A notícia mais recôndita que se conhece fazendo referência a
um mercado, na Foz do Douro, faz-nos recuar à década de 60, do século XIX, de
acordo com o que nos é transmitido na notícia abaixo.
“Principiou anteontem,
na proximidade da praia de banhos, a demolição no local destinado a mercado
público.
É um melhoramento
importante para aquela vila.”
In “O Comércio do Porto”, de 23 de Agosto de 1862 - Sábado
O facto é que o mercado da Foz do Douro, havia de assentar
arraiais, no Largo do Rio da Bica (antes Largo das Lavadeiras) local, do qual,
o jornal “O Imparcial da Foz” nos dá um breve retrato, no texto seguinte.
“A velha rua Central,
tortuosa e irregular, foi, em outro tempo, a principal da foz antiga, tanto em
estabelecimentos comerciais de toda a espécie, como no movimento constante de
transeuntes que, desde a madrugada até ao fim do dia, lhe davam um aspecto
característico, comparado às grandes ruas das cidades populosas. Concorria
muitíssimo para isto o haver um largozinho, no ponto em que se bifurcam
diversas ruas que, da central, irradiavam para outros pontos da Foz, chamado “Rio da Bica”, onde se achava instalado o
mercado local.
Este mercado consistia
em um ajuntamento de vendilhonas de hortaliças, leite, frutas, etc., que, todas
as manhãs se reuniam naquele ponto e ali efectuavam as suas transacções com a
enorme quantidade de gente que o frequentava; não tinha ele condições algumas
exigidas a um mercado de simples aldeia; nem amplidão de terreno, nem bancas ou
coberturas que resguardassem os géneros expostos à venda do ardor do sol ou
alagamento da chuva”.
Largo do Rio da Bica, actualmente – Fonte : Google maps
Na foto acima observa-se o antigo Largo das Lavadeiras onde
esteve o mercado da Foz.
Sobre a direita, é possível divisar a fonte do Rio da Bica
que era abastecida pelo manancial de Burgães.
O mercado da Foz do Douro acabaria, próximo da mudança de
séculos, por ocupar um terreno nas proximidades.
E, mais uma vez, é o jornal “O Imparcial da Foz” que nos dá
o retrato do local que, cedo, se mostrou sem as condições que os habitantes da
Foz desejavam.
“Decorreram os tempos
e a municipalidade portuense entendeu, numa febre de fomento e progresso,
transformar muitas velharias da cidade e amodernizar tudo o que se lhe
afigurasse fóssil e impróprio duma terra de primeira ordem.
Surgiram vários mercados novos em determinados locais, entre esses, o
da Foz, que veio substituir o antigo Rio da Bica.
Comprou-se por bom
preço, em condições algo onerosas para o município, um terreno encravado entre
campos de cultura e ladeado por um rio.
Terraplanou-se,
plantaram-se algumas árvores e deu-se-lhe, daí em diante, o nome de mercado,
fazendo-se transferir para ali as vendilhonas do antigo. Nos primeiros tempos
ainda se viam ali algumas bancas, nas quais eram pousados os géneros à venda.
A Câmara municipal
mandava, de quando em quando, arrancar as ervas, que o terreno, de origem
pantanosa, constantemente fazia brotar, mas veio depressa o cansaço por parte
do município e a erva cresceu com todo o viço, luxuriante, proveniente do
abandono em que a enxada e a vassoura camarária o deixou.
Assim, desde há muito
tempo já, o nosso mercado é irrisório e vergonha de uma terra que, sendo a
única estância balnear da cidade, é imensamente concorrida.
Pode dizer-se que a
Foz, presentemente, não tem mercado. No terreno a que se dá este nome, reúnem
pelas manhãs, uma dúzia de mulheres com bilhas de leite e algumas canastras de
hortaliças, que vendem a outras, residentes nas circunvizinhanças. Desde as
sete horas por diante, já género algum de venda ali se vê.
Transforma-se depois
em secadouro de roupas, que as lavadeiras ali estendem sobre a relva, tentadora
para o caso. E, como o camaleão, ainda não fica só nesta metamorfose! À noite
transforma-se em viçoso prado e vêem-se nele, pastando, grande rebanho de bois,
carneiros e cabras.”
In jornal “O Imparcial da Foz”, de 21 de Agosto de 1904
O jornal “A Gazeta da Foz” fazia também eco da falta de
condições do mercado.
“Só, como ironia
sarcástica, assim podemos chamar àquele quadrilátero relvoso, ali do Rio da
Bica, vergonha e opóbrio desta encantadora Foz.
É indigno daquele nome
o lugar a que o «Zé, cá do burgo» se habituou a chamar mercado, pelo simples
motivo de ali darem poiso meia dúzia (se tantas…) de leiteiras e hortaliceiras”
In “A Gazeta da Foz”, de 9 de Junho de 1907 – 3ª Feira
Apesar da necessidade da existência de um mercado que
servisse os interesses dos inúmeros lavradores da Foz e de Nevogilde, e que
permitisse o escoamento das suas produções, só na década de 40 do século XX,
tal foi possível, com a construção, finalmente, de um com instalações
condignas.
“Efectuou-se ontem,
sábado, 15 de Janeiro, às 9 horas, a inauguração oficial do novo mercado da Foz
do Douro. O acto foi revestido de toda a simplicidade.
Simpáticas meninas,
vestindo garrida e pitoresca indumentária minhota, cobriram de flores o
presidente da Câmara e demais individualidades. Subiu ao ar o foguetório e as
bandas do Asilo do Terço e do Internato Municipal executaram o hino nacional.
Tem 16 lojas laterais
e 34 bancos centrais, estes destinados à venda de hortaliças.”
In “O Comércio do Porto”, de 16 de Janeiro de 1944 – Domingo
Interior do mercado da Foz – Fonte: Artur Filipe dos Santos
Porém, em 1953, já o movimento do mercado apresentava um
acentuado decréscimo.
A agricultura como sector de actividade naquelas terras,
dava agora lugar em grande escala, à construção civil.
O mercado da Foz do Douro acaba, assim, por ser entregue à
Junta de Freguesia, em regime de concessão, em 1 de Outubro de 1953, por
pressão dos locatários, tentando-se, deste modo, evitar o seu encerramento.
“O Mercado da Foz, que completa hoje setenta
anos de actividade, foi mandado edificar pela Câmara Municipal do Porto porque
a Foz do Douro, e a sua área envolvente, era, à época, uma zona com muitos
lavradores que sentiam necessidade de um local onde pudessem escoar os produtos
agrícolas que produziam. Mas o município só decidiu construí-lo porque no
Mercado Ferreira Borges se ia registando enorme perda de clientes. Esse Mercado
esteve para ser transferido para a Foz do Douro em 1906, tendo em conta que já
nessa altura havia na vereação quem defendesse que era a melhor solução. Mas
nunca se deu tal transferência. Assim, para a construção do Mercado da Foz foi
comprado um terreno pela Câmara Municipal, de lavradio, com 6.613 metros
quadrados, sito à rua da Cerca, na parte que hoje é avenida do Marechal Gomes
da Costa e o caminho da “Ervilha", conforme refere o Boletim Municipal do
Porto, em 1936. Veio a ser inaugurado a 15 de janeiro de 1944, precisamente
quatro anos depois da aprovação, pela edilidade do Porto, do projecto do
arranjo urbanístico da zona da avenida do Marechal Gomes da Costa”.
Com o devido crédito a Agostinho Barbosa Pereira, publicado na página
"A Nossa Foz do Douro", em 15/01/2014
Projecto para um
mercado a construir junto da Rua do
Gama e Caminho da Ervilha
Legenda
1 – Rua do Gama
(actual Rua de Diu)
2 – Avenida Marechal
Gomes da Costa
3 – Caminho da
Ervilha
4 – Rua Côrte Real
5 – Mercado da Foz
O projecto para o
Mercado da Foz foi da autoria dos arquitectos Mário Ferreira e Francisco
Pinheiro da Mota Coelho, aprovado em 1943-04-08, com alteração ao projecto,
aprovada em 1943-07-16.
Desenho da vedação
da frente do Mercado da Foz
Mercado da Foz nos
primórdios – Fonte: Agostinho Barbosa
Pereira, "A Nossa Foz do Douro"
Mercado da Foz do
Douro actualmente – Ed. “porto.convida.pt”
Importa referir que,
alguns meses antes da inauguração do mercado da Foz, tivera lugar, portas meias
com ele, a inauguração de uma outra estrutura de apoio às gentes do local – o
Lavadouro Público.
“Inaugurado a 11 de Março de 1943, o novo
lavadouro público sito no alto da rua do Gama, com a entrada para a rua de
Corte Real e traseiras para a rotunda da Av. Marechal Gomes da Costa. Pode
comportar 44 lavadeiras”.
In jornal “O
Comércio do Porto”, de 12 de Março de 1943 – 6ª Feira
Lavadouro Público da Foz do Douro
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