Em tempos idos, o que conhecemos como Miragaia, nas
traseiras da actual Alfândega Nova, era um vasto areal onde labutavam
pescadores e armadores da indústria naval, que acabariam ao longo dos anos,
fruto da expansão da urbe, por se deslocarem para zonas mais distantes do
Porto, passando a ocupar por exemplo, Lordelo ou Afurada.
O areal de Miragaia naqueles tempos foi ocupado, então, por
estaleiros navais, onde se construíram muitas das embarcações usadas na
expansão portuguesa ultramarina e no comércio do Porto com o Norte da Europa.
A primitiva igreja existente em Miragaia devia ser,
inicialmente, do tipo da igreja velha de Cedofeita, em estilo românico,
provavelmente do século XIII.
Foi para Miragaia, onde acabaram por se estabelecer, que uma
comunidade de arménios e alguns cristãos, fugidos de Constantinopla, que tinha
sido tomada pelos turcos, em Maio de 1453, se acolheu, transportando consigo as
relíquias de S. Pantaleão.
Da sua presença resta o topónimo de uma rua e as relíquias
daquele santo, que acabaram em 1499 por ser recolhidas na Sé, tendo sido ele,
durante largos anos, patrono da cidade.
Pantaleão tinha sido médico em Nicomedia, na Arménia,
converteu-se ao cristianismo e foi martirizado na sua cidade natal, no ano 320,
no tempo dos Imperadores Diocliciano e Maximiniano. O seu corpo seria, então, levado
para Constantinopla e aí venerado.
Em 1672, o bispo D. Nicolau Monteiro reformou a igreja
existente em Miragaia, mas, 58 anos depois, em 1740, o templo ameaçava ruir e o
cabido, aproveitando o período de sede vacante (diocese sem bispo entre 1717 e
1741), mandou construir uma nova, a actual, "toda
de pedra, bem obrada e ornada; toda de composição proporcionada com sua torre
de quatro sineiras, escadas de pedra e abóbada, tudo em remates de estilo
moderno".
Dedicada a São Pedro, a igreja de Miragaia apresenta fachada
principal de tipologia que lembra as suas congéneres de Nossa Senhora da
Vitória ou São Nicolau.
O custo das obras foi repartido entre o Cabido e os fiéis de
Miragaia. A estes, por exemplo, coube pagar as obras da capela-mor, "a qual reformaram e acrescentaram: lhe
puseram suas janelas de luzes e uma grande tribuna e retábulo dourado e
cobriram o teto e lado da mesma capela com obras de talha e escultura dourada e
lhe fizeram oferta de preciosos ornamentos para suas solenidades".
“No interior, a igreja
desenvolve-se em nave única e transepto saliente, de grande simplicidade,
contrastando fortemente com a opulência da talha barroca que reveste
integralmente a capela-mor. Iniciada no século XVII, esta campanha decorativa
prolongar-se-ia até ao século XVIII, como testemunham os elementos rococó que
aqui se encontram. Juntamente com Santa Clara, ou São Francisco, é um exemplo
significativo de igreja forrada a ouro.
António Gomes e
Caetano da Silva Pinto foram os responsáveis por esta obra que incluía ainda a
tribuna, o sacrário e a banqueta. Pensa-se que os trabalhos de talha estariam
concluídos em 1724 e o douramento, executado por Francisco Barbosa Monteiro, em
1730. O retábulo-mor, preponderante neste conjunto e muito semelhante ao de
Santa Clara (embora menos escultórico), apresenta duas inovações, nomeadamente
ao nível da base - mais alta e de madeira, que se tornaria modelo frequente
para outras igrejas portuenses e nortenhas -, e ao nível do modelo do fuste das
colunas - canelado, à semelhança dos modelos quinhentistas, mas revestido por
fitas, festões, e outros (PEREIRA, 1995, p. 111).
Fonte: “portopatrimoniomundial.com”
Igreja de S. Pedro de Miragaia – Fonte: “portopatrimoniomundial.com”
“A igreja é muito
simples. A fachada tem um portal com frontão e um grande janelão gradeado e é
rematada por um frontão triangular com a legenda «Divo Petro Dicata» (Dedicada
a S. Pedro) e encimado por uma cruz. As paredes foram revestidas de azulejos
entre 1863 e 1876. A nave única da igreja é enriquecida apenas pelo altar de
talha dourada dedicado a Nossa Senhora do Carmo e que pertenceu à igreja do
extinto e arruinado Convento de Monchique e pelo altar de Santa Rita, do século
XVII. A capela-mor é revestida de talha reforçada com elementos vindos de Monchique.”
Fonte: “pt.wikipedia.org”
Em 1808, a Confraria do Santíssimo de Miragaia compraria à Celestial Ordem da Trindade dois altares que estavam em arrecadação. Tal facto, talvez se tivesse ficado a dever à ocorrência de um incêndio na igreja de S. Pedro de Miragaia, algum tempo antes e, os mesmos, se destinassem à substituição dos destruídos durante o sinistro.
Os referidos altares terão servido os trinitários na, há muito desaparecida, capela do Calvário Novo, que se localizava onde está o Palácio da Justiça.
A esta igreja de S. Pedro de Miragaia, está ligado, Pedro
Augusto Ferreira (Lamego, Penajóia, Casa da Capela, 14 de Novembro de 1833 -
Porto, 17 de Junho de 1913), abade de Miragaia (desde 1864) e publicista, que continuou
a obra “Portugal Antigo e Moderno”, após a morte de Pinho Leal ocorrida em
1884.
Tendo possuído uma importante livraria, composta de 3.653
obras, de que se imprimiu um catálogo em 1902, no Porto, oferecê-los-ia à
Biblioteca Municipal do Porto, que o considerou Cidadão Benemérito e deu o seu
nome a uma das ruas da cidade.
Em meados do século XX (1941), foi executado um processo de
demolição em construções adjacentes à igreja de S. Pedro.
Igreja de S. Pedro de Miragaia antes das demolições
Obras para a construção do Largo de S. Pedro
Demolição de prédios para a construção do Largo de S. Pedro
Perspectiva actual, após algumas demolições de prédios em
torno da igreja de S. Pedro de Miragaia – Ed. JPortojo
Actualmente, visitando a igreja de S. Pedro de Miragaia, pode
observar-se em exposição o “Tríptico do Espírito Santo”, originalmente pintado
para a Capela do Hospital do Espírito Santo, que esteve numa área atrás do
actual templo e de cujo complexo já só existem as paredes exteriores com a
serventia de pequeno armazém.
Aquela obra de arte foi transferida para a localização actual
no final do século XIX, sendo, segundo o Centro Nacional de Cultura, um
“notável” exemplar do Renascimento flamengo e possivelmente de uma escola de
Antuérpia.
A Direção-Geral do Património Cultural admite que o pintor
flamengo Bernaert van Orley, comparado na sua época ao mestre italiano Rafael,
seja o autor do tríptico.
“O Tríptico do
Espírito Santo foi realizado na Flandres, porventura com participação de um
pintor português e a sua data será entre 1512 e 1517;
em 1637 foi,
possivelmente, incorporado num retábulo e, em 1887, foi trasladado para a
Igreja de Miragaia devido ao estado de ruína da capela, alterando-se o retábulo
que o emoldurava;
em 1914 foi para
Lisboa, a fim de ser conservado e restaurado, intervenção que foi realizada por
Luciano Freire, regressando à Igreja em 1926.”
Cortesia da investigadora Carla Ferreira
Cortesia de Filipa Brito
A obra engloba nos seus painéis várias representações
religiosas: ao centro o Pentecostes; S. João Baptista e o doador, provavelmente
João de Deus II (à esquerda de quem observa); e S. Paulo (à direita).
Quando fechado, o tríptico exibe a Anunciação.
Tríptico fechado – Cortesia de Filipa Brito
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