Em 1583, a freguesia da Sé era a única existente até então.
“Segundo se lê num
tombo em que se mencionam "as casas que o Cabido tem nesta cidade",
só na Rua do Redemunho possuía dezasseis casas e uma delas tinha "um
quintal que corre ao longo do muro velho por onde vem a água para o chafariz da
Sé e o caminho que vai para Santa Clara".
Outra casa da mesma
rua tinha "enxido (quintal) que parte com o jardim do bispo". Este
jardim ainda existe, a nascente do paço episcopal, e fica sobranceiro à Rua de
D. Hugo.
Em frente à Sé, havia
a Rua das Tendas, "que começa na casa de Nossa Senhora de Agosto para
baixo". Esta casa de Nossa Senhora de Agosto era vulgarmente conhecida por
capela dos Alfaiates, que está agora à entrada da Rua do Sol. Noutros tempos,
esteve mesmo defronte da entrada principal da Sé.
Na Rua da Porta do
Paço do Bispo, "para baixo até aos açougues (ficavam onde agora está o
Largo do Dr. Pedro Vitorino), tinha o Cabido mais três casas, "com seu
pátio e quintal e porta para o terreiro do Bispo".
O Cabido possuía uma
casa junto da Sé, "sobre o chafariz que tem os frontais de esquadria sobre
colunas de pedra; e outra designada por casa do chafariz da parte direita,
quando se vai dela para a porta de Vandoma". Esta porta ficava ao fundo da
calçada que tem agora esse nome.
Como devia ser
interessante o Porto daquele tempo! Fazia-se uma feira em frente à Sé, daí a
Rua das Tendas. E era por ali que ficava o "ventre do Porto", porque
era lá que se situavam os açougues. Estamos a imaginar o quotidiano da gente
que vivia naquelas ruas estreitas da cidade episcopal onde morava gente da alta
clerezia, misturada com mesteirais, oficiais da almotaçaria, curadores de
peles, bainheiros e açougueiros.
O quarteirão das
Tendas incluía a Rua das Tendas, a Rua da Sapataria e a Rua do Faval e as
Escadas da Rainha.
Por outro lado a Praça
de S. João ficaria, muito perto do edifício onde funcionava o Senado, ou seja,
a Câmara Municipal, e que tinha a entrada voltada para a Rua de S. Sebastião.
Havia a Rua dos
Palhais. Julga-se que tinha este nome por serem cobertas de colmo as casas que
nela havia. Esta rua "vai pela porta dos açougues do povo para a Rua das
Aldas e todas as casas dela entestam (encostam) ao muro velho; umas ficam
defronte da escada que vem, ao longo da casa da Câmara, para o adro; outra é
uma casa que foi estrebaria que antigamente eram três chãos de casa em que
Gonçalo de Seabra, cidadão do Porto, fez os açougues do povo". Havia o
açougue do bispo e o açougue do povo, tipo real ou municipal. Havia ainda o
açougue dos judeus.
Tentemos agora saber o
que se passava da parte de fora da muralha velha, ao longo da qual corria a Rua
Escura. Havia umas casas na Rua Escura, "da parte do sul defronte da
capela de Nossa Senhora do Ferro, onde antigamente funcionara o Hospital dos
Coreiros (que cantavam no coro da Sé) e antes disso haviam estado os cárceres
da Inquisição, no tempo do bispo D. Baltasar Limpo".
Num
"roteiro" das rendas do Cabido, há uma alusão à Viela dos Gatos, que
é hoje a Travessa de S. Sebastião. Diz que antes se chamava Travessa do Forno,
"pela qual se ia para a Cividade", que é na atualidade a parte alta
da Rua do Corpo da Guarda.
A Rua Escura começou
por se chamar Rua Nova. Perdeu esta designação quando se abriu a Rua do Infante
D. Henrique.
E o pelourinho, onde
ficava? Em 1422, uma tal Inês Pires Bicos fez doação à Sé de umas casas "a
par do pelourinho" que, pelos vistos, naquele tempo, estava" defronte
das escadas que vão para a Sé". Essas casas, "que estão sob o
pelourinho", ficavam na Rua Escura. Esta artéria já devia existir como tal
desde, pelo menos, o século XIII, porque em 1301 era designada Rua Nova.
Mudaram-lhe o nome quando se abriu a sua Rua Nova, junto ao rio, hoje Rua do
Infante D. Henrique.
A Rua do Souto também
é das mais antigas e ficava da parte de fora da cerca velha. Em 1295, o cónego
D. Abril Peres doou ao Cabido "uma casa que comprara no Souto". Por
esse tempo, o cidadão do Porto Mem Soeiro de Refloriz deixou em testamento, a
um familiar, "uma propriedade que tinha no Souto, além do rio da
Vila". Este rio corre agora encanado no subsolo da Rua de Mouzinho da
Silveira.
Imaginem agora que
nome terá tido a Rua da Bainharia antes de ter a designação atual. Trata-se de
uma outra artéria que também ficava da parte de fora da cerca velha. Era
chamada a Rua de Ferraris. No século XIII, o bispo, D. Pedro Salvadores,
"era proprietário de casas na Rua de Ferraris... ".
Uma nota do Censual do
Cabido esclarece: "aquela Rua de Ferraris, que depois teve o nome de
Bainharia". Noutro documento, esta mesma rua vem citada como sendo "a
Rua de Fabris".”
In JN, com a devida vénia a Germano Silva
Mapa da Sé (entre-parêntisis os antigos topónimos)
Nos finais do século XVII, ocorre uma inusitada troca de
nomes de ruas das mais antigas do burgo como se vê no mapa acima.
Rua das Tendas (desaparecida) - Ed. aportanobre.blogspot
Rua de D. Hugo (Rua de Trás da Sé - Beco de
Redemoinhos)
Casa do Beco dos Redemoinhos
A Rua de D. Hugo (outrora chamada Rua dos Cónegos de Trás da Sé,
Rua
dos Cónegos, Rua de Trás da Sé, Rua
da Catedral e Rua do Redemunho) é uma das mais
interessantes do núcleo envolvente da Sé, mantendo, ainda que por vezes
desfigurada, a sua fisionomia desde a época medieval até ao século XX.
Contornando o estreitíssimo Beco dos Redemoinhos encontramos
uma das casas mais antigas da cidade, ainda hoje habitada. O edifício, cuja
fachada teria primitivamente duas portas e quatro janelas (não tendo, por
consequência, o aspecto actual), dava na época medieval para um largo que
ficava no alinhamento do deambulatório da catedral.
A Casa do Beco dos Redemoinhos é uma casa histórica
gótico-flamenga. É mais uma construção da primeira metade do século XIV, de
aspecto flamengo, devido à colocação da chaminé ao cimo da fachada e bem no
meio desta. O estreito e sinuoso Beco dos Redemoinhos, sem saída, fica nas
traseiras da Sé do Porto e foi reduzido aquando da ampliação da capela-mor da
sé.
A fachada desta casa, meio escondida, atrás da capela-mor da
Sé, dava outrora para um animado largo do burgo, limitado a ocidente pela
desaparecida charola (deambulatório) da catedral.
Chama-se Beco dos Redemoinhos, segundo alguns, porque na
época existiriam ali azenhas (moinhos), e por lá passaria um pequeno rio.
Segundo outros, dever-se-ia ao facto de, a actual Rua de D.
Hugo, à data, descrever um arco entre a capela-mor e a muralha românica (“Muro
Velho”) e que, devido a esse desenho, se chamaria Rua do Redemoinho.
Entre a Rua do Redemoinho e o Adro de Trás da Sé (hoje Beco
dos Redemoinhos) criou-se uma frente urbana cujas habitações tinham duas
fachadas, uma voltada para a actual Rua de D. Hugo, outra voltada para a
capela-mor medieval.
Sabemos que a casa dita gótico-flamenga, à época, era
designada por casa-torre, tendo cariz defensivo, como mais algumas que existiram
pela cidade. Era exemplo, bem perto dela, a casa-torre do Largo do Corpo da
Guarda, propriedade do mestre-carpinteiro Baltazar Gonçalves, conhecido por “O
Fidalgo” e que, poderá ser a que se situaria atrás, do que veio a ser o Solar
dos Correia e, por essa razão, ser conhecida no século XIX, pela Casa-Torre dos
Correia.
A casa gótico-flamenga, nos finais do século XV, pertenceu a
um cónego, Afonso Luís.
Sucedeu-lhe um outro cónego, João Privado, e depois foi (a
partir de 1498), do deão da Sé D. Rodrigo de Sousa, que nela fez importantes
obras, remodelando o seu interior, quando a propriedade incluía já um edifício
contíguo.
“Nos finais de
Quinhentos, as “casas grandes” do Adro de Trás da Sé estavam arruinadas e, no
século seguinte, pertenceram ao genealogista Cristóvão Alão de Morais, devendo
datar dessa época a janela de peitoril do piso superior.
E o remate “flamengo”
que deu fama à habitação? Uma casa-torre medieval tinha, em princípio, uma
fachada coroada por ameias; o actual desenho do remate, portanto, pode datar de
época posterior à Idade Média.
É plausível que a ruína
da torre tenha provocado o desmoronar da sua parte superior, incluindo as
ameias, tendo-se então optado pelas duas águas e a linha horizontal sobre elas,
de desenho “flamengo” e, se analisarmos a fachada, verificamos incongruências
entre a disposição dos cachorros, a gárgula no ângulo direito e a área da
fachada demarcada pelo remate, que sugerem essa alteração.”
Cortesia de José
Ferrão Afonso (2002), “Jornal Público”
Apesar de algumas alterações que a deformaram, a Casa do Beco dos Redemoinhos continua a dar testemunho do tempo em que os mercadores do Porto mantinham estreitas relações comerciais com a Flandres, a França e a Inglaterra. Trata-se, com efeito, de uma casa que foi, com toda a certeza, a residência de algum rico e viajado mercador, que trouxe o modelo de algumas das suas viagens de negócios do Norte da Europa.
Casa no Beco dos Redemoinhos
Casa Medieval
Desta casa conserva-se apenas a parede sul, que limita,
actualmente, a sede da Associação dos Arquitectos Portugueses (Secção Regional
do Norte). Fica situada junto da muralha, tendo sido recuperada pelo CRUARB (Comissariado
para a Renovação Urbana da Área da Ribeira Barredo). As escavações aí
realizadas pelo G.A.U. (Gabinete de Arqueologia Urbana, da Câmara Municipal do
Porto) trouxeram um contributo significativo para o conhecimento do passado da
cidade. A casa gótica imediata foi destruída, subsistindo unicamente a referida
parede, com uma janela e uma porta originais.
À direita em cima a sede da Associação dos Arquitectos
Casa do Dr.
Domingos Barbosa (Casa-Museu Guerra Junqueiro)
Mandada construir pelo Cónego Magistral da Sé, Dr. Domingos
Barbosa, é referida no seu testamento de 29 de Agosto de 1746 (juntamente com
outras propriedades pertencentes à sua família, como as Quintas de Fafiães e de
Águas Santas).
Belo edifício setecentista, a sua autoria tem vindo a ser
atribuída a Nicolau Nasoni, porém, não existe uma prova documental irrefutável
que o demonstre. Uma outra hipótese a considerar é a do responsável ser o
arquitecto António Pereira, autor do Palácio de S. João Novo e contemporâneo de
Nasoni.
Casa dos Freires
de Andrade
Neste belo exemplar da arquitectura portuense dos séculos
XVII-XVIII, viveu António Mateus Freire de Andrade Coutinho Bandeira
(1747-1820), com sua mulher D. Tomazia Joaquina de Mendonça Cardoso Figueira de
Azevedo. Fidalgo cavaleiro da Casa Real foi membro da Junta do Governo do Reino
instituída em 1808 e, pelos serviços relevantes que prestou ao país durante as
Invasões Francesas, recebeu altas condecorações.
É provável que a casa tenha pertencido primordialmente, ao
arcediago Luís de Magalhães da Costa, instituidor do morgadio de Oliveira do
Douro. O Arcediago era avô materno do futuro herdeiro da casa, António Mateus
Freire de Andrade Coutinho Bandeira, que mandou brasonar a fachada da mesma.
A casa foi vendida à Câmara Municipal do Porto já no séc XX
e alberga, hoje, o museu da Fundação Maria Isabel Guerra Junqueiro e
localiza-se mesmo em frente à Casa-Museu Guerra Junqueiro. Toda a colecção de
arte reunida pelo poeta Guerra Junqueiro está pois, distribuída por dois edifícios
fronteiros na mesma Rua D. Hugo.
Estão expostos a biblioteca e o escritório de Guerra
Junqueiro e, nas salas de exposição do piso superior, apresentam-se colecções
de faiança portuguesa dos séculos XVIII e XIX, pintura renascentista
(destaca-se obra de Jerónimo Bosch e alguns primitivos catalães), louça Ming e
mobiliário arcaico, entre outros.
Capela de Nossa
Senhora das Verdades
A Porta ou Postigo das Verdades, como era costume
naqueles tempos, era encimada por um nicho com a imagem de Nª. Senhora das
Verdades, muito venerada pelo povo da vizinhança. Quando, no século XIV, foi
destruída essa porta, o cónego Nicolau Parada mandou fazer à sua custa uma
pequena capela onde colocaram a imagem.
Reformada ao longo dos anos, adquiriria os seus últimos
traços em finais do século XVII, inícios do século XVIII.
Aquela Porta das Verdades foi antes Porta das Mentiras, junto às
Escadas das Mentiras (hoje Escadas das Verdades) e fazendo parte da muralha primitiva
foi demolida no século XIV.
Sabemos, por uma escritura de 15 de Abril de 1697, que a
casa nobre do Cónego Domingos Gonçalves Prado situava-se junto da Capela de
Nossa Senhora das Verdades. Este ilustre clérigo contribuiu com esmolas
significativas para as obras da capela, entre elas o retábulo, feito no início
do século XVIII, onde se vê a belíssima imagem em calcário da Virgem.
A capela e o prédio contíguo passariam, então, por um contrato de compra e venda, para a posse da família Calheiros de Ponte de Lima.
Durante o cerco do Porto a capela foi destruída pela metralha miguelista de Gaia. Porém, D. Ângela Jácome do Lago e Moscoso, esposa de Pedro Lopes Calheiros, mandou reconstruí-la em 1843.
Durante o cerco do Porto a capela foi destruída pela metralha miguelista de Gaia. Porém, D. Ângela Jácome do Lago e Moscoso, esposa de Pedro Lopes Calheiros, mandou reconstruí-la em 1843.
Ao fundo das actuais Escadas das Verdades existe um arco que
nada tem a ver com estrutura dos referidos Postigo ou Porta, sendo um arco que
fazia parte de um aqueduto que vindo das Fontainhas levava água para o Colégio
dos Jesuítas anexo à Igreja de São Lourenço.
O escritor Alberto
Pimentel refere-se, em 1899, a uma superstição ligada a esta capela:
“A locução “Andar
às vozes” exprime o facto de qualquer pessoa vaguear pela rua à escuta do que
os outros dizem, para tirar agoiro do que eles disserem. E, segundo o que
ouvir, esperará boa ou má fortuna no negócio que traz no pensamento. Castilho,
no “Amor e Melancolia” aludiu a esta tradição relativizando-a apenas com a
noite festiva do Santo Percursor;
Qual com bochecho
na boca
Aplicando atento
ouvido
Espera que á meia
noite
Seja um nome
proferido.
No Porto acresce
á tradição o costume de, quando alguém “andar a vozes” se dirigir como em
silenciosa romagem, à Capelinha da Senhora das Verdades. Tal é o pitoresco
especial da versão portuense.
Crê que a Virgem
daquela invocação fará com que as pessoas que encontramos pela rua nos revelem
involuntariamente ou inconscientemente o porvir dizendo “verdades” que o tempo
confirmará.
Alberto Pimentel sobre o mesmo tema escreve:
“Eu fui muitas
vezes, quando era pequeno, à referida capelinha, para acompanhar uma pessoa da
minha família, que acreditava na tradição de que pelas vozes se ficava sabendo
a verdade futura.
Saíamos de casa
depois das nove horas da noite e íamos atravessando a cidade, sem dizer
palavra, em direcção à Sé…Eu e a pessoa que eu acompanhava ali, ajoelhávamos no
degrau da porta, quando chegávamos ao termo da nossa silenciosa romagem…
Chegava a aborrecer-me aquela maçada de atravessar em silêncio a
cidade, do Bairro Ocidental para o Bairro Oriental. Quando
já, perto de mim, negrejavam as paredes da Sé, na solidão e no silêncio, a
minha tristeza, misto de enfado e terror, aumentava a ponto de me fazer tremer
às vezes. Não sei se rezava ou o que rezava, enquanto essa querida pessoa orava
fervorosamente com os lábios colados a um dos ralos, como se estivesse falando
a Nossa Senhora para dentro da ermida… A pessoa que eu acompanhava, ao
voltarmos para casa, vinha quase sempre preocupada, a resolver na mente as
“vozes”, agradáveis ou desagradáveis, que tinha ouvido. Pobre e crédula
criatura, antegosava a felicidade que lhe tinha sido anunciada, ou vergada ao
peso de alguma profecia de desgraça, de algum aviso aziago,
acreditando, por igual, uma ou outra cousa. Aqui está, pois, como segundo a
versão do Porto, a Capela de Nossa Senhora das Verdades é o termo tradicional
de “andar às vozes”. Como é do estilo não falar quando se ”anda às vozes”
algumas pessoas para evitar o descuido de não guardar silêncio (o que
estragaria a romagem) sujeitam-se ao incómodo do bochecho. Mas por isso mesmo
que é incómodo, a maior parte da gente dispensa-o, cerrando os dentes uns
contra os outros e pondo toda a sua atenção em não dizer palavra”.
Capela de Nossa Senhora das Verdades
Confluência das Escadas das Verdades e Escadas do Barredo
O arco que se observa na foto fazia parte de um aqueduto que
levava água para o convento da igreja de S. Lourenço.
Colégio e Igreja
de S. Lourenço
“ O fundador da companhia de Jesus na cidade foi
Francisco de Borja que chegou ao Porto, na qualidade de comissário-geral da
Companhia de Jesus, no mês de maio do ano de 1560. Instalou-se, na altura, num
hospi-tal que então se chamava de Santa Clara e que ficava na rua ainda
existente dos Mercadores. A bem dizer, ele não se instalou no hospital
propriamente dito, mas sim "num palheiro anexo que servia de albergue aos
peregrinos". Naquele tempo, a artéria em causa tinha, junto à Praça da
Ribeira que hoje conhecemos, outra configuração bem diferente da atual. Por
exemplo: não existia ainda a Rua de S. João e no seu lugar corria, a céu
aberto, o célebre rio da Vila.
O hospital de Santa Clara ainda funcionava à época na Rua
dos Mercadores. Com a abertura, em 1789, da rua que viria a tomar o nome de S.
João, uma parte do terreno que pertencia ao hospital foi expropriado e
exigiu-se à Santa Casa da Misericórdia, que administrava o hospital, a
realização de obras que, na altura, não convinha a esta instituição fazer. E
tomou uma resolução: transferiu, em 1790, as enfermas que estavam no hospital
para uma casa da então chamada Alameda da Cordoaria, e vendeu as antigas
instalações.
Não muito longe da Rua dos Mercadores, junto à Praça da
Ribeira, no miolo do Barredo, ainda lá está a Rua de S. Francisco de Borja, mas
é muito difícil saber hoje qual terá sido a casa que teve a honra de hospedar
tão ilustre figura da Igreja.
Chegado ao Porto em 1560 hospedou-se no hospício de Santa
Clara. Durante a sua estada no Porto, Francisco de Borja foi visitado pelo
então bispo do Porto, D. Rodrigo Pinheiro, que lhe pediu para que, na sua
ausência, "deixasse nesta cidade dois ou três padres da Companhia fundada
por Santo Inácio de Loiola.".
O sonho de Francisco de Borja não era deixar no Porto
dois ou três padres, era o de fundar um colégio nesta cidade e nesse sentido
trabalhou em colaboração com Henrique Nunes de Gouveia, "fidalgo e cidadão
ilustre do Porto" e com o também portuense padre Inácio de Azevedo, que
viria a morrer mártir. Começou por se instalar numas casas da Lada fornecidas
por Nunes Gouveia. A cidade não gostou do que aí vinha, o que levou os Jesuítas
a usar o estratagema de darem a entender que iam embora, mas rumando a sul
ficaram um tempo no Mosteiro de Pedroso em Gaia e aguardaram novos ventos. Uma
noite pela calada, voltaram e instalaram-se na Lada nas casas onde até já havia
uma capela.
Consta de uma crónica antiga o seguinte relato: "No
dia 10 de Agosto de 1560, dedicado pela Igreja a S. Lourenço, quando o sol ainda
mal despontara e os portuenses despertavam para mais um dia de trabalho, a
cidade soube, com espanto, que lá em baixo, numas casas para o lado da Ribeira,
havia uma grande festa: o padre Francisco de Borja preparava-se para celebrar
missa enquanto outro padre, Inácio de Azevedo, faria um dos seus eloquentes
sermões".
Os burgueses da cidade, ainda não tinham esquecido a
conversão de um dos seus filhos, num sermão realizado em 1546 pelo padre
jesuíta Francisco Estrada, junto à Porta do Olival, na ermida de S. Miguel e
que levou que um jovem com 18 anos de nome Vasco Ferraz da abastada família dos
Ferrazes, enveredasse pela vida na Companhia e renunciasse à vida de mercador
de seu pai. As súplicas da família, porém, não foram suficientes para demover
os intervenientes no processo. O rapaz viria a falecer um ano depois de ter
dado entrada no Colégio da Companhia de Coimbra.
Voltando a 1560, no dia 11 de Agosto, a Câmara notificou
Francisco Borja, proibindo a instalação na cidade da casa e colégio dos
Jesuítas. Depois houve uma reunião na sede da Santa Casa da Misericórdia da
qual saiu uma resolução: quatro ou cinco padres da companhia ficariam na cidade
mas colégio nem pensar.
Os da Companhia voltaram para as suas casas da Ribeira
onde não tardaram a conquistar a simpatia de todos e em 1570, os jesuítas
abandonaram as primitivas instalações e instalaram-se um pouco mais acima, nas
Aldas.
O património cedido por Henrique Nunes de Gouveia cedo se
mostrou escasso pelo que tiveram que adquirir uns pardieiros dos herdeiros de
João Afonso Moreira e os donativos e legado chorudo, de Joana Serrão que à data
vivia em Belmonte.
Em 1577 depois de
terem já alargado os seus domínios, que entretanto, ficaram insuficientes
rumaram lá para cima para junto da Sé.
Compraram uma horta nas imediações do antigo paço
episcopal e ai construíram uma casa para o novo colégio e a respetiva igreja.
Não obstante ter surgido alguma resistência por parte da burguesia mercantil do
Porto, as obras para o novo colégio começaram também no dia em que se celebrava
a festa de S. Lourenço e daí a igreja ter recebido o nome deste mártir.
Para a construção da obra contribuíram as esmolas mas a
mais importante ajuda foi a do balio de Leça, Frei Luís Álvares de Távora que
ofereceu verba choruda com a exigência de ser sepultado na capela-mor.
Nestas novas instalações as aulas só começariam em 1669 e
um ano depois o colégio tinha cerca de 200 alunos.
Após a expulsão dos jesuítas, em 1759, o colégio e a
igreja foram entregues à Universidade de Coimbra que, em 1780, vendeu esses
imóveis aos frades Agostinhos Descalços, mais conhecidos pelos frades Grilos,
por terem a sede da sua casa-mãe no largo dos Grilos, em Lisboa, por 30000
cruzados. E daí a origem de ainda hoje, erradamente, claro, o povo continuar a
dizer igreja dos Grilos em vez de igreja de S. Lourenço”.
Com a devida vénia
a Germano Silva
Sobre o texto
anterior diga-se a título meramente informativo, que o antigo Mosteiro de
Pedroso da Ordem de São Bento, em Vila Nova de Gaia fundado em 867, acolheu,
como abade comendatário, frei Pedro Julião, futuro papa João XXI, o único papa
português da história.
Com a expulsão dos
jesuítas do país, em 1759, a igreja ficou como matriz da freguesia e os
restantes edifícios e terrenos passaram para as mãos de particulares.
O mosteiro foi
classificado como Monumento de Interesse Público em 2014.
Voltando ao tema deste capítulo, sabe-se, como acima está
exposto, que em 15 de Maio de 1560 chegou ao Porto Francisco de Borja, antigo
marquês de Lombay e duque de Gândia, em Espanha, que, anos antes,
"desiludido das glórias do Mundo", se despojara das suas ricas vestes
para envergar o singelo hábito negro dos padres da Companhia de Jesus.
Hospedou-se no hospício de Santa Clara, que funcionava ao fundo da Rua dos
Mercadores.
A primeira casa que os jesuítas tiveram no Porto foi, assim,
instituída em 1560 no meio do emaranhado Bairro do Barredo, no sítio onde estão
a Rua de S. Francisco Borja e as Escadas de S. Francisco Borja, que já foram Rua
do Colégio Velho e Escadas do Colégio Velho,
respectivamente.
Em 1577, tranferiram-se do Colégio Velho como lhe chamavam
para a Rua das Aldas actualmente com o nome da Rua de Sant’Ana onde viriam a
fundar o Colégio de S. Lourenço.
Alda é nome de mulher mas também refere uma antiga medida
de panos. Um destes dois elementos estará na origem do nome daquela artéria.
As obras foram iniciadas em 1614 e, a Igreja onde viria a
ser fundada a Congregação de Nossa Senhora da Purificação, foi inaugurada em
1622, mas, os trabalhos iriam prolongar-se até aos princípios do século XVIII,
com a conclusão da fachada da sua igreja.
Por aqui dominava uma poderosa congregação – a dos mercadores
(que tinham por padroeira Nossa Senhora da Purificação) - e que, a partir de
1787 passou a confraria. Com a expulsão dos jesuítas em 1759 (quando as
instalações foram entregues à Universidade de Coimbra) a congregação foi
perdendo algum do protagonismo que tinha na cidade.
Em 21/5/1779 os
frades Agostinhos Descalços adquiriram a igreja de S. Lourenço e o colégio
contíguo onde permaneceram até 1832.
Estes frades tinham
estado anteriormente instalados na Capela de S. Bento e Santo Ovídio e hospício
anexo, que tinha sido construída pelo Dr. João Carneiro de Morais e sua esposa
no ano de 1665, em terreno da sua Quinta da Boavista, que depois se chamou de
Santo Ovídio.
Tinha frente para a
estrada de Braga, junto da actual Rua dos Mártires da Liberdade. Pertenceu aos
Padre Agostinhos Descalços até 1787, onde terão construído um hospício para
descanso dos seus padres.
Em 1787 a família
Figueiroa comprou a referida capela, já muito degradada. Foi destruída nos anos
90 do séc. XVIII.
A chegada dos Agostinhos Descalços e a sua expulsão após a
extinção das ordens religiosas acabou por aumentar drásticamente os problemas
da antiga Congregação.
Desconhecia-se o nome do arquitecto responsável pelas obras
do Colégio e Igreja de S. Lourenço, atribuindo-se frequentemente a Baltasar
Álvares a autoria da sua traça e a condução dos trabalhos até 1624 (data do seu
falecimento), sendo, porém, uma outra a figura ligada ao andamento do projecto,
entre 1624 e 1709. Recentes investigações, porém, tiraram do anonimato o mestre
arquitecto Silvestre Jorge, provando ser ele o autor da planta de S. Lourenço.
De notar que a fachada ostenta o brasão (que escapou à
picagem) dos Távoras, já que foi um Távora que ajudou financeiramente os
jesuítas a levantar a igreja de S. Lourenço.
Nesta, são de salientar os primitivos retábulos (1642 -
retábulo-mor, da autoria de Manuel Antunes; 1704 - retábulo de S. Francisco
Xavier, feito por Luís Vieira da Cruz; 1715/16 - retábulo de Santa Quitéria;
1718 - retábulo de Sant’Ana, executado por Miguel Coelho) que seriam substituídos
por exemplares neoclássicos.
Subsiste, porém, o magnífico retábulo de Nossa Senhora da
Purificação, da autoria dos entalhadores Francisco Correia e António Pereira,
segundo o risco de António Vital Rifarto.
Candeeiro a gás na Travessa de Sant’ Ana
Rua de Sant’Ana
Expulsos os Jesuítas em 1759, o Colégio e a Igreja foram doados por D. José I,
em 1774, à Universidade de Coimbra. Anos mais tarde, passou para os Frades Agostinhos Descalços (chamados pelo
povo de Grilos, por terem vindo do Convento lisboeta sito na zona do Grilo),
que lá permaneceram até 1832.
Actualmente funciona aí o Seminário Maior do Porto, que possui um interessante Museu de Arte Sacra.
Actualmente funciona aí o Seminário Maior do Porto, que possui um interessante Museu de Arte Sacra.
Igreja de S. Lourenço – Fonte: portoarc.blogspot
No Largo do Dr. Pedro Vitorino (ilustre médico e historiador
portuense) encontra-se a Fonte de S. Sebastião que foi deslocada do seu
primitivo local (junto ao edifício da primitiva Casa da Câmara, na Rua Escura)
e reconstruída em 1940 no sítio em que actualmente se encontra.
Descendo as Escadas do Colégio, achamo-nos no largo
fronteiro à Igreja de S. Lourenço onde vai desembocar a Rua de Sant’Ana (mãe da
virgem Maria), antes conhecida por Rua das Aldas, Rua de Sant’Ana das Aldas ou
ainda Rua do Colégio, onde se achava o célebre Arco de Sant'Ana.
O Arco de Sant'Ana foi demolido em 1821. Almeida Garrett
conheceu-o bem, na sua meninice.
Garrett tinha uma forte ligação afectiva ao Arco de
Sant'Ana. Referiu-se-lhe muitas vezes como "aquele
respeitável e devotado arco, precioso monumento da religião dos nossos
antepassados, foco da espiritual luz de devoção que ardia no bendito nicho consagrado
à laboriosa santa".
Garrett recordou assim a festa de Sant'Ana:
"Ai rua de Sant'Ana, rua de Sant'Ana!
Qu'é do teu arco e da tua festa, quando se lhe armava aquele palanque com que
ficava uma igreja improvisada, e um coreto e um púlpito, aonde grasnava a
música, berrava o frade e toda a vizinhança tinha um dia de
folgar?".
Arco de Sant’Ana
A Rua das Aldas vinha na continuação da Rua da Penha ou da Pena Ventosa que, por sua vez, começava na Rua de S. Sebastião e ia até ao Largo do Açougue Real hoje a área correspondente ao Largo do Dr. Pedro Vitorino.
A actual Rua da Pena Ventosa que liga a Rua de S. Sebastião ao actual Largo da Pena Ventosa, foi antes Largo do Forno.
A actual Rua da Pena Ventosa que liga a Rua de S. Sebastião ao actual Largo da Pena Ventosa, foi antes Largo do Forno.
A Rua das Aldas, à esquerda, junta-se com a Rua da Pena Ventosa – Cortesia
de Iker Casillas
Sobre a foto anterior, diz o seu autor:
“Cuestas, calles empedradas, bajarse de la bici y caminar. Oporto es
una ciudad fantástica. Cada día descubres algún rincón nuevo”.
Cortesia de Iker Casillas
Casa-Torre
Medieval
A casa-torre medieval que se encontra hoje na Rua de D.
Pedro Pitões foi alterada e deslocada do seu local de origem (encontrava-se ao
lado dos antigos açougues) quando, nos anos 40, se procedeu à demolição dos
quarteirões antigos na zona da Sé. Posteriormente reconstruída onde hoje se
encontra, aí funcionou o Gabinete de História da Cidade até 1960.
As “casas-torre” quase desapareceram da cidade. Sabe-se que
eram edifícios de pedra, estreitos e altos, muitas vezes de planta quadrada e
de vários pisos, geralmente 5 pisos. O último destinava-se à cozinha e câmaras
de dormir. O penúltimo a refeições e lazer, a loja e a sobreloja eram ocupadas
com o escritório, as dependências da criadagem, a despensa e a adega. As
aberturas eram estreitas e casa rematava com ameias, constituindo uma autêntica
fortaleza.
Casa-Torre - Fonte: Blogue "amaroporto"
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