segunda-feira, 24 de outubro de 2016

(Continuação 2) - Actualização em 09/11/2018


3.4 Almeida Garrett e as lutas Constitucionais do século XIX



João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett nasceu na Rua do Calvário no Porto, com o nome de João Leitão da Silva, a 4 de Fevereiro de 1799, sendo filho segundo de António Bernardo da Silva Garrett, selador-mor da Alfândega do Porto e de Ana Augusta de Almeida Leitão. Passou a sua infância em V. N. de Gaia, altura em que alterou o seu nome para João Baptista da Silva Leitão. Mais tarde viria a escrever a este propósito: "Nasci no Porto, mas criei-me em Gaia". No período de sua adolescência foi viver para os Açores, na ilha Terceira, fugindo da segunda invasão francesa, realizada pelo exército comandado pelo marechal Soult que entrando em Portugal por Chaves se dirigiu para o Porto, ocupando-o.
Passou a adolescência na ilha Terceira, tendo sido destinado à vida eclesiástica, devendo entrar na Ordem de Cristo, por intercedência do tio paterno, Frei Alexandre da Sagrada Família, bispo de Malaca e depois de Angra.
Em 1816, tendo regressado a Portugal, inscreveu-se na Universidade, na Faculdade de Leis, sendo aí que entrou em contacto com os ideais liberais. Em Coimbra, organiza uma loja maçónica, que será frequentada por alunos da Universidade, como Manuel Passos. Em 1818, começa a usar o apelido Almeida Garrett, assim como toda a sua família.
Almeida Garrett participa, então, na revolução liberal de 1820, da qual parece ter tido conhecimento atempado, como parece provar a poesia “As férias”, escrita em 1819. Enquanto dirigente estudantil e orador defende o vintismo com ardor escrevendo um Hino Patriótico recitado no Teatro de S. João. Em 1821, funda a Sociedade dos Jardineiros, e volta aos Açores numa viagem de possível motivação maçónica. De regresso ao Continente, estabelece-se em Lisboa, onde continua a publicar escritos patrióticos. Concluindo a Licenciatura em Novembro deste ano.
Em Coimbra, em 1821, publica o poema libertino O Retrato de Vénus, que lhe vale ser acusado de materialista e ateu, assim como de «abuso da liberdade de imprensa», de que será absolvido em 1822. Torna-se secretário particular de Silva Carvalho, Secretário de Estado dos Negócios do Reino, ingressando em Agosto na respectiva secretaria, com o lugar de Chefe de Repartição da Instrução Pública.
Almeida Garrett acaba por casar-se, em 1822, com uma jovem senhora, Luísa Midosi que tinha apenas 14 anos.
Partiria para o exílio, na Inglaterra, em 1823, após a Vilafrancada. 







Casa na Rua Barbosa de Castro (antiga Rua do Calvário) que ardeu em Abril de 2019



Identificação no prédio onde nasceu o poeta - Ed. Isabel Silva



Foi em Inglaterra que tomou contacto com o movimento romântico, descobrindo Shakespeare, Walter Scott e outros autores e visitando castelos feudais e ruínas de igrejas e abadias góticas, vivências que se reflectiriam na sua obra posterior.
Em 1824, pode partir para França e nessa viagem escreveu o conhecidíssimo Camões (1825) e Dona Branca (1826, não tão conhecido como o anterior mas não menos importante), poemas geralmente considerados como as primeiras obras da literatura romântica em Portugal. No ano de 1826, foi chamado e regressou à pátria com os últimos emigrados dedicando-se ao jornalismo, fundando e dirigindo o jornal diário, O Português (1826-1827) e o semanário, O Cronista (1827). Também colaborou na Revista Universal Lisbonense (1841-1859) e na Semana de Lisboa (1893-1895).
Teria de deixar Portugal novamente em 1828, com o regresso do rei usurpador D. Miguel.
Ainda no ano de 1828 perdeu a sua filha recém-nascida. Novamente em Inglaterra publica Adozinda (1828).
Juntamente com Alexandre Herculano e Joaquim António de Aguiar tomou parte no desembarque do Mindelo e no Cerco do Porto em 1832 e 1833.
A vitória do liberalismo permitiu-lhe instalar-se novamente em Portugal, após curta estadia em Bruxelas como cônsul-geral e encarregado de negócios, onde lê Schiller, Goethe e Herder.
Em Portugal exerceu cargos políticos, distinguindo-se nos anos 30 e 40 como um dos maiores oradores nacionais. Foram de sua iniciativa a criação do Conservatório de Arte Dramática, da Inspecção-Geral dos Teatros, do Panteão Nacional e do Teatro Normal (actualmente Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa). Mais do que construir um teatro, Garrett procurou sobretudo renovar a produção dramática nacional segundo os cânones já vigentes no estrangeiro.
Logo em 28 de Setembro de 1836, Almeida Garrett é incumbido de apresentar uma proposta para o teatro nacional, o que faz propondo a organização de uma Inspecção-Geral dos Teatros, a edificação do Teatro D. Maria II e a criação do Conservatório de Arte Dramática.
Os anos de 1837 e 1838 são preenchidos nas discussões políticas que levarão à aprovação da Constituição de 1838, que se manteria até 1842 e na renovação do teatro nacional.
Em 20 de Dezembro, é nomeado cronista-mor do Reino, organizando logo no princípio de 1839 um curso de leituras públicas de História. No ano seguinte o curso versa a «história política, literária e científica de Portugal no século XVI».
A vida de Garrett foi tão apaixonante quanto a sua obra. Revolucionário nos anos 20 e 30, distinguiu-se posteriormente sobretudo como o tipo perfeito do dândi, ou janota, tornando-se árbitro de elegâncias e príncipe dos salões mundanos. Foi um homem de muitos amores, uma espécie de homem fatal. Separado da esposa, Luisa Midosi, passa a viver em mancebia com D. Adelaide Pastor até a morte desta, em 1841.
No ano de 1843, Almeida Garrett começa a publicar, na Revista Universal Lisbonense, as Viagens na Minha Terra, descrevendo a viagem ao Vale de Santarém começada em 17 de Julho. Anteriormente, em 6 de Maio, tinha lido no Conservatório Nacional uma memória em que apresentou a peça de teatro Frei Luís de Sousa, fazendo a primeira leitura do drama.
A partir de 1846, a sua musa é a viscondessa da Luz, Rosa Montufar Infante, andaluza casada, desde 1837, com o oficial do exército português Joaquim António Velez Barreiros, inspiradora dos arroubos românticos das Folhas Caídas.
 
 
 
 
Actividade Política de Almeida Garrett
 
 
Participante entusiástico na Revolução de 1820, em 1823, após o golpe militar de D. Miguel denominado de Vilafrancada, que acaba com a primeira experiência liberal em Portugal, obriga Almeida Garrett a exilar-se no estrangeiro.
Estabelece-se em Março de 1824 no Havre, cidade portuária francesa na foz do Sena, mas em Dezembro está desempregado, o que o leva a ir viver para Paris.
 
 
 
“O regime liberal instaurado em Portugal pela Revolução de 24 de Agosto de 1820 não podia satisfazer os sectores mais tradicionalistas da população, que reclamavam a restauração do Absolutismo. À cabeça dos descontentes encontravam-se a rainha D. Carlota Joaquina, esposa de D. João VI, que recusara jurar a Constituição de 1822 e estava exilada em Queluz, e o filho segundo dos soberanos, o Infante D. Miguel.
O ano de 1823 trouxe aos absolutistas a ocasião por que esperavam. A invasão de Espanha por tropas francesas mandatadas pela Santa Aliança para esmagar o regime constitucional e reconduzir ao poder o rei Fernando VII encorajara o levantamento absolutista do conde de Amarante no norte de Portugal e animou o partido da rainha a revoltar-se abertamente, confiante no auxílio francês. A 27 de Maio de 1823, o Infante D. Miguel deslocou-se a Vila Franca e aí se lhe juntou um regimento de infantaria que deveria ter seguido para Almeida a reforçar a fronteira contra as investidas dos revoltosos nortenhos. Foram dados vivas à monarquia absoluta, e é de crer que o infante e a rainha projectassem mesmo a abdicação de D. João VI, que se mantinha fiel à Constituição que jurara.
No final do mês, porém, D. João VI decidiu tomar a direcção da revolta, encorajado pelo levantamento do Regimento de Infantaria 18, que viera ao Palácio da Bemposta dar-lhe vivas como rei absoluto; partindo para Vila Franca, obrigou o infante rebelde a submeter-se-lhe e regressou a Lisboa em triunfo. As cortes dispersaram-se, vários políticos liberais partiram para o exílio e foi Restaurado o Regime Absolutista, mas D. João VI logrou impedir a ascensão ao poder do partido ultra-reaccionário e manter a sua posição determinante no xadrez político. O partido da rainha não deixou, porém, de continuar a intrigar, e menos de um ano mais tarde eclodia nova revolta contra D. João VI, a Abrilada, que resultou no exílio do próprio Infante D. Miguel”.
In Wikipédia
 
 
Entretanto, não sendo permitido a Almeida Garrett o regresso a Portugal, volta ao seu antigo emprego no Havre. Em 1826, está de volta a Paris, para ir trabalhar na livraria Aillaud. A mulher regressa a Portugal.
É amnistiado após a morte de D. João VI, regressando com os últimos emigrados, após a outorga da Carta Constitucional, reocupando em Agosto o seu lugar na Secretaria de Estado. Em Outubro começa a editar «O Português, diário político, literário e comercial», sendo preso em finais do ano seguinte.
Libertado, volta ao exílio em Junho de 1828, devido ao restabelecimento do regime tradicional por D. Miguel. De 1828 a Dezembro de 1831, estabelece-se por usurpação do trono, um Regime Absolutista.
Entretanto, a 21 de Agosto de 1831, ocorreria uma revolta do Regimento nº 4, de Infantaria de Lisboa contra o governo ditatorial de D. Miguel I, que fracassou.
Almeida Garrett passa então a viver em Inglaterra, indo depois para França, onde se integra num batalhão de caçadores e, mais tarde, em 1832, vai para os Açores integrado na expedição comandada por D. Pedro IV. Nos Açores, transfere-se para o corpo académico, sendo mais tarde chamado, por Mouzinho da Silveira, para a Secretaria de Estado do Reino.
Almeida Garrett participa na expedição liberal que desembarca no Mindelo em Julho de 1832 e participa como sitiado no Cerco do Porto,
No Porto, é reintegrado como oficial na secretaria de estado do Reino, acumulando com o trabalho na comissão encarregada do projecto de criação do Código Criminal e Comercial.
Em Novembro, parte com Palmela para uma missão a várias cortes europeias, mas a missão é dissolvida em Janeiro e Almeida Garrett vê-se abandonado em Inglaterra, indo para Paris onde se encontra com a mulher.
Só com a ocupação de Lisboa em Julho de 1833, consegue apoio para o seu regresso, que acontece em Outubro. Em 2 de Novembro, é nomeado vogal-secretário da Comissão de Reforma Geral dos Estudos. É por essa altura que se terá instalado no palácio dos Condes de Almada, no Largo de S. Domingos, em Lisboa, onde reunia a referida comissão. Em Fevereiro, do ano seguinte, é nomeado cônsul-geral e encarregado de negócios na Bélgica, onde chega em Junho, mas é de novo abandonado pelo governo.
Regressa a Portugal em princípios de 1835, regressando ao seu posto em Maio.
Estava em Paris, em tratamento, quando foi substituído sem aviso prévio na embaixada belga. Nomeado embaixador na Dinamarca, é demitido antes mesmo de abandonar a Bélgica.
Estes sucessivos abandonos por parte dos governos Cartistas ou seguidores da Carta Constitucional de 1826 levam-no a envolver-se com o Setembrismo, dando, assim, origem à sua carreira parlamentar.
Convirá atentar que a Carta Constitucional esteve em vigor durante 3 períodos distintos:
O primeiro foi desde Abril de 1826 (outorga da Carta) até Maio de 1828 (quando D. Miguel é aclamado rei absolutista);
O segundo período decorreu desde Agosto de 1834 (quando D. Miguel é expulso de Portugal e é restaurada a Monarquia Constitucional) até Setembro de 1836 (Revolução Setembrista com a restauração provisória da Constituição Política da Monarquia Portuguesa de 1822);
O terceiro e último período decorreu desde Janeiro de 1842 (golpe de estado de Costa Cabral) até Outubro de 1910 (implantação da República).
Importa saber, também, que Setembrismo é a designação dada à corrente mais à esquerda do movimento liberal. O setembrismo derivou directamente do vintismo, recebendo a sua designação do apoio prestado por esta facção à Revolução de Setembro. Por coincidência, a Constituição Política da Monarquia Portuguesa de 1822 fora também aprovada em Setembro.
Uma das causas do descontentamento e de oposição à Carta Constitucional vigente à data e que daria origem ao Setembrismo, vinha do facto dela ter sido “outorgada por D. Pedro IV em 1826 e não ter legitimidade, por não emanar de uma qualquer assembleia legítima”.
Com aquele documento em vigor, punha-se em causa a própria soberania do povo, um dos princípios em que o liberalismo português estava alicerçado.
Outra das causas do descontentamento era a miséria de boa parte do povo operário; a dependência em relação à Inglaterra; a concentração do poder político e económico numa burguesia limitada, predominantemente rural; o cariz fortemente antidemocrático do cartismo e da Carta Constitucional; e a revolução em Espanha de 1836.
Em 15 de Julho de 1841, Almeida Garrett ataca violentamente o ministro António José d'Ávila, num discurso a propósito da Lei da Décima, o que implica a sua passagem para a oposição e, leva-o à demissão de todos os seus cargos públicos.
Em 1842, opõem-se à restauração da Carta proclamada no Porto por Costa Cabral. Eleito deputado nas eleições para a nova Câmara dos Deputados cartista, recusa qualquer nomeação para as comissões parlamentares, como toda a esquerda parlamentar.
No ano seguinte, ataca violentamente o Cabralismo, que compara ao governo absolutista.
Continuando a sua oposição ao Cabralismo, participa na Associação Eleitoral, dirigida por Sá da Bandeira, assim como nas eleições de 1845, onde foi um dos 15 membros da minoria da oposição na nova Câmara. Em 17 de Janeiro de 1846, proferiu um discurso em que considerava a minoria como representante da «grande nação dos oprimidos», pedido em 7 de Maio a demissão do governo e, em Junho, a convocação de novas Cortes.
Com o despoletar da revolução da Maria da Fonte, e da Guerra Civil da Patuleia, Almeida Garrett que apoia o movimento, tem que passar a andar escondido, reaparecendo em Junho, com a assinatura da Convenção de Gramido, em Junho de 1847.
No entanto, Costa Cabral irá sobreviver, politicamente, até 1851.
Em 1849, Almeida Garrett passa uma breve temporada em casa de Alexandre Herculano, na Ajuda. Em 1850, subscreve com mais de 50 outras personalidades um protesto contra a Proposta sobre a Liberdade de Imprensa, mais conhecida por «lei das rolhas» e, em Dezembro, Costa Cabral nomeia-o, para a comissão do monumento a D. Pedro IV. Em 1851, fundou o Jornal "Regeneração" a propósito do movimento político da regeneração.
Com o fim do Cabralismo e o começo da Regeneração, em 1851, Almeida Garrett é consagrado oficialmente.
Almeida Garrett é nomeado sucessivamente para a Redacção das Instruções ao Projecto da Lei Eleitoral, como Plenipotenciário nas Negociações com a Santa Sé, para a Comissão de Reforma da Academia das Ciências, Vogal na Comissão das Bases da Lei Eleitoral, e na Comissão de Reorganização dos Serviços Públicos, para além de Vogal do Conselho Ultramarino, e de estar encarregado da redacção do que irá ser o Acto Adicional à Carta.
Por decreto do Rei D. Pedro V de Portugal, datado de 25 de Junho de 1851, Garrett é feito Visconde de Almeida Garrett, em vida (tendo o título sido posteriormente renovado por 2 vezes).
Em 1852, sobraça, por poucos dias, a pasta dos Negócios Estrangeiros em governo presidido pelo Duque de Saldanha.
Em 1852, é eleito novamente deputado, e de 4 a 17 de Agosto será Ministro dos Negócios Estrangeiros. A sua última intervenção no Parlamento será em Março de 1854 em que ataca o governo na pessoa de Rodrigo de Fonseca Magalhães.
Almeida Garrett falece a 9 de Dezembro de 1854, vítima de um cancro de origem hepática, na sua casa situada na actual Rua Saraiva de Carvalho, em Campo de Ourique, Lisboa. Foi sepultado no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, tendo sido trasladado a 8 de Março de 1926 para o Mosteiro dos Jerónimos. Os seus restos mortais foram posteriormente trasladados para o Panteão Nacional da Igreja de Santa Engrácia aquando do término deste edifício. A cerimónia ocorreu em homenagem a si e a mais outras ilustres figuras portuguesas, entre os dias 1 e 5 de Dezembro de 1966. 



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