sábado, 28 de janeiro de 2017

(continuação 10) - Actualização em 14/09/2020

“No relatório da gerência da Câmara Municipal do Porto, da presidência do visconde de Lagoaça, referente ao biénio 1858/59, leio este trecho: "Na freguesia de S. João da Foz fizeram-se consideráveis melhoramentos, como no Largo do Castelo, Rua de S. Bartolomeu e na maior parte da Rua da Senhora da Luz, tudo pelo sistema de macadame". 
O projeto para o arranjo de toda a zona envolvente do castelo de S. João da Foz do Douro é, efetivamente, de 1858. Nesse ano, a 16 de dezembro, para sermos mais concretos, a Câmara do Porto oficiou ao procurador-geral da Coroa a quem pedia "um decreto que a autorizasse a levar a efeito algumas expropriações de terrenos compreendidos na esplanada do castelo para que nos terrenos expropriados se leve a efeito um boulevard", assim mesmo, à francesa. Em português diz-se bulevar que significa ampla avenida ladeada de árvores.
Como se sabe, as ordenações militares portuguesas proibiam, desde os começos do século XVIII, a construção de casas e de quaisquer outros edifícios em terrenos que circundavam as chamadas praças de guerra em que estavam incluídos os castelos, os fortes, os fortins e as fortalezas.
Mais: nos campos adjacentes a essas praças não era sequer permitido lavrar, semear ou plantar, fosse o que fosse. Mas, por meados do século XIX, essas leis estavam ultrapassadas e a Câmara do Porto, com o argumento de que naquele tempo a esplanada do Castelo era, na estação dos banhos, o mais concorrido local da Foz do Douro, queria modernizá-la. E foi isso que fez.
Cinco anos depois, a Foz, no verão, era uma das zonas da cidade mais frequentadas pela burguesia portuense e por famílias provenientes da região duriense. Já lá existia, desde 1835, o Hotel Boa-Vista que em 1863, a fazer fé numa crónica do "Jornal do Porto" de agosto desse ano, era um dos quatro centros de conversação que havia na Foz daquele tempo. Os outros três, segundo o referido jornal, eram a praia, pela manhã; a Cantareira, pelo entardecer; e a botica a qualquer hora do dia.
O cronista especificava: "Na praia fala-se de banhos e de cada um; na Cantareira diz-se que a Foz é uma terra estúpida e que acabará um dia sufocada em sensaboria e poeira; no hotel ao redor da mesa do bilhar discutem-se as tacadas, os truques e as carambolas; e na botica contam-se as vítimas do garrotilho".
A farmácia, entretanto desaparecida, ficou célebre, também, por causa da ação cívica e cultural que o seu proprietário desenvolveu na zona. Foi ele o conhecido Francisco Amorim de Carvalho, fundador, na Foz, de um clube a que foi dada a curiosa denominação de Rigollot. Era frequentado pelas mais altas figuras da cultura, da política e da sociedade. Nos últimos anos do século XIX passaram pelo Rigollot ministros, professores catedráticos, titulares, militares de alta patente e até magistrados. O barão de Paço Vieira, que foi juiz conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, chegou a desempenhar as funções de presidente do Clube Rigollot.
O arranjo a que se procedeu nos terrenos que envolviam o castelo de S. João da Foz do Douro conduziu ao desaparecimento do fosso que rodeava a fortaleza.
Já no século XX os melhoramentos na esplanada do Castelo prosseguiram. Em 17 de julho de 1907, ainda, portanto, no tempo da monarquia, o Ministério da Guerra oficiou à Câmara do Porto informando-a de que estava autorizada a dar continuidade do ajardinamento do Passeio Alegre até à esplanada do Castelo. Satisfazia-se um pedido que havia sido feito pela edilidade. Mas havia mais dois. E quanto a esses o Ministério disse o seguinte: "Quanto à construção de um campo de ténis e de outro de futebol, o assunto vai ser estudado". Pelos vistos chegou a ser projetado para a esplanada da Foz um campo de futebol. O de ténis veio a concretizar-se. 
Ali muito perto do castelo, ao longo da costa marítima, estende-se a Avenida do Coronel Raul Peres. No desempenho dessas funções, o coronel Raul Peres deu continuidade ao arranjo urbanístico que se continuou a fazer na esplanada do Castelo. A evocação do seu nome na toponímia local deve ser vista como um simples ato de justiça.
No gaveto da Rua da Senhora da Luz com a Avenida do Coronel Raul Peres, onde agora se ergue um moderno mas inestético imóvel, existiu uma das mais célebres pastelarias do Porto: a Casa Brasileira onde, nos idos de quarenta e cinquenta do século XX, se reunia o melhor da sociedade portuense daquele tempo. Era ali que os banhistas, depois do banho da tarde, iam tomar o seu chã com torradas. A esplanada, que ficava na frente do edifício, era o local preferido pelos frequentadores da casa para os seus chás das cinco. O estabelecimento ostentava na frontaria o nome do proprietário: Carlos Teixeira da Costa, avô de Jorge Nuno Pinto da Costa, o presidente do Futebol Clube do Porto”.
Com a devida vénia a Germano Silva




Esplanada do Castelo, em 1907 - Ed. Guia Ilustrado da Foz, de Joaquim Leitão




Da esquerda para a direita, é possível observar a Confeitaria Brasileira, Mercearia Primavera e Alfaiataria High-Life. De notar que a Confeitaria Brasileira, criada por Carlos Teixeira da Costa, quando este regressou do Brasil, veio a mudar-se, mais tarde, em 1911, para edifício próprio, na esquina da Esplanada do Castelo, com a Rua da Praia, onde esteve com a designação de Casa Brasileira.
 
 
 
 

A confeitaria de Carlos Teixeira da Costa, já na esquina das ruas da Senhora da Luz e da Praia
 
 
 
O carro eléctrico da foto acima com o nº 125 será um Brill-23 (23 lugares sentados).
A linha 18, cuja placa de identificação o carro eléctrico ostentava, era herdeira duma primitiva linha 18, assim começada também a identificar a partir de 1912, mista, a vapor, entre a Boavista e Matosinhos, via fonte da Moura e Cadouços e eléctrica entre a Praça da Liberdade e a Boavista.
Em Novembro de 1914, a tracção a vapor foi eliminada e aquela rota, via Foz (Cadouços), fechada.
Por esta ocasião, o número da linha 18 desapareceu.
Os locais servidos por aquela linha 18 passariam a ser visitados pelas linhas 2 e 2/.
Porém, a linha 18, reapareceria, desde 1934, durante a realização da Exposição Colonial do Palácio de Cristal, com uma nova rota via Palácio, Rua Júlio Dinis e Boavista.
Por isso, a foto acima, será posterior ao ano de 1934.




Casa Brasileira - Ed. P.C.


Perspectiva actual da foto anterior - Fonte: Google maps


Grupo de senhoras na Esplanada do Castelo junto da "Adega Vista Alegre", em 1928 - Fonte: AHMP


Quanto ao local da foto acima, ela foi obtida próximo da Casa Brasileira (que se divisa em fundo, à esquerda), no gaveto da Rua da Senhora da Luz com a Rua da Praia, estando as senhoras voltadas para o Castelo de S. João da Foz.
À direita da Adega Vista Alegre, a poucas dezenas de metros, encontraríamos o Cine-Foz.






Rua da Senhora da Luz


Cine Foz - In "portoarc.blogspot"

O edifício da foto acima, com o logradouro encostado ao que apresenta uma varanda, é o Cine Foz.




Farol da Senhora da Luz e Ermida da Senhora da Luz


O Farol da Senhora da Luz é um farol português, já desactivado, classificado como Imóvel de Interesse Municipal (IIM), que se localizava no Monte da Luz, lugar privilegiado, cuja vista se estende da barra do Douro até Espinho, na freguesia da Foz do Douro. O Farol ficava ao cimo da actual Rua do Farol.
Foi construído no cimo do Monte da Senhora da Luz, junto da Ermida da Senhora da Luz, à época existente no mesmo local, mandada construir pelo bispo D. Miguel da Silva em 1536, numa torre na qual foram colocadas 3 candeias para ajudar à navegação dos mareantes que demandavam o rio Douro. 
Em 1680, estando a capela em ruína, foi recuperada com as dádivas de mercadores do Porto, sendo o Farol da Senhora da Luz, mantido pela boa vontade da confraria do mesmo nome.
Em 1 de Fevereiro de 1758, por alvará do Marquês de Pombal é determinada a construção de um farol, no mesmo local, devido às dificuldades de entrada no Rio Douro.
O farol era constituído por uma pequena torre hexagonal no cimo de um torreão quadrangular, no lado Oeste de um edifício de dois andares, encimado por uma lanterna verde, hoje, já retirada, e substituída por um telhado.
Em 1761, estava construído e já dotado de uma estrutura capaz de lhe granjear a designação de farol, sendo assim, o primeiro farol que existiu na costa portuguesa.
Em 1814, foi destruído por um raio, mas foi recuperado e sucessivamente modernizado.
Durante as lutas entre liberais e miguelistas foi o local, bateria de guarnição daqueles e foi completamente destruído e recuperado, posteriormente.
A importância do farol durante o conflito foi imensa, já que era pelo porto de Carreiros, sobranceiro ao farol, que os abastecimentos ao Porto eram feitos, pois, o rio Douro, devido à tomada de Gaia pelos miguelistas, ficou intransitável.
Quanto à Ermida da Senhora da Luz seria em 1832, desactivada, mas, no entanto, algumas dezenas de anos após, a romaria à Senhora da Luz ainda se realizava e era muito concorrida.
Em 1865, foi substituído o antigo aparelho com candeeiros de Argand e reflectores parabólicos, por uma óptica de Fresnel de 4ª ordem.
Em 1913, 18 de Dezembro, é iniciada uma modernização deste farol, o qual passa a emitir clarões de cinco em cinco segundos, com o alcance de trinta e oito milhas, tendo dirigido estas obras de beneficiação o oficial de Marinha A. Newparth.
Quanto à data da sua desactivação, há algumas divergências. Segundo a Marinha Portuguesa, terá sido desactivado em 1926, devido à entrada em funcionamento do Farol de Leça, outras fontes, porém, indicam o ano de 1945, como o ano da sua desactivação, devido às obras de modernização do Farolim de Felgueiras.




Farol da Senhora da Luz, em 1833 - Ed. J. Villanova


Gravura antiga do farol da Senhora da Luz (ao cimo à direita)



Farol da Senhora da Luz em 1858, observando-se, à esquerda, uma estação semafórica de palhetas ou janelas, existente há dezenas de anos e, à direita, num mastro, uma outra que estava sob a alçada da Associação Comercial do Porto - Ed. Frederick William Flower (prova actual em papel salgado, a partir de calótipo)



Farol da Senhora da Luz, c. 1900 – Ed. Alberto Ferreira–Batalha-Porto; Fonte: CMP, Arquivo Histórico Municipal



Farol da Senhora da Luz, em 1925


Farol de Nossa Senhora da Luz - Casa do farol (antiga torre e a lanterna foram substituídas pelo telhado de quatro águas)


A alguns metros do edifício principal, existe uma pequena torre octogonal, de dois pisos, em alvenaria revestida a reboco caiado de branco, com cinco metros de altura. Possui uma pequena e íngreme escada exterior em pedra, com guardas de ferro. Até meados do século XX, serviu como posto de vigia.
No afloramento granítico, anexo ao complexo, foram recentemente descobertas, um conjunto de gravuras rupestres.






Torre hexagonal (antigo posto de vigia)


Bem próximo, entre a actual Praça de Liège e a Rua do Crasto, corre a Rua do Dr. Sousa Rosa que, antes, foi denominada de Rua do Monte e, posteriormente, de Rua de Lima Júnior e que, veria o seu nome ser alterado no início da década de 1950.
A Rua do Monte já aparece identificada em 1892, na planta de Teles Ferreira, sendo perpendicular à Rua do Crasto e à actual Rua da Agra (assentamento da antiga Ribeira de Gondarém).
Este território fazia parte, então, do Povoado das Areias Altas, onde foi identificada a presença do homem na idade do Bronze Regional.

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