ruído.
Um preto da aldeia lacustre da Guiné, assistindo casualmente, ao espectáculo desta visita regional, improvisou um bailado violento e agitado, entre o grupo dos Zés P’ reiras.
Estabeleceu-se por instantes uma confraternização entre o Douro e a Guiné… o bailado estranho do negro que se saracoteava e regougava modas bárbaras do seu sertão africano, no meio dos trajes escarlates, verdes, negros, pletóricos de cor das raparigas e homens do Douro que o som dos bombos ensandecia de entusiasmo.”


«Uma parte dos visitantes foi simultaneamente objecto de exposição. Isto aconteceu no âmbito de dois cortejos que balizaram o calendário da mesma: a Parada Regional de Entre Douro e Minho, que ocorreu a 15 de Julho, e o Cortejo Colonial, que marcou o encerramento da exposição, a 30 de Setembro de 1934. Parece ser esclarecedora, se lermos os seus subentendidos, uma nota surgida a 7 de Julho, no noticiário local de “O Primeiro de Janeiro”, a propósito da organização do certame referido para 15 de Julho:
Continua o entusiasmo por esta grandiosa festa no concelho de Vila Nova de Gaia. A classe rural sabe que não se trata apenas de uma Parada de costumes, danças e folklore regionais, mas também de um cortejo cívico do povo das aldeias que patrioticamente vem manifestar o seu contentamento e admiração pelos feitos gloriosos dos seus maiores».
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia, professor no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica Press, 2003



Desfile de representantes na “Parada Regional do Entre Douro e Minho”, na Rua de Santa Catarina, em 16 de Julho de 1934 – Fonte: jornal “O Século”, Arquivo de Fotografia de Lisboa



As manifestações presentes durante Exposição Colonial de 1934, de exaltação de costumes de raiz popular, estender-se-iam e contagiariam a própria burguesia.
Assim, mais uma vez o jornal “O Comércio do Porto” dava conta de uma festa ocorrida num hotel de Vizela.


“Como era de esperar foi de uma grandiosidade nunca vista a festa puramente nacional que os proprietários do Hotel Cruzeiro do Sul ontem proporcionaram aos seus hóspedes (…) surgiu inesperadamente um numeroso grupo de senhoras e cavalheiros que vestidos com trajes do Minho e de Marias de Portugal despertaram a alegria e a boa disposição (…). Pelas duas horas da madrugada teve princípio a ceia à portuguesa que principiou pelo tradicional caldo verde, que foi seguido.
As mesas arranjadas com louça grossa, candeeiros de três bicos, velas, pequenos pires de tremoços, garfos de ferro e pão de milho davam bem a impressão das mesas dos lavradores.”
In jornal “O Comércio do Porto” de 14 de Agosto de 1934



A 30 de Setembro de 1934, acontece o encerramento da exposição com um grandioso cortejo cívico que percorreu algumas ruas da cidade.


“Um dos acontecimentos mais simbólicos que marcou o seu encerramento foi a realização do cortejo alegórico. Esse cortejo, que integrou dezenas de carros alusivos, centenas de figurantes históricos e as populações trazidas das regiões metropolitanas e coloniais, bem como espécimes animais, percorreu as ruas da cidade desde da Foz do Rio Douro até aos Jardins do Palácio de Cristal, teatralizando episódios e figuras da história dos Descobrimentos.
Foram ainda organizados concursos, saraus, paradas, congressos, romagens, provas desportivas e excursões. Promoveu-se a deslocação de grupos e de pequenas comunidades de todos os pontos do país como escolas, orfanatos, quartéis, institutos e sindicatos corporativos. A CP (Caminhos-de-Ferro Portugueses) organizou mesmo uma “Grande Excursão Nacional” à cidade do Porto, transportando cerca de cinco mil passageiros em 21 comboios e a Igreja católica também se mobilizou (Martins, 2012:171). De Vigo, na Galiza (Espanha) vieram jornalistas; houve visitantes estrangeiros ilustres, como o príncipe de Gales e o ministro das Colónias da Bélgica, Paul Tschoffen; ou ainda o director do jornal Le Temps, bem como outros jornalistas. No final, as estatísticas oficiosas vieram a contabilizar o movimento de entradas, entre meados de Junho e finais de Setembro, em cerca de um milhão e trezentos mil visitantes, número que serviu a propaganda da exposição no estrangeiro”.
Cortesia de Filomena Serra (Drª em História da Arte Contemporânea e investigadora integrada do Instituto de História da Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa)



Carro alegórico de Macau, durante desfile do Cortejo Colonial, na Exposição Colonial de 1934



Desfile do Cortejo Colonial, na Exposição Colonial de 1934 – Ed. Domingos Alvão; Fonte Maria do Carmo Serén, In “A Porta do meio a Exposição Colonial de 1934, Fotografias da casa Alvão. Porto Centro Português de Fotografia, 2001”



Cortejo histórico durante a Exposição Colonial Portuguesa, em 1934 – Fonte: CMP, Arquivo Histórico Municipal




Medalha e selos comemorativos da Exposição Colonial de 1934



Heinrich Gleiser, o homem das andas, a distribuir sabonetes da Ach. Brito na Exposição Colonial Portuguesa, em 1934



“Apesar da relativa modéstia dos meios usados, a Exposição Colonial foi um evento visitado em massa. Passaram pelo recinto centrado no Palácio das Colónias — nome do Palácio de Cristal no verão de 1934, quando foi transformado pela implantação de fachada temporária de linhas modernistas — cerca de um milhão e meio de pessoas, segundo os cálculos mais optimistas do seu director técnico, Henrique Galvão. Aquele dado quantitativo sugere a importância e o impacte social da iniciativa nos distritos do norte do país.
(…) A maioria das pessoas que foram meus informantes no Porto, não sabia nada da Exposição Colonial. As suas lembranças de infância, de idas nos fins-de-semana aos jardins do Palácio de Cristal, davam conta de confrontos com algumas marcas e objectos que tinham sobrado daquela iniciativa: uma “Aldeia dos Macacos” — no pequeno lago que acolhera a “Aldeia Lacustre Bijagoz” —, um leão que sobreviveu miseravelmente, um aviário malcheiroso com pássaros exóticos. Em Junho de 1934, um jornalista anotou sem má-consciência nenhuma: “O exotismo na Exposição Colonial é dado sobretudo pelos indígenas e pelos exemplares zoológicos, que têm constituído para o público um motivo de excepcional curiosidade.” (O Comércio do Porto Colonial 16/6/1934). Hoje já desapareceram dos jardins do palácio os rastos da iniciativa pedagógica que o estado pagou em 1934.”
Cortesia de António Medeiros (Doutor em antropologia, professor no ISCTE), “Primeira exposição colonial portuguesa (1934)”; In Etnográfica Press, 2003


Da exposição sobreviveria, após o seu final, um leão com “residência”, durante dezenas de anos, numa jaula dos jardins do Palácio – era o “Sofala”.
Numa outra jaula e também com uma boa longevidade, esteve um chimpanzé – o Chico.
Ambas as jaulas eram visita da miudagem que antes da década de 1980 demandavam o Palácio de Cristal.
Hoje, tal não seria possível. Neste caso, chama-se progresso.



O “Chico” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de Henrique Tavares



O “Sofala” atrás das grades em 1975 – Editado de filme de Henrique Tavares


(Continua)

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